A teoria metabólica do câncer e a chave para a prevenção e recuperação

células

Resumo da matéria -

  • Embora a medicina convencional não ofereça muito além da abordagem padrão de “cortar, envenenar e cauterizar”, novas evidências sugerem que a cetose nutricional pode tratar e prevenir a maioria dos cânceres
  • Ao contrário do que normalmente é ensinado, defeitos genéticos nucleares não causam câncer. O dano mitocondrial ocorre primeiro, o que por sua vez desencadeia mutações genéticas nucleares

Por Dr. Mercola

Todos os dias, cerca de 1.600 pessoas morrem de câncer nos Estados Unidos. Esse número aumenta mais de 10 vezes se você incluir a população global, ultrapassando os 21.000.

Embora a medicina convencional não ofereça muito além da abordagem padrão de “cortar, envenenar, cauterizar”, novas evidências sugerem que modificações dietéticas simples poderiam efetivamente tratar e prevenir a maioria desses cânceres.

Travis Christofferson, autor do fenomenal "Encontrando a verdade: O retorno da teoria metabólica do câncer ilumina um novo caminho de esperança para a cura".

O retorno da teoria metabólica do câncer

Nesta entrevista, Travis - graduado em Pré-Medicina e com um grau de mestrado em Engenharia e Ciência de Materiais - analisa alguns dos detalhes abordados em seu livro.

"Eu estava fazendo uma aula sobre teoria do câncer e me deparei com um livro de Thomas N. Seyfried chamado 'O Câncer como uma doença metabólica'", afirma Travis. "E era um livro excepcional...

Ele expôs um argumento bastante elegante para essa origem não genética do câncer; a origem metabólica.

Fiquei tão surpreso e perplexo com isso, e com o fato da maioria das pessoas não saberem disso, que compilei uma enorme lista de perguntas e realmente voei para Boston para encontrar Tom... Ele respondeu todas as minhas perguntas, o que despertou ainda mais meu interesse."

Travis achou que toda a história precisava ser contada e daí nasceu o seu livro "Tripping Over the Truth".

O efeito Warburg

A maioria dos estudantes de saúde natural reconhece o nome do Dr. Warburg, ganhador do Prêmio Nobel de Medicina em 1931 por sua descoberta de que as células cancerígenas têm um metabolismo energético fundamentalmente diferente quando comparado às células saudáveis.

O que nem todos sabem é que ele era um amigo pessoal dos físicos alemães Albert Einstein e Max Planck, e que recebeu o segundo Prêmio Nobel em 1944, mas foi impedido por Hitler de ir a Estocolmo para buscá-lo. Ele é considerado por muitos especialistas como o maior bioquímico do século XX.

O Dr. Warburg descobriu que, na presença de oxigênio, as células cancerígenas produzem mais ácido lático. Esse fenômeno é conhecido como Efeito Warburg. Uma célula pode produzir energia de duas maneiras: aerobicamente nas mitocôndrias, ou anaerobicamente no citoplasma, gerando ácido lático - um subproduto tóxico.

A teoria somática do câncer

No entanto, apesar de ganhar o Prêmio Nobel, suas idéias sobre o câncer não foram reconhecidas pela medicina convencional, que as rejeitou e ridicularizou. Seu caso foi ainda sabotado pela revolução no estudo da genética, que ocorreu quando Watson e Crick descobriram o DNA. A partir daí, toda a atenção foi voltada para a genética.

"1976 foi quando Harold Varmus e Michael Bishop ganharam o Prêmio Nobel por encontrar oncogenes virais no DNA de células cancerígenas... Até então, havia uma teoria viral que competia com ela de que vírus poderiam causar câncer, mas não se sabia como.

Eles descobriram que o gene viral que estava sendo inserido era apenas uma cópia do gene que já tínhamos, porém distorcido.

Com isso, a teoria somática, de que o câncer é apenas uma versão distorcida de certos pontos normais da divisão celular, ganhou força; mutações, em outras palavras..."

As evidências mostraram claramente que algo além de mera mutação genética estava em jogo, e esse fato não foi esquecido pelos principais cientistas da área. Como observado por Travis, eles precisaram refazer sua teoria genética para se ajustar a ela. Uma das teorias é a chamada "matéria escura".

Para realmente fazer uma diferença nas estatísticas do câncer, precisamos nos concentrar no seu metabolismo

Watson estava focado na terapia direcionada e na teoria da mutação somática do câncer, tentando atacar os derivados proteicos das mutações no DNA. Porém, os medicamentos desenvolvidos com base nessa teoria têm apresentado resultados decepcionantes, apesar da ideia geral de que esse seria o caminho para a cura.

Desde então, ficou claro que esse não é o caso. Simplesmente há muita diversidade aleatória dentro dos genes. Há também o fenômeno da intra-heterogeneidade, que é a diferença nas mutações de célula para célula dentro de um mesmo tumor.

Por que as células cancerígenas revertem para geração anaeróbica de energia?

