A maioria das pessoas já é resistente ao SARS-CoV-2

Fatos verificados
Sistema imunológico

Resumo da matéria -

  • Os anticorpos específicos para SARS-CoV-2 são encontrados apenas nos casos mais graves, cerca de 1 em 5. Isso sugere que o COVID-19 pode de fato ser cinco vezes mais prevalente do que se suspeita. Isso também significa que ele pode ser cinco vezes menos mortal do que o previsto
  • Embora as pessoas expostas a indivíduos infectados possuam anticorpos da imunoglobulina A (IgA) específicos para o SARS-CoV-2 na mucosa, não havia anticorpos específicos para o vírus no sangue
  • Cerca de 40% a 60% das pessoas que não foram expostas ao SARS-CoV-2 ainda têm resistência ao vírus a nível de células T

Por Dr. Mercola

De acordo com uma pesquisa realizada na Suíça, os anticorpos específicos para SARS-CoV-2 são encontrados apenas nos casos mais graves, cerca de 1 em 5. Isso sugere que o COVID-19 pode de fato ser cinco vezes mais prevalente do que se suspeita. Isso também significa que ele pode ser cinco vezes menos mortal do que o previsto.

Um estudo, “Secreção de anticorpos sistêmicos e mucosos específicos para SARS-CoV-2 durante casos leves e graves de COVID-19”, foi publicado no servidor de pré-publicação bioRxiv em 23 de maio de 2020. Segundo os autores:

"Quando sintomático, o COVID-19 pode variar de uma doença leve cimo a gripe em cerca de 81% das pessoas, uma doença grave em cerca de 14% e crítica nos 5% restantes".

O estudo suíço, que procurou investigar reações de anticorpos específicos ao SARS-CoV-2 descobriu que, embora as pessoas expostas a indivíduos infectados possuam anticorpos imunoglobulina A (IgA) específicos para SARS-CoV-2 em sua mucosa, não havia nenhum desses anticorpos no sangue.

O IgA é um anticorpo que desempenha um papel crucial na função imunológica das mucosas, enquanto o IgG é o anticorpo mais comum que protege contra infecções bacterianas e virais, encontrado no sangue e em outros fluidos corporais. Conforme explicado pelos autores:

“Assim como no caso de outros coronavírus, a doença sintomática do SARS-CoV-2 causa uma infecção aguda com a ativação do sistema imunológico inato e adaptativo. O primeiro leva à liberação de várias citocinas pró-inflamatórias, incluindo a interleucina-6…

Posteriormente, as células B e T são ativadas, resultando na produção de anticorpos específicos para SARS-CoV-2, compreendendo imunoglobulina M (IgM), imunoglobulina A (IgA) e imunoglobulina G (IgG).

Embora a produção de IgM específica para o coronavírus seja transitória e leve à troca do isotipo para IgA e IgG, esses últimos subtipos de anticorpos podem persistir por longos períodos no soro e nos fluidos nasais. Se os anticorpos IgG específicos para SARS-CoV-2 se correlacionam com o controle de vírus, é algo que ainda está sob intensa discussão".

A reação dos anticorpos depende da gravidade do caso

Em pacientes que deram positivo para COVID-19 e tiveram sintomas leves, os IgA específicos para SARS-CoV-2 se tornaram positivos cerca de oito dias após o início dos sintomas eles foram majoritariamente transitórios. Em alguns casos, porém, o lgA estava completamente ausente. Os níveis séricos de lgG permaneceram negativos ou chegaram a valores positivos 10 dias após o início dos sintomas.

Em pacientes com sintomas graves, um aumento "altamente significativo" de ambos os tipos séricos de IgA específicos para SARS-CoV-2 foi constatado no dia três ou quatro, enquanto tipos ainda mais pronunciados de IgG apareceram no dia quatro ou cinco. Ambos ocorreram independente de idade ou comorbidades. Somente em casos graves de síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA) foram encontrados níveis "muito altos" de IgA. Segundo os autores:

“Curiosamente, alguns profissionais de saúde expostos ao SARS-CoV-2 com tipos séricos negativos de IgA e IgG específicos para SARS-CoV-2 tinham anticorpos detectáveis de IgA específicos para SARS-CoV-2 em seus fluidos nasais e lágrimas. Além disso, os níveis de IgA específicos para SARS-CoV-2 nos líquidos nasais desses profissionais de saúde foram inversamente correlacionados com a idade do paciente.

Esses dados mostram que a produção sistêmica de IgA e IgG contra SARS-CoV-2 se desenvolve principalmente casos graves de COVID-19, com níveis muito altos de IgA observados em pacientes com SDRA grave, enquanto casos leves podem estar associados a tipos séricos transitórios de SARS-CoV, anticorpos específicos que estimulam a secreção de IgA para SARS-CoV-2 na mucosa. Os resultados sugerem quatro graus de resposta de anticorpos dependentes da gravidade do COVID-19…

Acreditamos que essas descobertas sugerem um modelo no qual a extensão e a duração dos sintomas clínicos relacionados ao SARS-CoV-2, que provavelmente se correlacionam com a replicação do vírus, determinam o nível de imunidade humoral específica do vírus.

