Por Dr. Mercola
Não dá para saber até que ponto um alimento foi alterado durante sua preparação. Tudo que não foi retirado de videiras, do chão, de arbustos, ou de árvores, já passou por algum tipo de processamento. Esses processamentos podem ser básicos, como congelamento, enlatamento ou ressecamento, ou podem envolver ultraprocessamentos que alteram os alimentos consideravelmente, como os alimentos que você costuma encontrar sendo vendidos em postos de gasolina.
Infelizmente, os americanos não só consomem grandes quantidades de alimentos processados, mas 57,9% desses alimentos são ultraprocessados. Um estudo de 2013 descobriu que, nos EUA, os gastos associados à diabetes tipo 2 foram de $140 bilhões, comparados a $90 bilhões para os produtos de tabaco, e a diabetes está diretamente ligada à uma dieta rica em alimentos processados.
A diferença na quantidade de açúcar presente em alimentos ultraprocessados e em alimentos minimamente processados é drástica. Dados demonstram que 21,1% das calorias em alimentos ultraprocessados vêm do açúcar, enquanto alimentos não processados não contêm açúcares adicionais. As escolhas sobre o que comer vêm mudando nas últimas décadas, e os problemas para a saúde vêm aumentando.
O aumento nas taxas de incidência de autismo e diabetes são preocupantes
Os dados mais recentes do Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA indicam que mais de 100 milhões de adultos americanos vivem com diabetes e pré-diabetes. Esse relatório se baseia em dados de 2015, que dizem que 30,3 milhões possuem diabetes, e 84,1 milhões possuem pré-diabetes.
O diabetes é a sétima maior causa de morte e pode contribuir para outras três causas de morte também incluídas nas 10 maiores, como doenças cardíacas, derrames e doenças renais crônicas. De acordo com a Associação Americana de Diabetes, 1,5 milhões de americanos são diagnosticados com diabetes a cada ano, e 193.000 estão abaixo dos 20 anos de idade.
Os dados mais recentes a respeito dos custos financeiros associados à diabetes indicam que $327 bilhões foram gastos nos EUA em 2017. Os custos médicos diretos foram de $237 bilhões, e as empresas perderam $90 bilhões em produtividade. Após ajustar para as idades e diferenças de sexo da população, as estatísticas mostram que o custo médico médio das pessoas com diabetes é 2,3 vezes maior que o custo das pessoas sem diabetes.
O transtorno do espectro autista (TEA) é caracterizado por comportamentos repetitivos e desafios sociais que variam de intensidade dependendo do grau do transtorno e incluem dificuldades de se comunicar e de socializar. Na maioria das vezes, os sintomas são identificados dentro dos dois primeiros anos de vida.
A prevalência do autismo pode ser maior do que o esperado
No entanto, duas pesquisas diferentes analisaram dados de questionários respondidos pelos pais das crianças, e encontraram resultados diferentes, incluindo 29,5% das crianças que não estavam sendo tratadas do autismo na época do estudo.
A primeira delas, publicada na revista Pediatrics, concluiu que o diagnóstico de autismo reportado pelos pais é de 1 a cada 40.
A segunda pesquisa, publicada na revista Journal of the American Medical Association, descobriu que a prevalência do autismo varia muito de acordo com os estados da doença. Daqueles que foram tratados, 43,3% receberam apenas terapia comportamental, 6,9% receberam apenas medicações, e 20,3% receberam os dois tipos de tratamentos.
Em uma avaliação dos recursos usados pelo programa de Renda de Segurança Suplementar dos EUA (SSI), foi determinado que 8,08% foi usado para o tratamento dos transtornos autistas em 2004, e esse número aumentou para 20,53% em 2014.
Além disso, os transtornos autistas representam a segunda maior taxa de concessão de crédito do programa, e não há quase nenhuma indicação de redução no crescimento do número de crianças solicitando e recebendo os benefícios do SSI por autismo.
