Por Dr. Mercola
Já se sabe que as gorduras saudáveis, como o ômega-3 de origem animal — principalmente DHA — são vitais para a saúde do seu cérebro, mas outros nutrientes, como as vitaminas, também são necessários para a cognição e prevenção de transtornos neurológicos e mentais.
A psiquiatria acredita na medicação como primeira linha de tratamento, mas até mesmo os problemas psiquiátricos mais severos têm mostrado se beneficiar bastante de intervenções nutricionais.
Uma deficiência nutricional em particular que possui um grande potencial de causar estragos em sua psique é a de niacina (vitamina B3). A pelagra é uma condição causada pela deficiência de niacina, e duas de suas manifestações clínicas incluem delírio e demência. Curiosamente, a esquizofrenia parece ter algumas características da pelagra.
A doença tem origem no intestino e está associada com a desnutrição e a "dieta do homem pobre", que consiste principalmente de produtos à base de milho. A pelagra foi epidêmica na América do Sul durante o início de 1900 e é possível que estejamos lidando com uma epidemia similar de má nutrição hoje em dia.
Dito isso, outras deficiências de vitamina B, incluindo B1, B2, B6 e B12, também têm a estranha capacidade de produzir sintomas de transtorno neuro-psiquiátrico, podendo ser um tratamento complementar valioso.
As vitaminas do complexo B são importantes para as condições psiquiátricas
Por exemplo, pesquisas recentes sugerem que certas vitaminas do complexo B reduzem “significativamente” os sintomas associados à esquizofrenia, mais do que apenas os tratamentos padrão com medicamentos. Como analisado pelo Prevent Disease:
"Quando usados em concomitância com antipsicóticos, certos minerais e vitaminas podem ser eficazes para melhorar resultados sintomáticos de esquizofrenia, restaurando os déficit nutricionais, reduzindo o estresse oxidativo ou modulando as vias neurológicas.
O principal autor, Joseph Firth, baseado na Divisão de Psicologia e Saúde Mental da Universidade, disse: 'Analisando todos os dados de ensaios clínicos envolvendo suplementação com vitaminas e minerais para esquizofrenia até agora, podemos observar que as vitaminas do complexo B melhoram, de fato, o resultado dos pacientes.'
As deficiências de vitamina B desempenham um papel causativo em doenças mentais e exacerbam os sintomas psiquiátricos, o que pode resultar em insuficiência vitamínica por má nutrição, definida como uma deficiência subclínica, que pode ter a recuperação dificultada.
‘Esse pode ser um avanço importante, uma vez que novos tratamentos para essa condição se fazem tão necessários.’”
Vitaminas B6, B8 e B12 para esquizofrenia
A meta-análise em questão, que investigou o efeito da suplementação de vitaminas e minerais contra esquizofrenia, descobriu que estudos utilizando altas doses de vitaminas B6, B8 (inositol) e B12 em conjunto foram muito eficazes para a melhora dos sintomas de esquizofrenia. As doses menores eram ineficazes.
Também se descobriu que a suplementação com vitaminas do complexo B parece ser mais eficaz quando implementada precocemente. De acordo com Firth:
"Altas doses de vitaminas do complexo B podem ser úteis na redução dos sintomas residuais em pessoas com esquizofrenia, embora tenha havido diferenças significativas entre as descobertas dos estudos que analisamos.
Ainda há algumas indicações de que esses efeitos gerais possam ser impulsionados por maiores benefícios entre os subgrupos de pacientes que possuem deficiências nutricionais relevantes ou genéticas.”
Uma das razões para o efeito das vitaminas do complexo B em uma ampla gama de transtornos de humor e condições neurológicas e psiquiátricas se relaciona ao fato de que essas vitaminas têm impacto direto no ciclo de metilação e são necessárias para a produção e funcionamento de neurotransmissores e manutenção de mielina, a camada gordurosa que envolve as células nervosas.
Sem essa cobertura protetora, os sinais nervosos ficam lentos e esporádicos, o que pode levar a problemas com a função motora, perdas cognitivas e mudanças de humor. A vitamina B8 também auxilia na comunicação das células, permitindo que suas células interpretem e respondam adequadamente as mensagens químicas.