Esta hipótese é consistente com publicações anteriores, demonstrando que a magnitude da resposta humoral em relação à SARS-CoV-2 depende da duração e magnitude da exposição ao antígeno viral.

A baixa exposição ao antígeno provocará respostas mediadas por IgA da mucosa, que podem ser acompanhadas pela produção sistêmica de IgA; no entanto, respostas IgA sistêmicas específicas para vírus também podem se mostrar ausentes, transitórias ou atrasadas. Esse tipo de resposta do anticorpo "IgA da mucosa" parecia ser particularmente prevalente em indivíduos mais jovens com infecção leve por SARS-CoV-2 sem evidência de pneumonia.”

Os jovens têm mais imunidade nas mucosas do que os idosos

Os pesquisadores suíços sugerem que essas descobertas podem ser "um reflexo no aumento da imunidade da mucosa nos jovens ou na diminuição da imunidade da mesma nos idosos". Eles apontam dados anteriores que demonstram que o IgG específico para HKU1, anticorpos que respondem a um coronavírus que causa o resfriado comum, estão ausentes em pessoas com menos de 20 anos, embora níveis mais altos desses mesmos anticorpos sejam encontrados em pessoas mais velhas.

Seu sistema imunológico humoral pode entrar em ação caso haja reatividade cruzada com outro patógeno muito semelhante. No caso do COVID-19, existem evidências que sugerem a exposição a outros coronavírus que causam o resfriado comum e podem conferir imunidade contra a SARS-CoV-2.

A extrapolação sugere que bebês e crianças "têm respostas inatas à mucosa e anticorpos IgA iniciados devido a infecções frequentes do trato respiratório superior e, portanto, reagem preferencialmente dessa maneira à infecção por SARS-CoV-2", afirmam os pesquisadores.

Por outro lado, estudos mostraram que a força das reações imunes antivirais, incluindo a ativação e proliferação de células T, diminui com a idade. Isso pode explicar parcialmente por que as pessoas mais velhas são muito mais suscetíveis a casos mais graves de COVID-19 seguidos de morte. Outros fatores, como os níveis de vitamina D e a imunossenescência que aumentam nos idosos, provavelmente têm um papel importante nessa equação.

Imunidade Inata e Adaptativa

Para maior clareza, é importante perceber que todos temos dois tipos de imunidade. O sistema imunológico inato está preparado para atacar invasores a qualquer momento e é nossa primeira linha de defesa. Seu sistema imunológico adaptativo, por outro lado, "memoriza" a exposição anterior a um patógeno e cria uma resposta quando um velho inimigo é reconhecido.

O sistema imunológico adaptativo é dividido em duas frentes: imunidade humoral (células B) e imunidade celular (células T). As células B e células T são fabricadas conforme necessário a partir de células-tronco especializadas. Os gráficos abaixo são do meu artigo sobre vitamina D e ajudarão você a entender os componentes desses sistemas o momento no qual eles agem.

Imunidade
Adaptativa

Caso nunca tenha sido exposto a uma doença, mas tenha recebido anticorpos de alguém que ficou doente e se recuperou, você pode obter imunidade humoral contra essa doença. O sistema imunológico humoral também pode entrar em ação caso haja reatividade cruzada com outro patógeno muito semelhante.

No caso do COVID-19, evidências sugerem que a exposição a outros coronavírus que causam o resfriado comum pode gerar uma imunidade contra a SARS-CoV-2.

A maioria das pessoas é resistente ao COVID-19, mesmo ter sido exposta ao vírus

Um desses estudos foi publicado no dia 14 de maio de 2020 na revista Cell. Constatou-se que 70% das amostras obtidas pelo La Jolla Institute for Immunology de pacientes que se recuperaram de casos leves de COVID-19 apresentavam resistência ao SARS-CoV-2 a nível de células T.

Curiosamente, 40% a 60% das pessoas que não foram expostas ao SARS-CoV-2 também tiveram resistência ao vírus a nível e células T. Segundo os autores, isso sugere que há “reconhecimento de células T reativas cruzadas entre o coronavírus causador do resfriado comum e a SARS-CoV-2.” Em outras palavras, caso tenha se recuperado de um resfriado comum causado por um determinado coronavírus, seu sistema imunológico humoral pode ser ativado quando você entra em contato com a SARS-CoV-2, tornando-o resistente ao COVID-19.

