Novas Descobertas Podem Revelar a Conexão Entre a Deficiência de Vitamina D e o Autismo


Autismo

Resumo da matéria -

  • A vitamina D é convertida em um hormônio esteróide que regula mais de 1.000 processos fisiológicos diferentes e controla cerca de 5 por cento do genoma humano
  • A vitamina D regula um gene que é responsável pela conversão do triptofano em serotonina. A serotonina é crucial durante o desenvolvimento cerebral do feto. Quando há falta de vitamina D, há igualmente falta de serotonina, o que pode causar defeitos neurológicos.
  • A insuficiência de vitamina D pode elevar as respostas autoimunes maternas impedindo o triptofano de ser metabolizado (através de uma segunda via) em quinurerina que forma as células regulatórias T de combate autoimune.

Por Dr. Mercola

Quando eu estava na faculdade de medicina, há mais de 32 anos, a incidência de casos de autismo era de 1 em 10.000. Hoje, a incidência escalou para menos de 1 em 50, de acordo com estatísticas dos CDCs.

As projeções de respeitáveis especialistas sugerem que dentro de 10 a 20 anos, METADE das crianças terá alguma forma de transtorno autista.

Embora exista um forte componente para o aumento da conscientização, o que significa que mais crianças estão sendo diagnosticadas, isto ainda não explica o aumento exponencial da incidência de casos de autismo.

Como pode uma cultura continuar a prosperar se uma em cada duas crianças tiver uma disfunção cerebral? Não pode. Isto é prescrição de ruptura social. Claramente, alguma coisa precisa ser feita para refrear esta tendência avassaladora.

Mas, o que um pai ou uma mãe pode fazer para reduzir o risco a suas crianças?

A cientista biológica Rhonda Patrick, Ph.D., publicou dois trabalhos que culminaram em empolgantes e simples intervenções poderosas no estilo de vida que poderiam resultar em profunda influência não somente sobre o autismo, mas também sobre uma variedade de outros distúrbios de desenvolvimento na infância.

A vitamina D é um Importante Regulador Genético

Para entender por que a vitamina D desempenha um papel tão importante na função cerebral (e na disfunção cerebral), é importante entender o que é realmente a vitamina D. Apesar de ser chamada de “vitamina”, a vitamina D, na verdade, é convertida em um hormônio esteroide (outros hormônios esteroides são o estrógeno e a testosterona).

Como qualquer hormônio esteroide, ele regula mais de 1.000 processos fisiológicos diferentes e controla cerca de 5 por cento do genoma humano. Dr. Michael Holick, líder em pesquisas sobre a vitamina D, acredita que ela pode até mesmo controlar duas vezes a quantidade de genes.

Quando você possui quantidade suficiente de vitamina D no organismo, ela conecta-se a receptores de vitamina D localizados em todo o organismo, agindo desta forma como a chave que abre a porta proverbial.

O complexo receptor de vitamina D pode entrar profundamente no DNA, onde ele reconhece a sequência reveladora do código que instrui o complexo receptor de vitamina D a ligar o gene (tornando-o ativo) ou a desligá-lo (tornando-o inativo).

Novas evidências sugerem que aquelas pequenas sequências reveladoras estão presentes em 10 por cento de todos os genes, porém de acordo com Patrick, não foi empiricamente comprovado que a vitamina D tenha habilidade para ativar ou desativar todos aqueles genes.

O Autismo Aumentou Paralelamente à Deficiência de Vitamina D

Embora o autismo não seja provavelmente causado por qualquer fator, vale observar que conforme a incidência de casos de autismo tenha aumentado, igualmente aumentou a deficiência de vitamina D.

"Existe uma correlação entre o aumento na incidência de casos de autismo e o aumento na deficiência de vitamina D, em grande parte como consequência do uso de protetores solares e da maior permanência em locais fechados. A radiação UVB é muito importante para a absorção da vitamina D pela pele," observa Patrick.