O propionato de cálcio está associado ao agravamento dos sintomas do autismo
Embora nenhum fator não tenha sido relacionado ao desenvolvimento do autismo, o aditivo alimentar propionato de cálcio (E282) foi relacionado à um agravamento dos sintomas, e pode influenciar no desenvolvimento da doença.
O propionato de cálcio é muito usado como aditivo na indústria alimentícia como conservante e agente antifúngico e é pulverizado de forma rotineira sobre frutas, carnes, queijos e pães.
Mesmo que o produto químico seja um antifúngico muito eficiente, ele causa efeitos negativos para a microbiota intestinal, o que pode agravar os sintomas do autismo. O propionato de cálcio é um sal de cálcio originado do ácido propanoico, que é classificado como geralmente considerado seguro (GRAS).
De acordo com a agência de Administração de Alimentos e Medicamentos dos EUA (FDA), o propionato de cálcio pode ser usado como aditivo alimentar sem nenhuma restrição além de “ser usado para boas práticas de manufatura” determinadas pelo fabricante.
A Autoridade Europeia de Segurança Alimentar reconhece o propionato de cálcio como um conservante antimicrobiano autorizado, utilizado em rações de animais e útil contra vários tipos de bactérias.
Nos EUA, ele também é usado como um aditivo nas rações do gado, como uma fonte de cálcio extra para os animais, e como uma forma de tratamento para várias infecções. Mas a capacidade do produto químico de afetar o crescimento microbiano não termina quando ele chega no seu intestino.
O acetato, o propionato e o butirato são ácidos graxos de cadeia curta gerados a partir da fermentação microbiana no intestino. Eles já demonstraram ser muito benéficos para o metabolismo energético, ao que desempenham um papel importante na alimentação, microbiota intestinal e energia. No entanto, o excesso de propionato pode causar efeitos comportamentais muito compatíveis com o autismo.
O ácido propiônico afeta o eixo cérebro-intestino
Em um estudo, os pesquisadores descobriram que o ácido propiônico é produzido pelas bactérias gastrointestinais relacionadas ao autismo (clostridia e bacteroides) e pode causar mudanças comportamentais, eletrográficas e neuroinflamatórias reversíveis que lembram o autismo quando administrado a roedores.
O ácido propiônico é produzido naturalmente pela microbiota intestinal ao que ela quebra as fibras alimentares. Já o propionato de cálcio foi designado como GRAS porque foi suposto que a substância fosse compatível com a fisiologia humana. A taxa do metabolismo propiônico é influenciada por vários fatores genéticos, microbianos e ambientais.
Porém, grandes quantidades do ácido podem causar efeitos neurocomportamentais, especialmente em pessoas com autismo, que já estão propensas a um excesso de ácido propiônico devido às anormalidades em suas microbiotas intestinais, tornando-as vulneráveis a mais danos. Apesar de esses sintomas não serem facilmente detectados em pessoas saudáveis, grandes quantidades do ácido podem desencadear sintomas reversíveis que lembram o autismo até mesmo em pessoas saudáveis.
Idealmente, há um equilíbrio entre bactérias boas e ruins na sua microbiota intestinal (embora muitas bactérias consideradas ruins só causam problemas se suas populações crescerem muito). Uma vez que a população de uma espécie cresce de forma desproporcional, pode causar a morte de outras espécies pela fome e a produção em excesso de certos compostos químicos.
Quando a população das bactérias ruins supera a das bactérias boas, a inflamação resultante contribui para problemas gastrointestinais associados ao autismo. Isso também pode afetar o eixo cérebro-intestinal, causando problemas comportamentais e psicológicos, como a ansiedade. O ácido propiônico também é capaz de cruzar a barreira hematoencefálica.