Enquanto isso, as vitaminas B6, folacina e B12 suportam a síntese de S-adenosilmetionina (SAM), que desempenha um papel importante no ciclo de metilação. Consequentemente, a deficiência de uma ou mais vitaminas B pode levar à depressão, danos cognitivos e demência.
As surpreendentes conexões entre a pelagra e a esquizofrenia
Em 2012, entrevistei o Dr. Andrew Saul sobre o tópico do uso de vitamina B3 (niacina) para transtornos psiquiátricos, como a esquizofrenia.
Saul é editor-chefe do Serviço de Notícia de Medicina Ortomolecular e, entre seus 11 livros, está um intitulado “Niacina: A verdadeira história”, que ele coescreveu com um dos principais pesquisadores sobre o assunto e autoridade mundial no uso terapêutico de niacina, Dr. Abram Hoffer.
A niacina, como Hoffer acredita, pode, de fato, ser uma chave para o tratamento de transtornos psicológicos, incluindo a esquizofrenia.
"O Dr. Hoffer… começou a fazer testes, estudos e pesquisas sobre a niacina no começo dos anos 50. E, em 1954, Hoffer realizou os primeiros estudos sobre nutrição duplo-cego e controlado por placebo na história da psiquiatria”, disse Saul.
"Hoffer tem Ph.D. em bioquímica… Também era médico… psiquiatra certificado e chefe de psiquiatria em uma das províncias no Canadá… Hoffer percebeu que a esquizofrenia tinha sintomas que eram similares aos da pelagra.
A pelagra é uma deficiência extrema ou total de niacina. Além disso (fora problemas de pele e muitas outras coisas), apresenta sintomas de doença mental.
Quando a vitamina B3 ou niacina foi adicionada pela primeira vez como enriquecimento ou fortificação da farinha, cerca de metade das pessoas em instituições mentais puderam retornar para casa. Esse não é um fato muito conhecido.
Elas não estavam lá por serem doentes mentais (devido à genética, ambiente ou razões sociais), mas por estarem desnutridas.
Ele ficou pensando sobre aquela metade que não retornou para casa… E começou a dar doses altas de niacina (que na época eram absurdas): 3.000 miligramas por dia. A esquizofrenia passou a ser curada em 80% dos casos… Hoffer viu mais uma vez que a niacina funcionava.
Então começou a estudá-la, fez o controle por placebo, teste duplo-cego e começou a escrever sem parar. Naquele momento, a Associação Americana de Psiquiatria literalmente o colocou na lista negra”.
A niacina também pode funcionar para outros transtornos mentais
Um ponto importante trazido pela entrevista de Saul é o de que algumas pessoas têm o que Hoffer chamava de dependência de niacina, o que significa que elas precisavam de muito mais niacina do que o normal e com frequência. Essencialmente, elas são mais do que deficientes, são dependentes de altas doses de niacina para permanecerem bem.
Esse parece ser o caso dos transtornos mentais. De acordo com Saul, outras pesquisas já confirmaram as descobertas de Hoffer e concluíram que a niacina também pode ser usada com sucesso no tratamento de doenças mentais como:
- Transtorno de déficit de atenção
- Psicose geral
- Ansiedade
- Depressão
- Transtorno obsessivo-compulsivo
Efeitos cerebrais da deficiência de vitamina B12
A falta de B12 é outra deficiência de vitaminas do complexo B que pode desencadear obsessão, psicose e paranoia, e já se sabe disso desde meados dos anos 50. Como observado em um artigo de 1956, intitulado “Manifestações Cerebrais da Deficiência de Vitamina B12”, publicado no Jornal Médico Britânico:
"Numa série de 25 casos de síndrome de deficiência de vitamina B12 com o envolvimento do sistema nervoso… encontrei 14 casos com sintomas cerebrais bem marcados…
Os sintomas mentais são extremamente variáveis e incluem transtornos de humor moderados, retardos mentais, problemas de memória que podem ser graves, confusão, agitação severa e depressão, delírios e comportamento paranoico, alucinações visuais e auditivas… comportamento maníaco violento e epilepsia.