“O que minha pesquisa identificou enquanto eu estava no Children’s Hospital Oakland Research Institute (CHORI) (Instituto de Pesquisas do Hospital Infantil de Oakland) com o Dr. Bruce Ames, é que um dos genes que a vitamina D regula codifica uma enzima chamada triptofano hidroxilase (TPH).

A TPH é responsável pela conversão do triptofano (aminoácido raro absorvido pela ingestão de proteínas) em serotonina.

A maioria das pessoas associa a serotonina como sendo um neurotransmissor do cérebro que regula o humor. Ela é importante para nos fazer sentir bem. Porém, na verdade, ela faz muito mais no cérebro durante seu desenvolvimento e para todo o organismo."

Serotonina Intestinal Versus Serotonina Cerebral

Você possui dois genes triptofano hidroxilase diferentes no organismo – um no cérebro (TPH2) e um no intestino (TPH1).

O que está localizado no cérebro produz serotonina no cérebro e o que está localizado no intestino converte o triptofano em serotonina intestinal e, ao contrário da opinião pública, este último NÃO É CAPAZ de cruzar a barreira hematoencefálica  para chegar ao cérebro.

Este é um ponto importante porque, enquanto muitas pessoas entendem que a maior parte da serotonina (cerca de 90 por cento) no organismo é produzida no intestino e não no cérebro, o consenso é que a serotonina intestinal automaticamente influenciará a serotonina cerebral.

Já que ela não é capaz de cruzar a barreira hematoencefálica, este não é o caso. Os dois sistemas de serotonina são completamente separados.

A serotonina intestinal tem uma função importante, da mesma forma que atua na habilidade que um tipo específico de célula sanguínea, chamada plaqueta, tem de responder a um ferimento no tecido. Por outro lado, ela pode igualmente causar problemas, provocando inflamações.

A Vitamina D Mantém a Serotonina Intestinal Sob Controle

Patrick descobriu que, no intestino, a vitamina D desliga ou atenua a atividade do gene responsável pela produção da enzima que converte o triptofano em serotonina. Desta forma, a vitamina D ajuda no combate a inflamações intestinais causadas pelos níveis excessivos de serotonina.

No cérebro, o gene triptofano hidroxilase possui uma sequência que provoca reação contrária. Aqui, a vitamina D ativa o gene, aumentando assim a produção de serotonina. Não é preciso dizer que, quando você possui quantidades suficientes de vitamina D, duas coisas acontecem simultaneamente:

  1. A inflamação intestinal é reduzida devido à desativação do gene associado à produção de serotonina
  2. Os níveis de serotonina no cérebro aumentam devido à ativação do gene e, no cérebro, a serotonina desempenha um papel importante com relação ao humor, ao controle de impulsos, planejamento em longo prazo, comportamento em longo prazo, ansiedade, memória e outras várias funções e comportamentos cognitivos, incluindo barreira sensorial – habilidade em filtrar estímulos estranhos ou não importantes.

Desde a publicação do primeiro trabalho de Patrick em 2014, um grupo independente da Universidade do Arizona tem validado bioquimicamente seus resultados, confirmando que a vitamina D realmente ativa o gene triptofano hidroxilase 2 (TPH2) em uma série de tipos de células neuronais.

A Função da Serotonina Durante o Desenvolvimento Precoce do Cérebro

Durante a fase de desenvolvimento cerebral do feto, a serotonina desempenha um importante papel na morfogênese cerebral. Em termos práticos, a serotonina é um ingrediente necessário para o desenvolvimento da forma, estrutura e ligamentos cerebrais. A serotonina basicamente diz aos neurônios onde eles devem se posicionar dentro do cérebro e que tipo de neurônios eles devem se tornar.

Se você não possui quantidade suficiente de serotonina, o resultado será estrutura e ligamentos cerebrais anormais.

“Em ratos, isto mostrou provocar comportamento equivalente ao autismo,” observa o Dr. Patrick. “A serotonina desempenha papel muito importante no desenvolvimento cerebral. O que é realmente interessante é que o feto em desenvolvimento depende integralmente dos níveis de vitamina D da mãe.