Aditivos alimentares usados para reduzir o desenvolvimento de mofos aumentam os riscos de resistência à insulina
Um segundo estudo avaliou o propionato como um disruptor dietético, e descobriu que o composto pode causar uma série de eventos que levam à resistência à insulina e hiperinsulinemia. O estudo foi dirigido por pesquisadores da Harvard T.H. Chan School of Public Health em colaboração com Brigham, Women’s Hospital e Sheba Medical Center em Israel.
Foi descoberto que a administração do propionato a camundongos causa uma rápida ativação do sistema nervoso simpático dos animais. Isso, por sua vez, causa um aumento nos níveis de glucagon e norepinefrina. Então, as células do fígado dos camundongos produziram mais glicose, levando à hiperglicemia.
Dessa forma, o tratamento crônico dos camundongos com o propionato, em quantidades equivalentes às tipicamente consumidas por humanos, causou obesidade e resistência à insulina nos animais.
Os pesquisadores, então, recrutaram 14 pessoas saudáveis, que foram divididas aleatoriamente em dois grupos. Um deles recebeu uma refeição com 1 grama de propionato como aditivo, e o outro recebeu uma refeição com placebo. Amostras sanguíneas foram coletadas após 15 minutos do início da refeição e a cada 30 minutos até completar 4 horas.
Os pacientes que comeram a refeição com propionato apresentaram elevações nos níveis de norepinefrina e glucagon.
Aditivos alimentares aumentam os riscos de problemas à saúde
A FDA mantém uma base de dados de 4.000 ingredientes, os quais, como a própria FDA admitiu, “são apenas uma lista parcial de ingredientes alimentares. A inclusão de entidades não pertencentes à FDA nessa base de dados não indica uma aprovação ou avaliação da FDA sobre seu uso”.
A Organização Mundial da Saúde diz que “milhares de aditivos alimentares são utilizados, e todos eles são desenvolvidos para uma função específica para tornar os alimentos mais seguros ou mais atraentes”. Muitos aditivos foram relacionados a problemas de saúde, e foram classificados como GRAS sem serem avaliados ou aprovados. O jornal Washington Post relatou:
“A FDA disse que, apesar das leis permitirem que as indústrias alimentícias façam suas próprias determinações de segurança, a agência ‘encoraja as empresas a consultar com a agência quando desenvolverem novos ingredientes’. Finalmente, a FDA disse, que as indústrias ‘são responsáveis por garantir que seus produtos sejam seguros e estejam dentro da lei’.”
Infelizmente, enquanto há poucas avaliações sobre cada composto químicos individualmente, as pesquisas sugerem que, quando consumidos de forma combinada, os problemas causados à saúde podem ser ainda mais sérios.
Uma avaliação feita pelo National Food Institute da Universidade Técnica da Dinamarca descobriu que os produtos químicos, quando usados em conjunto, podem amplificar os efeitos adversos uns dos outros, até mesmo em pequenas quantidades.
Além de tudo, as indústrias têm permissão de rotular os compostos químicos como “sabores artificiais” sem precisarem listá-los individualmente. No final de 2018, a FDA anunciou uma lista de sete compostos sintéticos que não são mais permitidos como aditivos alimentares, como resposta a uma petição feita pelo Natural Resources Defense Council e o Grupo de Trabalho Ambiental (EWG).
Esses aditivos foram relacionados ao câncer em animais e eram mais usados em alimentos assados, sorvetes, balas e chicletes.
Uma microbiota intestinal saudável pode reduzir os riscos de problemas de saúde
Cuidar da sua microbiota intestinal pode ser uma das medidas mais importantes que você pode fazer para cuidar da sua saúde. Sua flora intestinal influencia as funções de vários órgãos, como a pele, pulmões, seios e fígado. Problemas na sua microbiota intestinal podem causar problemas nas funções do seu sistema imunológico, causando consequências de curto e longo prazo.
Por exemplo, o uso de inibidores de controle imunológico para o tratamento do câncer, um tipo de medicamento usado pela imunoterapia, que funciona por meio da ativação do sistema imunológico, parece depender da microbiota intestinal.