Por Dr. Mercola
Um dos argumentos mais convincentes de um estudo publicado em 2014 na Frontiers in Aging Neurocience em relação à doença de Parkinson é que "um corpo crescente de evidências sugere que a nutrição pode desempenhar um papel fundamental".
O Mal de Parkinson é uma doença neurodegenerativa progressiva, que geralmente se desenvolve em pessoas idosas, com sintomas como inflamação, rigidez muscular e tremores, todos sinais da redução da função mitocondrial. A doença é considerada idiopática, que se refere a condições que ocorrem de forma espontânea e sem causa conhecida. Atualmente, ela não tem cura, sendo este um dos motivos pelos quais a prevenção é fundamental.
Na doença de Parkinson, movimentos como caminhar ou se virar lentamente parecem se embaralhar, um sintoma conhecido como bradicinesia, que ocorre quando o cérebro sinaliza para partes específicas do corpo diminuírem a velocidade, podendo até mesmo suprimir a expressão facial. Vários outros sintomas surgem gradualmente ao longo do tempo, incluindo perda olfativa, dificuldade em engolir ou mastigar e problemas de memória.
O estudo descreve diversos aspectos do Parkinson como uma supressão do sistema de autofagia autossômico-lisossômico, que é a degradação sistemática dos componentes funcionais do corpo devido à destruição celular, caracterizada pela perda de neurônios transmissores de dopamina na pars compacta (uma seção do mesencéfalo) da chamada "substância negra".
A Michael J. Fox Foundation descreve o Parkinson como um distúrbio neurodegenerativo crônico que afeta 1% da população. Esses indivíduos geralmente têm em média 60 anos de idade, mas há registros de pessoas que foram diagnosticadas aos 40 anos, e até mais jovens.
O Parkinson é classificado como a segunda doença neurodegenerativa mais comum em idosos. Por isso, é essencial tentar entender o papel desempenhado pelos alimentos, enfatiza o estudo. Mais especificamente:
"Estudos epidemiológicos recentes revelaram a possibilidade de de alguns nutrientes reduzirem o risco da DP [Doença de Parkinson]. Por outro lado, outros nutrientes podem estar envolvidos com a etiologia da neurodegeneração ou agravar a progressão da doença."
O que a nicotina e os pimentões têm a ver com o Parkinson?
Outro estudo do Departamento de Ciências Ambientais e de Saúde Ocupacional da Universidade de Washington, em Seattle, relatou descobertas interessantes sobre a associação entre a doença de Parkinson e o pimentão: a ingestão de vegetais da família Solanaceae, especialmente o pimentão, representa um potencial protetor, especialmente em participantes do estudo que nunca haviam fumado ou fumaram por menos de 10 anos. E isso é importante pelo seguinte motivo:
"A nicotina é o fitoquímico altamente viciante do tabaco, derivado de plantas do gênero Nicotiana da família Solanaceae. Outras espécies dessa família incluem Capsicum e Solanum, cujos frutos e tubérculos comestíveis incluem os pimentões, os tomates, as batatas e a berinjela. Todos eles contêm nicotina."
Portanto, a nicotina é um composto encontrado na família de plantas que inclui tomates, batatas, berinjelas e pimentões. É importante observar que a quantidade de nicotina nesses alimentos é insignificante quando comparada à encontrada nos cigarros, enfatiza o estudo; provavelmente menor até mesmo do que a quantidade presente no fumo passivo.
O Dr. Michael Greger escreveu no site Nutrition Facts que a quantidade de nicotina que você ingere em sua alimentação é centenas de vezes menor do que a quantidade obtida ao fumar um único cigarro. Mas isso depende do vegetal e do quão maduro ele se encontra. Greger afirma que a nicotina obtida apenas através da ingestão de alguns vegetais saudáveis já pode ser significativa, e explica:
"[Os pesquisadores]… não encontraram nada [de nicotina] na berinjela, uma pequena quantidade nas batatas, alguma nos tomates, mas uma quantidade considerável no pimentão. Quando isso foi levado em consideração, surgiu um panorama muito maior. Os pesquisadores descobriram que mais pimentões resultavam em mais proteção.
E, como era de se esperar, os efeitos de comer alimentos que contêm nicotina eram ainda mais evidentes em não fumantes, pois a nicotina da fumaça presumivelmente ofuscaria os efeitos da alimentação."
Para analisar minuciosamente quais fatores levaram à capacidade de neuroproteção das pimentas, os pesquisadores avaliaram cerca de 500 pacientes recém-diagnosticados com Parkinson, além de outros 650 indivíduos que não apresentavam o distúrbio, na região de Seattle.
Os cientistas consideraram a quantidade (ou ausência) do uso de tabaco (incluindo cachimbos, charutos e fumo de mascar), uma grande variedade de outros alimentos (como brócolis, batata doce, pepinos, ervilhas, abóbora e cebola), métodos de cozimento e quantidade consumida, bem como raça/etnia, presença de outras doenças, sexo e idade.
Ao concluírem o estudo, os pesquisadores relataram que a ingestão de vegetais da família Solanaceae estava inversamente relacionada ao risco de Parkinson. Nenhum outro alimento obteve uma relação positiva mais alta, e os pimentões se destacaram por apresentarem a maior associação. Isso sugere que comer esses vegetais de duas a quatro vezes por semana poderia fornecer efeitos protetores significativos.
Existem outros fatores ou alimentos que podem ajudar?
Um alcaloide conhecido como anatabina, encontrado tanto na nicotina quanto no pimentão, foi identificado no estudo em destaque como outro composto que pode possui efeito neuroprotetor devido às suas propriedades anti-inflamatórias.