Em 14 de maio de 2020, a revista Science divulgou as descobertas da Cell, traçando paralelos com outro artigo anterior de pesquisadores alemães que chegaram a uma conclusão semelhante. O artigo alemão, cuja pré-impressão foi publicada em 22 de abril de 2020 no Medrxiv, descobriu células T auxiliares que atacaram a SARS-CoV-2 em 15 de 18 pacientes hospitalizados com COVID-19. Conforme relatado pela Science:

“As equipes perguntaram se as pessoas que não foram infectadas com o SARS-CoV-2 também produziam células para combater a doença. Thiel e seus colegas analisaram o sangue de 68 pessoas não infectadas e descobriram que 34% hospedavam células T auxiliares que reconheciam o SARS-CoV-2.

A equipe de La Jolla detectou essa reatividade cruzada em cerca de metade das amostras de sangue coletadas entre 2015 e 2018, muito antes do início da atual pandemia...

Os resultados sugerem que "uma razão pela qual grande parte da população pode lidar com o vírus é que podemos ter uma pequena imunidade residual da nossa exposição a vírus do resfriado comum", diz o imunologista viral Steven Varga, da Universidade de Iowa. No entanto, nenhum dos estudos tentou entender se as pessoas com reatividade cruzada não são tão afetadas pelo COVID-19.

Antes desses estudos, os pesquisadores não sabiam se as células T tinham um papel na eliminação do SARS-CoV-2, ou mesmo se poderiam provocar uma reação exagerada do sistema imunológico. "Esses trabalhos são realmente úteis, porque começam a definir a função das células T na resposta imunológica", [Virologista da Universidade Columbia, Angela] Rasmussen diz.”

A imunidade a longo prazo contra o COVID-19 parece ocorrer de forma mais e mais ampla

Outro estudo, realizado por pesquisadores de Cingapura, descobriu que resfriados comuns, causados pelos betacoronavírus OC43 e HKU1, podem torná-lo mais resistente à infecção por SARS-CoV-2 e que a imunidade resultante pode durar até 17 anos.

Além do resfriado comum, o OC43 e o HKU1, dois dos betacoronavírus mais comuns, também são conhecidos por causar bronquite, exacerbação aguda de doença pulmonar obstrutiva crônica e pneumonia em todas as faixas etárias. Conforme relatado pelo Daily Mail:

“Eles compartilham muitas características genéticas com os coronavírus COVID-19, MERS e SARS, todos transmitidos de animais para humanos. Pensa-se que os coronavírus representam até 30% de todos os resfriados, mas não se sabe especificamente quantos são causados pelos tipos de betacoronavírus.

Agora, os cientistas descobriram evidências de que alguma imunidade pode estar presente por muitos anos devido às células T "memorizarem" ataques de vírus anteriores com uma composição genética semelhante, mesmo entre pessoas que não tiveram exposição conhecida ao COVID-19 ou SARS…

Foi coletado sangue de 24 pacientes que se recuperaram do COVID-19, 23 que tiveram SARS e 18 que nunca foram expostos a SARS ou COVID-19…

Metade dos pacientes do grupo sem exposição ao COVID-19 ou SARS possuía células T com reação imune aos betacoronavírus animais, COVID-19 e SARS. Isso sugeriu que a imunidade dos pacientes se desenvolvia após a exposição a resfriados comuns causados pelo betacoronavírus ou possivelmente por outros patógenos ainda desconhecidos.”

Em outras palavras, caso já tenha tido um resfriado comum causado por um betacoronavírus OC43 ou HKU1 no passado, você pode ter 50/50 de chances de ter células T defensivas que podem ajudá-lo a se defender contra o SARS-CoV-2, o novo coronavírus que causa o COVID-19.

Suporte oferecido por modelos estatísticos atualizados

Todos esses estudos reforçam os modelos mais recentes de mortalidade por COVID-19, sugerindo que há de fato resistência generalizada e imunidade prévia. Freddie Sayers, editor executivo da UnHerd, entrevistou recentemente o professor Karl Friston, estatístico cuja especialidade é modelagem matemática, que acredita que a imunidade anterior na população global pode chegar a 80%.

Friston criou a técnica de mapeamento paramétrico estatístico, que agora é o padrão para a compreensão de imagens cerebrais. Quando a pandemia entrou em erupção, ele começou a aplicar esse método de análise (que ele chama de “modelagem causal dinâmica”) aos dados do COVID-19, criando um modelo que prevê taxas de mortalidade muito mais baixas do que os modelos anteriores.

A razão para isso é que a "população suscetível efetiva", ou seja, aqueles que ainda não são imunes ao COVID-19 e, portanto, estão em risco de infecção, nunca foi de 100%. No máximo era 50% e provavelmente apenas cerca de 20%.

O modelo de Friston efetivamente vaporiza as alegações de que o distanciamento social é necessário, porque uma vez que comportamentos sensíveis, como ficar em casa quando doente são inseridos nele, o efeito positivo dos esforços de travamento em "achatar a curva" simplesmente desaparece. É possível que os bloqueios globais tenham sido completamente desnecessários e certamente não deveriam continuar, agora ou no futuro.