Nenhum desses sintomas é patognomônico [nota de ed.: característica da doença] e na ausência de anemia ou sinais da coluna vertebral, o diagnóstico de deficiência de vitamina B12 pode nunca ser considerado até que a psicose esteja muito avançada para tratamento.”
A deficiência de vitamina B12 é comum
Embora a vitamina B12 seja facilmente obtida da proteína animal, como carne bovina, peixe, leite, queijo e ovos, a idade avançada pode diminuir a capacidade do seu corpo de absorver a vitamina do alimento. Sua capacidade de absorver a vitamina B12 depende de três fatores: acidez estomacal adequada, a enzima pepsina e o fator intrínseco gástrico. Com a idade, a acidez estomacal diminui bastante. Você também pode ter quantidades insuficientes de ácido se tomar bloqueadores de ácido para azia.
Muitos também precisam do fator intrínseco gástrico. A anemia perniciosa é uma preocupação ainda maior, já que sua condição impede a absorção da vitamina B12. Veganos e vegetarianos estritos também têm alto risco de deficiência de vitamina B12, a menos que tomem suplementos de alta qualidade, já que a vitamina B12 é obtida principalmente das fontes animais.
As vitaminas do complexo B também protegem contra a demência e retardam o Alzheimer
As vitaminas B6, B9 (folacina ou ácido fólico em sua forma sintética) e B12 também fizeram sucesso com seu poder de prevenir o declínio cognitivo e os casos mais graves de demência, como o Alzheimer. De fato, confusão e problemas de memória são dois dos sinais de alerta mais comuns da deficiência de vitamina B12, indicando sua importância para a saúde do cérebro.
Aqui, um dos mecanismos de ação é a supressão da homocisteína, que tende a ser elevada quando há degeneração cerebral. Um estudo que confirmou isso foi publicado em 2010. Aos participantes foi admistrado placebo ou 800 microgramas (mcg) de ácido fólico, 500 mcg de B12 e 20 mg de B6. O estudo se baseou na pressuposição de que, controlando os níveis de homocisteína, é possível reduzir a atrofia do cérebro, retardando, assim, o aparecimento da doença de Alzheimer.
De fato, depois de dois anos, os participantes que receberam o complexo de vitaminas B apresentou um encolhimento cerebral significativamente menor do que o grupo que ingeriu placebos. As pessoas com os níveis mais altos de homocisteína no início do período de estudo apresentaram metade da taxa de encolhimento cerebral observada nas pessoas do grupo de placebo.
Um estudo de 2013, levou mais a fundo essa pesquisa, mostrando que não só as vitaminas do complexo B retardam o atrofiamento cerebral como também o retardam especificamente em regiões conhecidas como sendo as mais gravemente afetadas pela doença de Alzheimer. Além disso, nessas áreas específicas, o atrofiamento foi diminuído em cerca de 700%!
Como no estudo anterior, os participantes que tomam altas doses de ácido fólico e vitaminas B6 e B12 apresentaram uma diminuição dos níveis sanguíneos de homocisteína, e o atrofiamento cerebral caiu em torno de 90%.
Onde encontrar esses nutrientes tão valiosos para o cérebro
A maioria dos transtornos, declínios cognitivos e problemas psiquiátricos pode ter muitos fatores subjacentes, mas revisar a sua alimentação já é um bom começo. Não só as deficiências nutricionais podem causar danos às funções cerebrais, como sua saúde intestinal também desempenha um papel importante, assim como a exposição da sua alimentação a toxinas ou o ambiente podem contribuir.
Idealmente, você deve abordar todos esses problemas. Quanto às deficiências nutricionais, as vitaminas do complexo B parecem ser muito importantes, assim como o ômega-3 de origem animal, a vitamina C e a vitamina D. Como regra, recomendo que a maior parte, se não toda sua nutrição, venha de COMIDA DE VERDADE, idealmente de versões orgânicas, para evitar pesticidas tóxicos, e cultivadas localmente.
Dependendo da sua situação e condição, no entanto, você pode precisar de um ou mais suplementos.
