Por Dr. Mercola
Nas últimas décadas, o café, assim como outra bebida popular, o chá, foram identificados como uma bebida saudável se consumida em quantidades adequadas. O consumo de café está associado à uma redução nos riscos de mortes prematuras e doenças relacionadas ao coração, câncer, diabetes, cirrose e doença hepática gordurosa não alcoólica.
Já o consumo de chá foi associado à uma redução nos riscos de derrame, diabetes e depressão, e também à uma melhora na pressão arterial, menores taxas de obesidade e níveis equilibrados de glicose.
A adição de creme ao café e, para algumas pessoas, no chá, altera muitas coisas, bem mais do que apenas o sabor. Tem a ver com as temperaturas, mas acabou se tornando um grande debate que dura décadas, ou até mesmo séculos.
Há relatos de que os cientistas ficaram fascinados com um vídeo em câmera lenta (gravado a 2.000 quadros por segundo) de uma gota de leite pingando em um copo de café quente, porque, por alguns nano segundos, o creme flutuou.
O vídeo em questão demostra que quando você mistura dois líquidos miscíveis, eles normalmente se combinam imediatamente. Mas quando existe uma pequena demora na mistura, a base do leite se aquece só um pouquinho, mas o suficiente para esfriar a superfície do café que está diretamente abaixo da gota.
“As moléculas do leite e do café começam a se movimentar em direção circular, fazendo com que haja um fluxo de ar ao redor da parte inferior da gota, criando pressão o suficiente para ‘levitá-la’. Os pesquisadores dizem que, teoricamente, é possível levitar uma gota de leite para sempre, contando que o café embaixo dela permaneça quente, e a gota de leite permaneça fria."
John Bush, um professor de Matemática Aplicada da MIT, disse que se fosse possível manter essa diferença nas temperaturas, o creme poderia ser “levitado” por tempo indeterminado, e que, embora seja mais fácil adicionar uma gota quente em uma banheira de água fria, funcionaria melhor se você pudesse adicionar alguma forma de aquecimento na parte interior da gota.
O vídeo também explica que essa descoberta vai muito além de café ou chá com leite, pois manter líquidos separados é um fator crucial em outras áreas, como nas impressões a jato de tinta e em exames de DNA. Os cientistas também dizem que a descoberta pode influenciar a forma pela qual as tecnologias avançam, e possibilitar um melhor entendimento sobre como as pequenas gotas se comportam na natureza.
É a semântica que determina se é o leite ou o chá que é adicionado primeiro?
O escritor e editor Steve Rousseau da página Digg concorda que as pessoas devem adicionar o creme ou o leite antes do café, mas por razões mais simples: “Se você adicionar o creme antes, e depois adicionar o café, a bebida se mistura sozinha.” Ele também disse que adicionar o creme antes pode tornar difícil acertar na quantidade, mas só nas primeiras vezes. Com um pouco de prática, você vai conseguir adicionar a quantidade certa.
Na Inglaterra, onde as pessoas costumam preferir o chá ao invés do café, o jornal The Guardian, fundado em 1821, publicou uma matéria em 2014 afirmando que existem evidências científicas confirmando como fazer o chá britânico perfeito. Segundo o jornal, o leite deve ser adicionado antes do chá, e essa foi “a descoberta mais importante da história da humanidade. O fogo veio em segundo lugar, porque você precisa dele para ferver a água”.
Quem diria que este seria o motivo de tanta discussão? O artigo mencionou um Dr. Stapley da Universidade de Loughborough, que testou a teoria e concluiu que adicionar o leite no copo após ferver a água é “incorreto”, pois isso faz com que o leite ferva de forma não uniforme, já que as proteínas do leite se “agrupam”, alterando sua textura e seu sabor. Mas além da água e do leite, também devemos considerar o saquinho de chá, e em qual ordem ele deve ser adicionado ao copo.
O artigo também refutou qualquer sugestão de que o café possa ser mais popular na Grã-Bretanha do que o chá, especialmente ao levar em conta a história da folha do chá, que foi sujeita, segundo um autor, ao “maior ato de espionagem corporativa da história”.
E ainda tem a discussão sobre a temperatura da água utilizada para fazer o chá perfeito, que supostamente deve ser mantida no ponto de ebulição até mesmo enquanto estiver sendo adicionada no copo. Outro argumento é que a água não deve ser fervida mais de uma vez, pois isso pode fazer o chá ficar “sem graça”. A marca Yorkshire Tea afirma que certos protocolos devem ser seguidos para “transformar um simples saquinho de chá em um bom copo de chá”.
Não se trata do café ou do creme, se trata da química
Nos anos 20, foi feito um experimento muito interessante. O matemático Ronald Fisher, ao saber que uma bióloga de algas chamada Muriel Bristol gostava de leite em seu chá, serviu um copo para a moça, mas cometeu o erro de adicionar o leite antes do chá. Muriel ficou indignada, insistindo que é o leite que deve ser adicionado ao chá, e não o contrário.