A vitamina D da mãe atravessa a placenta, atinge a barreira hematoencefálica, chega ao cérebro fetal e ativa todos os genes do feto.

Se a mãe é deficiente em vitamina D, isto pode desencadear graves consequências no desenvolvimento cerebral de seu bebê porque, provavelmente, o gene que precisa de vitamina D para ser ativado não está sendo ativado. Como consequência, não há serotonina suficiente sendo produzida no cérebro do feto, o que poderia possivelmente afetar a forma como o cérebro se desenvolve.

Vitamina D e baixa serotonina foram associadas ao autismo por vários pesquisadores diferentes. Porém, nenhum deles colocou as duas juntas como um mecanismo automático, 'Veja, talvez o nível baixo de vitamina D leve ao nível baixo de serotonina durante o desenvolvimento do cérebro. Isto pode ser parte da causa do aumento na incidência de casos de autismo e talvez parte da forma como os níveis baixos de vitamina D levam ao autismo.'"

Autoimunidade Materna e Autismo

A autoimunidade materna foi associada ao autismo. Mães de crianças autistas estão quatro vezes mais suscetíveis a possuir autoanticorpos contra proteínas cerebrais do feto. Não é normal possuir anticorpos contra proteínas cerebrais no sangue, porém mães de crianças autistas normalmente possuem.

Estudos mostraram que quando se provoca uma resposta autoimune muito forte durante a gravidez em macacos, isto provoca um desenvolvimento cerebral anormal em seu filho. Em resumo, possuir resposta autoimune não é benéfico a ninguém, porém pode ser verdadeiramente devastador quando ocorre em mulheres grávidas.

"Para pessoas que realmente não entendem o que isso significa, resposta autoimune significa que seu sistema imunológico está tão ativado que começa a enxergar seu próprio tecido como se fosse um corpo estranho, como uma bactéria ou vírus, quando, na verdade, não é estranho; este é seu órgão, seu próprio tecido," explica Patrick.

"As células imunológicas, por várias razões diferentes, não conseguem reconhecer o tecido e começam a atacá-lo e danificá-lo. No caso da gravidez, há um embrião que começa a transformar-se neste pequeno feto. Seu organismo pode enxergá-lo com um ser estranho. É como se dissesse: ‘Opa! O que é isso? Isso não deveria estar aqui. Atacar! Livre-se dele. ’ Isto pode desencadear uma resposta autoimune muito séria.

Porém, nosso organismo possui um mecanismo maravilhoso de proteção para evitar que isso aconteça. Podemos produzir um tipo de célula imunológica chamada célula T regulatória (Tregs). Células T regulatórias são muito importantes porque mantêm o sistema imunológico sob controle, certificando-se de que o mesmo saberá identificar o que é realmente estranho e o que é parte dele.”

A Deficiência de Vitamina D Pode Alimentar a Resposta Autoimune Durante a Gravidez

Conforme mencionado anteriormente, você possui uma enzima em seu intestino que converte o triptofano em serotonina. Em mulheres grávidas, a mesma enzima é igualmente encontrada na placenta; portanto, o triptofano pode ser convertido em serotonina na placenta também, durante a gravidez.

O triptofano igualmente é metabolizado, através de uma segunda via, em uma substância chamada quinurenina, que, por sua vez, forma as importantes células T regulatórias que ajudam no combate às respostas autoimunes. Quando se evita que o triptofano forme a quinurenina, a contagem de células T regulatórias cai e a resposta autoimune do organismo aumenta.

Em estudos realizados em animais, ratas grávidas nas quais a enzima que produz a quinurenina foi eliminada tiveram uma resposta autoimune tão forte contra o feto que acabaram o abortando. 

"Portanto, você deve garantir que nem todo o triptofano seja convertido em serotonina na placenta," diz Patrick, "porque você também quer que ele seja convertido, através deste outro caminho, em células T regulatórias. Agora, de volta à vitamina D. Se você não possui quantidade suficiente de vitamina D no organismo, você pode estar produzindo mais desta enzima que se liga ao triptofano e que pode agir como um escoadouro, onde o triptofano está sendo sugado naquela via produzindo serotonina na placenta.