Considere limitar o açúcar e comer alimentos fermentados. A série completa de vitaminas do complexo B é produzida no seu intestino, desde que você tenha uma flora intestinal saudável.
Comer comida de verdade, idealmente em versões orgânicas, combinada a alimentos fermentados fornecerá fibras e bactérias benéficas ao seu microbioma, que são importantes para ajudar a otimizar a produção interna de vitamina B.
Nutrientes |
Fontes nutricionais |
Recomendações de suplementação |
Niacina (B3) |
Fígado, frango, vitela, amendoim, pimenta em pó, bacon e tomate seco têm as maiores quantidades de niacina por grama.
Outros alimentos ricos em niacina incluem fermento biológico, páprica, café expresso, anchovas, espirulina, pato, cogumelos shitake e molho de soja. |
A referência de ingestão diária estabelecida pelo Food and Nutrition Board varia de 14 a 18 mg por dia para os adultos.
Quantidades maiores são recomendadas dependendo da sua condição. Para uma lista de dosagens recomendadas, consulte o site Mayo Clinic.
Para a pelagra, discutida anteriormente, as doses variam de 50 a 1.000 mg por dia. |
Vitamina B6 |
Peru, carne bovina, frango, salmão selvagem, batata-doce, batata, sementes de girassol, pistache, abacate, espinafre e banana. |
A levedura nutricional é uma excelente fonte de vitaminas do complexo B, especialmente B6. Uma porção (2 colheres de sopa) contém quase 10 mg de vitamina B6.
Diferente da levedura de cerveja ou de outras leveduras ativas, a levedura alimentar é feita com um organismo cultivado em melaços, que são depois colhidos e desidratados para desativar a fermentação.
Ela tem um aroma agradável de queijo e pode ser adicionada a várias receitas diferentes. |
B8 (inositol/biotina) |
Carne bovina, gema de ovo, peixe, fígado, aves de criação, nozes e legumes. |
A vitamina B8 não é reconhecida como um nutriente essencial, e nenhuma recomendação para ingestão diária foi estabelecida.
Dito isso, acredita-se que você precisa em torno de 300 mcg por dia.
A vitamina B8 é listada de vez em quando como biotina nos rótulos dos suplementos. A levedura de cerveja é uma fonte suplementar natural. |
Folacina (B9) |
Vegetais verdes folhosos crus, frescos, orgânicos, especialmente brócolis, aspargos, espinafres e nabos, e uma grande variedade de feijões, especialmente lentilhas, mas também feijão carioca, grão-de-bico, feijão vermelho, feijão branco e preto. |
O ácido fólico é um tipo sintético de vitamina B usado em suplementos. A folacina é a forma natural encontrada nos alimentos (ela vem de verduras folhosas).
Para que o ácido fólico seja útil, ele deve ser transformado em sua forma biologicamente ativa (L-5-MTHF).
Essa é a forma capaz de atravessar a barreira hematoencefálica para levar os benefícios mencionados até o seu cérebro.
Quase metade da população tem dificuldade em converter o ácido fólico para sua forma bioativa devido a uma redução genética na atividade enzimática.
Por essa razão, se você tomar um suplemento de vitamina B, certifique-se de que ele contenha folacina natural, em vez de ácido fólico sintético.
A levedura nutricional é uma excelente fonte. |
Vitamina B12 |
A vitamina B12 é encontrada quase exclusivamente em tecidos de animais, incluindo alimentos como carne bovina e fígado bovino, cordeiro, pargo, veado, salmão, camarão, vieiras, aves de criação, ovos e laticínios.
Os poucos alimentos vegetais que são fontes de B12, na verdade, oferecem duplicatas similares da vitamina B12 que bloqueiam a absorção da B12 verdadeira. |
A levedura nutricional também é rica em vitamina B12 e é altamente recomendada para vegetarianos e veganistas.
Uma porção (2 colheres de sopa) fornece quase 8 mcg de vitamina B12 natural.
Spray sublingual (embaixo da língua) ou injeções de vitamina B12 também são eficazes, pois permitem que a grande molécula B12 seja absorvida diretamente para sua corrente sanguínea. |