Irritado pela mesquinharia da bióloga, Ronald argumentou que, termodinamicamente, que diferença faria a ordem em que as bebidas eram adicionadas ao copo? Muriel rebateu dizendo que faz toda diferença para ela, e que ela conseguia identificar diferença no sabor. A discussão deve ter sido bem interessante, pois as pessoas estavam se aglomerando para ver se o debate terminaria em uma briga.
Foi então que William Roach, o noivo de Muriel, sugeriu que fizessem um experimento improvisado, e oito copos de chá foram alinhados aleatoriamente na frente da bióloga.
Somente Ronald e William sabiam quais eram os quatro copos nos quais o leite foi adicionado antes do chá e quais eram os outros quatro nos quais o chá foi adicionado antes. Imagine o desgosto e a perplexidade no rosto de Ronald quando Muriel declarou corretamente como todos os copos foram preparados. O Instituto da História da Ciência explicou:
“Parece que adicionar chá ao leite não é a mesma coisa que adicionar leite ao chá, por razões químicas. Ninguém sabia disso na época, mas as gorduras e proteínas do leite, que são hidrofóbicas, ou seja, não se misturam com a água, podem se agrupar e formar glóbulos quando o leite é misturado à água. Então, quando você adiciona leite ao chá fervente, as primeiras gotas do leite que tocam o chá podem ficar divididas e isoladas.
Cercados pelo líquido quente, esses glóbulos isolados são escaldados, e as proteínas neles presentes, que são desnaturadas a 70ºC, mudam de forma e adquirem um gosto de caramelo queimado. Em contrapartida, adicionar chá no leite previne o isolamento dos glóbulos, minimizando o escaldamento e a produção de sabores estranhos."
No início dos anos 20, os controles e padrões científicos eram raros, e os métodos utilizados não eram nada refinados. Os eventos interessantes que ocorreram na degustação de chá se tornaram muito importantes para Ronald Fisher, pois o matemático não conseguiu evitar de ponderar sobre as implicações dessa análise estatística.
Já que seu trabalho era descobrir métodos para efetuar experimentos mais precisos para ensaios clínicos (na época chamados de “experimentos”, simplesmente), Ronald vislumbrou uma oportunidade, e a agarrou.
Ronald utilizou o experimento de Muriel e o expandiu em adaptações para os experimentos científicos realizados durante os meses subsequentes, e escreveu sobre seu trabalho em seu livro, “The Design of Experiments”, e em seu outro projeto, “Statistical Methods for Research Workers".
Ronald expôs os conceitos da análise estatística, muitos dos quais ainda são utilizados hoje em dia, principalmente porque o evento ocorrido se tornou a base da previsibilidade e sequências de contagem. Ronald escreveu:
“Nosso experimento consistiu na mistura de oito copos de chá, quatro de um jeito e quatro de outro, os quais foram apresentados ao indivíduo em ordem aleatória.
O indivíduo recebeu uma explicação de antemão sobre como seria feito o teste, ou seja, que existiam quatro copos de cada tipo de chá, e que estes seriam apresentados em ordem aleatória, não determinada por escolha humana, mas pela manipulação de objetos físicos utilizados em jogos de azar."
Beber café traz muitas vantagens, mas os cremes artificiais… nem tanto
De acordo com um estudo de 2017, beber café está associado a vários benefícios à saúde, como uma melhora no funcionamento cerebral, melhora nas memórias a longo prazo, corações mais saudáveis, e vários outras vantagens.
Mas uma substância conhecida como acrilamida, um carcinógeno possivelmente neurotóxico, foi identificada como um possível problema quando o café é preparado, ou mais precisamente, dependendo do jeito em que o café é preparado. É um composto químico criado quando alimentos ricos em carboidratos são cozinhados em altas temperaturas, mas também é encontrada em água potável e água suja, e alimentos queimados.
Um juiz da Califórnia determinou que as embalagens de café devem vir com um aviso de perigo de câncer por causa da acrilamida. Além disso, algumas pessoas argumentam que a cafeína (umas das razões pelas quais o café, o chá e o chocolate são tão populares) pode perturbar o seu sono, o que pode se tornar um grande problema à saúde.
Foi descoberto que o chocolate amargo é saudável, mais que o chocolate ao leite, quando consumido com moderação. Mas a adição de cremes artificiais ao café ou chá, ou outros produtos que muitas vezes são usados como creme, pode ser um problema maior.
Ingredientes como óleos parcialmente hidrogenados, xarope de milho rico em frutose, glutamato monossódico, fosfato dipotássico e um conjunto de outras substâncias derivadas de compostos químicos fazem do seu “creme” uma coisa sintética, quimicamente nociva, que por coincidência tem um gosto bom.
Uma pesquisa sugere que existe uma forma melhor de misturar o creme em seu café. Existe uma razão científica pela qual os chefes de cozinha, antes de adicionar um creme à uma receita, às vezes misturam uma pequena amostra da comida com o creme de forma separada, mexendo bastante antes de adicionar no prato final.