Então, por que exatamente as células cancerígenas revertem da geração de energia aeróbica para a anaeróbica? Pete Pedersen, Ph.D. na Johns Hopkins, levou a teoria do Dr. Warburg para o próximo nível, determinando morfologicamente que existe um número radicalmente reduzido de mitocôndrias nas células cancerígenas.

Normalmente, existem de centenas a milhares de mitocôndrias em cada célula, compreendendo de um terço a quase 50% do volume do interior das células. Elas geram o ATP, que as células utilizam como fonte de energia. Se há uma redução drástica nas mitocôndrias e as que restam são majoritariamente irregulares, quando funcionam, você tem um problema.

Essas células cancerígenas não têm escolha senão reverter para um metabolismo mais primitivo e ineficiente. As mitocôndrias saudáveis enviam sinais epigenéticos entre elas e para o núcleo. Essa sinalização epigenética das mitocôndrias é, na verdade, responsável por iniciar uma parcela significativa do dano genético que foi identificado no projeto de sequenciamento de DNA. Como observado por Travis:

"Há danos mitocondriais, isso é irrefutável. Basta observar as células cancerígenas para ver que os números são bastante reduzidos. Quando você isola as mitocôndrias, se você observá-las, verá que, morfologicamente, elas estão desarranjadas. Existem problemas nas proteínas, lipídios e todos os tipos de anomalias estruturais.

Sempre houve esse debate: por que a célula cancerosa apresenta o efeito Warburg? Por que ela está revertendo para a geração anaeróbica de energia? Ninguém realmente ligou isso à estrutura terrível das mitocôndrias. Eles não tinham os meios para enxergar as mitocôndrias como temos hoje".

A função mitocondrial determina o crescimento e repressão do câncer

Para esclarecer ainda mais, as células cancerígenas queimam glicose, um combustível inerentemente "sujo" uma vez que gera muito mais espécies de oxigênio reativas (ROS) do que as gorduras e cetonas. Mas, para queimar cetonas, a célula precisa estar saudável e normal. As células cancerígenas não conseguem queimar gordura, e este é o cerne do tratamento bem-sucedido do câncer, e o motivo pelo qual as dietas cetogênicas parecem ser eficientes. Elas basicamente matam o câncer de fome enquanto nutrem células saudáveis.

Seyfried fez um trabalho notável ao compilar evidências que apoiam a teoria metabólica do câncer. Por exemplo, ele redescobriu os chamados estudos de transferência nuclear, a maioria dos quais remonta à década de 1980. Foram experimentos muito simples e elegantes, nos quais o núcleo de uma célula cancerígena foram transferidos para uma célula normal com o seu núcleo original removido. As células são então cultivadas em uma placa de Petri, e subsequentemente implantadas em ratos para estudar o comportamento.

O que eles descobriram foi que, quando você pega o núcleo de uma célula cancerígena, coloca-o em uma célula normal e em seguida as insere nos camundongos, nada acontece. Nenhum câncer se desenvolve e as células voltam ao normal. Isso apesar do fato de você ter inserido células que possuem todas as mutações supostamente causadoras de câncer! Então, por que você não contrai câncer?

Tratamento inovador oferece uma nova esperança para pacientes com câncer

Existe uma bioquímica coreana brilhante trabalhando com Pedersen na Johns Hopkins: A Dra. Young Ko, Ph.D., que eu prevejo que receberá um Prêmio Nobel em breve por seu trabalho. Eu acredito que ela possui a resposta para um grande número de cânceres metastáticos intratáveis.

O que os dois notaram foi que, quando as células cancerígenas superproduzem ácido lático, elas precisam produzir mais poros, os chamados fosfatos de transferência de ácido monocarboxílico, para liberar esse ácido lático, ou a célula cancerígena morre de dentro para fora. O ácido lático é uma substância bastante tóxica. Travis relata a sequencia de eventos que levou a uma de suas descobertas mais notáveis:

"Young estava pensando: 'Bom, existe essa diferença funcional entre uma célula normal e uma célula cancerosa. Como podemos aplicar isso?' Pete estava tentando fazer isso através de uma espécie de método de backdoor, a partir da expressão do gene, o que não estava funcionando.

Então, ela lembrou-se de um composto com o qual trabalhara enquanto fazia seu doutorado em Washington, chamado 3-bromopiruvato (3bp). Esta é uma moléculazinha muito interessante, parecida com ácido lático, mas muito reativa.”

Esforços em andamento para levar o 3BP aos centros de tratamento de câncer

Por acaso, estou discutindo com a Dra. Ko para descobrir se podemos disponibilizar essa terapia para o público. Minha melhor estratégia para torná-la amplamente disponível era oferecê-la nos Centros de Tratamento de Câncer da América (CTCA), que recusaram seu pedido inicialmente. Eu vou tentar convencê-los de que isso é algo que eles precisam integrar em seu programa ou, pelo menos, oferecer como opção. Obviamente, o 3-bromopiruvato (3BP) não é uma pílula mágica. Mas precisa ser disponibilizado.