A capsaicina, o ingrediente ativo da pimenta chili (que causa a sensação de calor quando você as come), não apenas demonstrou desempenhar um papel potencial contra os sintomas do Parkinson, mas também inibiu o crescimento de células de câncer de mama.
O estudo observa ainda que os capsinoides e capsaicinoides presentes nas pimentas e pimentões também ativam, de forma indireta, os receptores da substância negra do cérebro, e podem afetar a sobrevivência dos neurônios cerebrais.
Os apreciadores de café também vão gostar de saber que a cafeína também parece estar associada a um risco reduzido de Parkinson, de acordo com um estudo publicado na Neurology. Os cientistas autores do estudo de 2018 recomendaram pelo menos quatro xícaras por dia (por medida) como uma quantidade adequada para ajudar a aliviar os sintomas. E mais:
"O café descafeinado não ofereceu proteção, apontando a cafeína, e não outras substâncias presentes no café ou no chá, como agente farmacológico subjacente... Assim, explorar os mecanismos pelos quais a cafeína pode proteger contra a DP é um empreendimento válido."
Existe também uma suposição de que o nosso microbioma é uma questão importante no debate sobre as causas da Doença de Parkinson, e uma das possíveis maneiras de preveni-la seria através melhorando a saúde intestinal.
O Dr. George Tetz e seus colegas examinaram os bacteriófagos (vírus que vivem no nosso intestino) no Mal de Parkinson, bem como o papel que o microbioma pode desempenhar na sua patogênese ou na maneira como a doença se desenvolve. De acordo com o site Parkinson.org:
"Isso fortaleceu a ideia de que poderíamos melhorar os sintomas se mudássemos o microbioma através da alimentação ou de outras formas. Indivíduos com Parkinson apresentaram menos de um tipo específico de bactéria que produz ácido lático.
Essas bactérias desempenham um papel importante nos processos que produzem dopamina e afetam a capacidade de absorção do intestino. Segundo o estudo, pessoas com a DP não tiveram menos bacteriófagos do que pessoas sem DP, mas descobriu-se que as pessoas com Parkinson tinham um número aumentado de um tipo específico de bacteriófago chamado bacteriófago da fase lítica."
O consumo de laticínios está relacionado ao risco de doença de Parkinson?
Tetz e seus associados levantaram a hipótese de que os laticínios poderiam afetar os bacteriófagos, especificamente o Lactococcus, um tipo de bactéria no ácido lático. Além disso, outro estudo recente relatou que o consumo de laticínios está ligado ao desenvolvimento de Parkinson em estágios mais avançados da vida.
Mas, curiosamente, o estudo apresentado baseia-se nas descobertas de um estudo de 1996, que afirma que o consumo de leite está associado ao aumento do risco de Parkinson, especialmente em homens.
Além disso, neurotoxinas dopaminérgicas, incluindo pesticidas e bifenilos policlorados (PCBs) nos laticínios, também podem aumentar o risco, de acordo com um estudo de 2002 da Harvard School of Public Health. O estudo apresentado citou ainda vários outros estudos em seus relatórios:
"Diversos estudos relataram uma diminuição nas atividades de peroxidase, glutationa-peroxidase e glutationa na SN [Substancia Negra] (indicando perda de neurônios dopaminérgicos na pars compacta da substância negra) no post mortem de pacientes com DP; sugerindo que uma falha metabólica nos mecanismos antioxidantes e processos químicos pode levar à peroxidação lipídica e às características do Parkinson."
Outro estudo mostrou que os ácidos graxos poli-insaturados ômega-3 (PUFAs) parecem proteger contra diversas doenças neurodegenerativas e, em outro estudo, os pesquisadores descobriram que as habilidades motoras dos pacientes melhoraram com a suplementação de riboflavina por seis meses — e eliminação da carne vermelha da alimentação.
Que mudanças podem ser feitas para reduzir o seu risco de Parkinson?
Kelly Changizi, co-diretora do Centro de Neuromodulação do Mount Sinai Parkinson e do Centro de Distúrbios do Movimento da cidade de Nova York, disse que seus pacientes frequentemente perguntam se o que eles comem tem algum papel na sua doença e reconhece ao mesmo tempo que “é muito interessante que a nicotina em vegetais como os pimentões possa ser neuroprotetora" e que o estudo "fornece mais evidências de como a alimentação pode influenciar nossa suscetibilidade a doenças neurológicas, e particularmente à doença de Parkinson".
Ela não foi o único profissional da área médica a considerar "intrigante" o estudo sobre os pimentões como um potencial aliado para aliviar os sintomas e diminuir o risco de Parkinson (embora muitos ainda neguem uma "relação de causa e efeito"). Com sorte, o estudo pode abrir uma porta para iniciar mudanças quando antes se pensava que nada por parte do paciente poderia mudar seu diagnóstico.
Parece claro que a alimentação está muito mais ligada à prevenção de doenças do que se pensava até mesmo por membros da comunidade médica e do público em geral. Seja comendo vegetais pelos nutrientes que eles fornecem ou trabalhando para melhorar seu bioma intestinal, a conclusão de Greger é clara e direta:
"Os pesquisadores concluem que suas descobertas precisarão ser reproduzidas para ajudar a estabelecer a relação de causa e efeito antes de considerar intervenções alimentares para prevenir a doença de Parkinson, mas quando a intervenção consiste em comer pratos saudáveis e saborosos, como pimentões recheados com ragu de tomate, eu não vejo motivo para esperar."