Por Dr. Mercola
Foi em 1992 quando Shanna Swan, Ph.D., epidemiologista reprodutiva e professora de medicina ambiental e saúde pública na Escola de Medicina Icahn em Mount Sinai, na cidade de Nova York, ouviu pela primeira vez a respeito de um declínio potencial na fertilidade entre as pessoas. Um estudo publicado no BMJ naquele ano, encontrou evidências de redução na qualidade do sêmen nos últimos 50 anos.
Ela achou esse fato muito preocupante, sendo que talvez não fosse verdade, então ela passou cerca de 6 meses investigando e avaliando os 61 estudos da revisão. Descobriu-se que o declínio era verdadeiro e Swan dirigiu seus estudos nas duas décadas seguintes para desvendar essa tendência assustadora.
Com os passar do tempo durantes muitas pesquisas cuidadosas, Swan revelou um fator que está interrompendo o desenvolvimento humano e a reprodução de tal modo que ela sente que estamos ameaçados como espécie.
A causa disso é uma classe de produtos químicos chamados ftalatos, sendo tão onipresentes que os Centros de Controle e Prevenção de Doenças declararam que “a exposição ao ftalato é generalizada na população”. Estima-se que 8,4 milhões de toneladas métricas de plastificantes, incluindo ftalatos, são utilizados em todo o mundo, com a produção de ftalatos chegando a cerca de 4,9 milhões de toneladas métricas todos os anos.
A contagem de espermatozoides sofreu um declínio 59,3%
O livro "Count Down" de Swan é baseado em um estudo de 2017 que ela mesmo co-escreveu, onde foi descoberto que a contagem de espermatozoides declinou 59,3% entre 1973 a 2011. As quedas mais significantes foram encontradas em amostras de homens na América do Norte, Europa, Austrália e Nova Zelândia, onde muitos tinham concentrações de espermatozoides abaixo de 40 milhões / ml, considerado o ponto que separa em que um homem terá problemas para fertilizar um óvulo.
Em média, os homens desses países tiveram uma queda de 52,4% na concentração de esperma e uma queda total na contagem de 59% (a concentração de esperma multiplicado pelo volume total de uma ejaculação).
Parece haver uma espécie de efeito sinérgico acontecendo, já que, segundo o livro, a contagem de esperma, a testosterona e a fertilidade estão diminuindo, enquanto as ocorrências de câncer de testículo e os abortos estão aumentando em cerca de 1% ao ano. Em uma entrevista com Mark W. de After Skool, que você pode ver completa logo acima, disse Swan:
“O efeito de 1% é uma mudança de 1% que ocorre todo ano ao longo de muito tempo, então se a contagem de esperma fosse reduzida em 50% durante 50 anos, isso corresponderia 1% ao ano... um declínio de 50% significa "cortá-lo" pela metade. Ter sua contagem de esperma pela metade? Creio que nenhuma pessoa desejaria isso, correto? O mesmo acontece com a testosterona.
Também está caindo na mesma quantidade de 1% todo ano. O aborto espontâneo ou a perda da gravidez aumentaram nas mulheres com a mesma taxa... Tudo parece estar progredindo próximo da mesma taxa de deterioração da função reprodutiva.”
A fertilidade global também está caindo, de 5.06 filhos em 1964 para 2.4 em 2018, que já está abaixo do nível de repopulação mundial, segundo o The Guardian.
Homens e mulheres estão sendo afetados, assim como outras espécies de seres vivos. Segundo Swan, muitas espécies estão passando por distúrbios genitais significativos e redução do tamanho do fígado. As espécies estão sendo ameaçadas pelo declínio da fertilidade e da função reprodutiva, sendo que os declínios estão sendo causados pelos mesmos fatores que nos afetam.
Produtos químicos responsáveis pelo declínio da fertilidade
Existem duas principais causas que podem ser responsáveis pelo declínio da fertilidade, disse Swan — genética ou o meio ambiente. As mudanças, entretanto, acontecem de maneira muito rápida para serem evolutivas, eliminando assim um fator genético. Se tratando do meio ambiente, tanto o estilo de vida quanto os fatores químicos podem contribuir.
Obesidade, tabagismo, consumo excessivo de álcool ou de bebidas alcoólicas, até mesmo estresse, são alguns dos fatores que você pode controlar, estando associados à diminuição da contagem de espermatozoides e da fertilidade. Os produtos químicos, no entanto, e sobretudo os ftalatos, aparentam ser os grandes responsáveis. Swan explicou:
“A função reprodutiva, a produção de espermatozoides, gravidez e assim por diante são controladas pelos hormônios... agora, caso você atrapalhe tudo, pode pensar que está atrapalhando o produto final, o esperma, os óvulos, a gravidez e é isso que acontece.
… Uma grande classe de produtos químicos, chamados endócrinos, ou seja, hormônios, produtos químicos desreguladores (que causam confusão) ou EDCs. Prefiro chamá-los "hackers" de hormônios, pois aparentam às vezes "invadir" ou "controlar" os hormônios. Eles invadem o sistema hormonal, mexem com ele e descobrem que estão em nossas vidas diárias em grande número.”