Naturalmente, o aspecto fundamental que deve ser abordado é o defeito mitocondrial metabólico, que envolve reduzir radicalmente os carboidratos não fibrosos da sua dieta e aumentar as gorduras de alta qualidade para que compreendam talvez 85% das calorias da dieta, juntamente com uma quantidade moderada de proteínas de alta qualidade, pois o excesso de proteína também pode desencadear o crescimento do câncer.

Essa é a solução. Se você não fizer isso, o 3BP sozinho provavelmente não funcionará. No entanto, eu acredito que se você estiver em uma dieta cetogênica e adicionar o 3BP, provavelmente poderá reverter praticamente qualquer câncer. Essa é a minha impressão, no momento. Ela pode ter falhas, e vou revisá-las conforme necessário, mas tudo o que vi aponta nessa direção. Travis concorda, dizendo:

"Certamente. Aparentemente, as terapias alimentares, como a cetose nutricional, são uma das fundações dessa abordagem terapêutica, pois tem efeitos incríveis no corpo, diferenciando entre células cancerígenas e células normais".

A função mitocondrial é essencial para a saúde

Agora estamos começando a perceber que a disfunção mitocondrial está no centro de praticamente todas as doenças, e o apoio à cetose nutricional está crescendo a largas passadas. Por mais de 80 anos, ela tem sido o padrão de tratamento para convulsões difíceis de curar em crianças. Mas agora também descobrimos que ela pode trazer benefícios contra uma grande variedade de outras doenças, incluindo doenças neurodegenerativas, como Alzheimer e Parkinson, obesidade, diabetes, insuficiência cardíaca, doenças coronarianas e artrite, para citar algumas.

O julgamento da dieta cetogênica para fisiculturistas e atletas de força ainda está pendente

Embora a dieta cetogênica pareça ser benéfica para a maioria dos estados de doença, é possível que ela não seja ideal para obter músculos realmente grandes. Para isso, você normalmente precisa de mais proteína, o que causará gliconeogênese, o que pode impedir que você receba os benefícios da cetose.

No entanto, alguns especialistas discordam deste argumento. Dominic D'Agostino, Ph.D. que ensina Farmacologia Molecular e Fisiologia na Faculdade de Medicina da Universidade do Sul da Flórida, segue uma dieta cetogênica e é excepcionalmente forte e musculoso.

Eu o entrevistei sobre os benefícios de cetose nutricional em 2013. Um dos fatores que amenizantes é que a dieta cetogênica tem como efeito poupar aminoácidos de cadeia ramificada, uma vez que as cetonas têm uma estrutura muito semelhante à dos aminoácidos de cadeia ramificada valina, leucina e isoleucina. Esses três também são os aminoácidos mais importantes para a construção muscular. De acordo com Travis:

"[D'Agostino] fez um estudo - acho que ainda não foi publicado; está circulando por algumas revistas - no qual eles pegaram atletas treinados em resistência e os colocaram em uma dieta ocidental normal e uma dieta cetogênica, e os monitorou por um período de tempo. Eles não observaram redução na massa muscular ou no desempenho.

O mais interessante é que, se você olhar para todos esses mecanismos, é verdade. Isso é algo que deveria ser inibido. Mas a dieta tem esse efeito de poupar de proteínas, já que você queima gordura. Então ela preserva o tecido proteico. Eu acho que o julgamento ainda está pendente. Pode ser que, se você quiser alcançar um estado anabólico e aumentar a massa muscular, ainda seja possível com uma dieta cetogênica.

Eu acho que a próxima fase da pesquisa serão as propriedades de sinalização das moléculas [cetonas]. Porque nós sabemos que, como combustível, elas são termodinamicamente incríveis. Elas são muito superiores à glicose. Eles simplesmente queimam de forma mais limpo, são mais eficientes e possuem mais energia."

Pesquisa não publicada confirma que o açúcar pode ser diretamente responsável pelo crescimento do câncer

Ao realizar as pesquisas para o seu livro, Travis teve longas discussões com Ko sobre o açúcar, já que a glicose em si, pelo menos dentro do modelo que ela estava usando, pode alavancar as células em direção ao câncer. Isso ocorre devido à regulação positiva da expressão de uma enzima criticamente importante chamada hexoquinase II, que é responsável pelo efeito Warburg.

Ela também é amplamente responsável pela imortalização da célula cancerígena, o que significa que ela não permite que a célula cancerígena morra conforme programado. A hexoquinase II inibe a apoptose, ou morte celular programada, permitindo assim que a célula se prolifere, quando em circunstâncias normais ela deveria ter morrido e sido eliminada do sistema.

Para ligar isso ao que discutimos anteriormente, a hexoquinase II é a enzima que o 3-bromopiruvato inibe. Ao inibir a hexoquinase II, o ácido lático se acumula e envenena a célula cancerosa, matando-a por dentro.