O triptofano, portanto, fica sem chance de ser convertido naquela outra via que forma a quinurenina e as células T regulatórias. Isto pode provocar um efeito negativo, particularmente durante a gravidez, porque você não está produzindo células T regulatórias suficientes e, portanto, você começa a ter uma resposta autoimune elevada."

A vitamina D foi associada à autoimunidade através de vários mecanismos diferentes e Patrick acredita que este pode ser ainda outro mecanismo pelo qual a vitamina D pode regular a autoimunidade. Em resumo, ela ajuda a inibir a enzima que liga-se de forma tão firme ao triptofano que monta uma armadilha contra ela e evita que ela forme a quinurenina e as células T regulatórias. Com quantidades suficientes de vitamina D, o triptofano pode ser conduzido através das duas vias, produzindo:

  • Serotonina no intestino e na placenta
  • Quinurenina e células T regulatórias, que ajudam a manter as respostas autoimunes sob controle

Se Você Está Grávida, Certifique-se de Melhorar o Nível de Vitamina D

Melhorar o nível de vitamina D é de particular importância durante a gravidez. Na verdade, a melhora nos níveis de vitamina D antes e durante a gravidez pode ser uma das medidas mais importantes que uma mulher grávida pode tomar para ter um bebê saudável.

"Acredito que haja soluções simples para médicos obstetras ginecologistas, médicos de família ou para qualquer mulher que queira engravidar ou que esteja grávida que são 1) meça os níveis de vitamina D e 2) suplemente. Certifique-se de estar consumindo vitamina D suficiente; quantidade alta o suficiente para que você mantenha níveis ótimos e não sofra deficiência," diz Patrick.

“Acredito que haja uma solução simples que possivelmente ajude a evitar doenças como autismo. Isto é igualmente relevante para outras doenças - TDAH, esquizofrenia e uma série de outros distúrbios cerebrais. Conforme mencionei, a serotonina desempenha um papel importante em diversos comportamentos.”

O mecanismo descrito na seção acima provavelmente também atua na regulagem das respostas autoimunes de forma geral, promovendo a produção de células T regulatórias. Consequentemente, é altamente recomendável para qualquer pessoa que sofra de qualquer distúrbio autoimune que melhore seus níveis de vitamina D. Igualmente para pessoas com qualquer tipo de disfunção neurológica.

O nível ótimo de vitamina D indicado hoje pela maioria dos estudos está entre 40 e 70 nanogramas por mililitro (ng/ml). Você sem dúvida não quer ficar abaixo de 40 – sabemos disso. O ponto ideal é em torno de 50. A melhor forma de melhorar os níveis dessa vitamina é a exposição da pele descoberta a quantidade suficiente de luz solar. Se você não puder expor-se ao sol por tempo suficiente, então precisará tomar suplementos de vitamina D3.

Tenha em mente que se você optar pelo suplemento de vitamina D, também precisará consumir vitamina K2. O papel biológico da vitamina K2 é ajudar a transferir o cálcio para áreas adequadas do organismo, tais como ossos e dentes. Ela também ajuda a remover o cálcio das áreas onde ele não deve estar, tais como as artérias e os tecidos moles.

A deficiência de vitamina K2, na verdade, produz os sintomas de toxicidade de vitamina D que incluem calcificação inapropriada que pode levar ao endurecimento das artérias.

O Polimorfismo Genético Comum Predispõe Muitas Pessoas a Níveis Baixos de Vitamina D

Vale observar que uma porção razoavelmente significante da população possui um polimorfismo genético chamado CYP2R1, uma aberração genética que evita que o fígado hidroxile a vitamina D3 em 25-hidroxi vitamina D, que é a principal forma de circulação da vitamina D pelo organismo. Neste caso, a quantidade de vitamina D que você precisa consumir pode ser extraordinariamente alta.