Os ftalatos são utilizados para tornar o plástico macio e flexível, portanto, sempre que você observar um tubo de borracha, pode imaginar haver ftalatos. Eles estão escondidos em alimentos como o leite, também, devido às máquinas para ordenhar utilizadas por pessoas, que usam extensos tubos de plástico. Um estudo realizado em 2013 publicado na Environment International, descobriu que o leite estava contaminado com ftalatos em "vários estágios de sua cadeia."
Além do processo mecânico para ordenhar, o leite pode ser contaminado através da ração que pode conter ftalato sendo consumida pelo gado, bem como ao material de embalagem.
Além do leite, itens como capas de chuva de vinil, botas e cortinas de chuveiro possuem muitos ftalatos, disse Swan, e também são encontrados em cosméticos e produtos domésticos, como batom, esmalte de unha, perfume, sabonete perfumado e purificador de ar, pois os ajudam a reter o aroma e a cor.
Eles também aumentam a absorção, razão pela qual são adicionados em loções, bem como a pesticidas, para ajudá-los a serem absorvidos pelas plantas. “É difícil encontrar coisas que não possuem esses produtos químicos”, disse ela.
Evidência para a síndrome do ftalato
A síndrome do ftalato se refere a uma série de distúrbios no desenvolvimento reprodutivo masculino, observados após a exposição de ftalatos no útero. Segundo Swan:
“Após a concepção, o útero é o se torna muito sensível para o desenvolvimento de quase tudo... os blocos de construção do que será o sistema reprodutivo são estabelecidos no início do primeiro trimestre... a que o feto é exposto, o que significa de fato que a mãe está exposta, pois, não existe barreira protegendo aquele feto do que a mãe está sendo exposta. Ele entra em sua corrente sanguínea, vai para o feto, entra e causa danos no mesmo.”
Em estudos realizados com ratos, descobriu-se que quando um macho que está gestando em uma mãe alimentada com ftalatos durante os períodos sensíveis da reprodução, seus órgãos genitais ficam menores e menos desenvolvidos, assim como seus testículos, seu pênis pode ser menor, e todo o tamanho da área genital também.
A pesquisa de Swan e seus colegas descobriram que exposição das mulheres aos ftalatos durante a gravidez está ligada à distância ano-genital (DAG ou distância do ânus à base do pênis) dos bebês do sexo masculino com maior exposição associada ao encurtamento da DAG. E a DAG mais curta está associada a um pênis menor e a uma menor qualidade do sêmen, de modo que Swan acredita que a DAG ao nascer é preditivo da função reprodutiva do adulto.
“Descobrimos que quando a mãe tinha níveis mais elevados de certos ftalatos, aqueles que diminuem a testosterona em suas primeiras amostras de urina, seu filho do sexo masculino teria órgãos genitais menos masculinizados”, disse ela.
O primeiro estudo a respeito de ftalatos e AGD foi realizado em 2005. Eles replicaram o estudo em 2015 e encontraram o mesmo resultado. “Portanto, agora está bem estabelecido que isso está acontecendo.” Swan conclui:
“O principal fator, o arco de todos esses 20 anos que venho trabalhando nisso, é que quando a mãe é exposta a esses produtos químicos no início da gravidez, podem resultar em falhas ou limitações da função reprodutiva na idade adulta e são, sem dúvida, parte da explicação da diminuição na contagem de espermatozoides e fertilidade.”
Além disso, os ftalatos representam apenas uma classe de desreguladores endócrinos. Existe muito mais, incluindo bisfenol-A (BPA), retardadores de chamas, pesticidas e produtos químicos PFAS. “Eles atuam juntos e, muitas vezes, o total é pior do que a soma das partes”, disse Swan.
Os humanos estão sendo ameaçados
Com a queda na contagem de espermatozoides, as mudanças no desenvolvimento sexual representam uma ameaça à sobrevivência humana, de acordo com Swan, que também observa que os seres humanos já atendem a três dos cinco critérios que ameaçam as espécies. “Acredito que já saciamos vários dos critérios de perigo, sendo um passo antes da extinção, porém continuamos estando ameaçados.” Esse é um dos seus direitos mais básicos, reprodução em risco:
"Lembre-se, caso você... e uma parceira queiram engravidar, esse é um direito humano básico... você deve conseguir reproduzir caso queira... você deve ter essa oportunidade e esse direito, sendo que ter isso tomado de você por causas que não estão sob seu controle é o que mais me preocupa.”
Para aqueles interessados em proteger sua própria fertilidade e das gerações futuras tanto quanto possível, evitar substâncias que desregulam os hormônios é essencial. Para isso, Swan recomenda algumas soluções simples de como consumir alimentos não processados e prepará-los você mesmo, pois isso reduz sua exposição a embalagens plásticas de alimentos.
Um ponto positivo é que os ftalatos deixam seu organismo de modo rápido, em questão de 4 a 6 horas, após a exposição. Eles são produtos químicos não persistentes, ao contrário de outras toxinas como dioxinas, PCBs ou chumbo, então, caso você parede ingeri-los, "você acabará com eles."
Caso os humanos tomassem precauções para eliminar o uso de ftalatos, os danos causados à fertilidade iriam acabar pelo menos dessa classe de produtos químicos e poderiam ser recuperados, após várias gerações. Swan disse:
“Podemos começar nessa direção se pararmos de expor outra vez as crianças expostas no útero, durante a infância e na idade adulta, estaríamos no trajeto para limpar nossa saúde reprodutiva.”