Por Dr. Mercola
As gorduras são uma parte essencial da alimentação. Mas nem todas são iguais. Então, como você sabe que está ingerindo uma gordura saudável e de alta qualidade? Nesta entrevista, a Dra. Cate Shanahan responde a essa importante pergunta.
Shanahan é médica da família e autora do livro "Deep Nutrition: Why Your Genes Need Traditional Food", originalmente publicado em 2008. Uma versão revisada e atualizada foi publicada este ano. Atleta ávida, competiu nas seletivas olímpicas e também prestou consultoria para o time de basquete Los Angeles Lakers.
A transição de Shanahan para a nutrição começou quando ela ficou doente. Ela acabou mergulhando profundamente na bioquímica e na biologia molecular, procurando uma conexão entre seu problema de saúde e sua alimentação, vindo a descobrir que não coincidia com o que ela havia aprendido na faculdade de medicina.
“Eu exercia medicina familiar no Havaí naquela época. Eu entrei para a faculdade de medicina com a fantasia de chegar à causa subjacente das doenças, principalmente as que costumava desenvolver como atleta, as quais estavam relacionadas aos tecidos.
Tive bursite e todos os "itis"… Eu era corredora … Na verdade, eu tinha uma bolsa [e] me qualifiquei para as seletivas olímpicas [na] corrida de 1.500 metros … Em 2001 … desenvolvi esse problema no meu joelho e acabei não conseguindo andar mais do que alguns passos sem sentir dores, inchaço e febre.
Ao deixar de ser uma atleta de alto nível que se exercitava uma ou duras horas por dia para ficar presa a um sofá, senti que minha vida havia acabado … Eu não sabia o que estava errado. Passei por uma cirurgia. Fui a tantos especialistas e nada ajudou."
As raízes nutricionais da dor e inflamação
Então, seu marido sugeriu que o hábito de ingerir açúcar pudesse ter algo a ver. Ela adicionava uma calda especial de caramelo e um quarto de xícara de açúcar ao café todos os dias. Depois de correr 16 quilômetros, ela devorava um pacote de M&M's, sem pensar em nada, já que não estava acima do peso e praticava exercícios.
"Ele fisicamente me entregou um livro para que eu começar a ler, porque eu era muito teimosa", diz ela. “O livro que ele me deu se chamava 'Spontaneous Healing: How to Discover and Embrace Your Body's Natural Ability to Maintain and Heal Itself', de Andrew Weil.
A frase que me chamou a atenção falava [como] os ácidos graxos ômega-3 são semelhantes às vitaminas. Isso me surpreendeu por completo, porque eu achava que as gorduras fizessem mal. Que eram todas iguais. Eu não sabia que havia gorduras essenciais das quais o corpo precisava para algo em particular e que não podíamos fazer …
Eu pensei: 'Quer saber? Existem gorduras que são boas? Quais são?' Mesmo sem conseguir andar, peguei um avião para Oahu. Tive que pegar uma cadeira de rodas no aeroporto para ir à biblioteca médica … Isso foi por volta de 2001. Não tínhamos Google. A Amazon não fazia entregas no Havaí naquela época …
Peguei três livros sobre ácidos graxos e bioquímica. Eu os li de capa a capa. Quando terminei, percebi que havia muito mais na ciência da nutrição do que o que havíamos aprendido."
Que surpresa! As gorduras saturadas fazem bem
Como tantos outros médicos convencionais, Shanahan estava convencida de que as gorduras saturadas eram ruins — muito ruins — e que o colesterol deveria ser evitado a todo custo. As gorduras poli-insaturadas, dos óleos vegetais e da margarina, por outro lado, faziam bem. Naquela época, as gorduras trans eram amplamente desconhecidas. O ômega-3 também não tinha tanto reconhecimento público.
"Eu não podia acreditar", disse Shanahan. “Eu estava tipo, 'Como toda a medicina pode estar tão errada?'” Um princípio fundamental que a fez perceber a importância para a saúde das gorduras na alimentação foi a compreensão de como as gorduras se oxidam.
Os ácidos graxos poli-insaturados (encontrados nos óleos vegetais) têm ligações altamente perecíveis que reagem com o oxigênio, criando uma série de radicais livres que transformam os ácidos graxos normais do seu corpo em moléculas perigosas de elevada energia e que se movem rapidamente, causando estragos de uma forma semelhante à radiação.
Considerando as grandes quantidades de açúcar que Shanahan costumava comer, é bastante óbvio que ela — como a maioria das pessoas que adotam a alimentação norte-americana moderna — queimava açúcar como seu principal combustível. Isso levava à disfunção mitocondrial que, no caso dela, surgia como uma inflamação nos joelhos.
Como eu, Shanahan concluiu que, na verdade, você precisa de 60% a 85% de suas calorias diárias na forma de gordura. Mas nem todas as gorduras se qualificam, e é por isso que o livro de Shanahan é uma mina de ouro. Ela realmente entra em detalhes sobre os diferentes tipos de gorduras e explica por que os óleos vegetais, como o de soja, canola e milho, são tão tóxicos para o corpo humano.
Esse entendimento é compartilhado apenas por um pequeno punhado de cientistas especializados em lipídios, pois é muito técnico, e é por isso que não o vemos ser trazido para o primeiro plano da ciência nutricional, aonde pertence. E, se o fosse, mudaria tudo.
Os óleos vegetais dizimam a saúde em mais de uma maneira
A triste realidade é que os óleos vegetais processados industrialmente estão presentes na alimentação da ampla população. Estatísticas mostram que um norte-americano médio obtém algo entre 30% e 50% de suas calorias a partir desses óleos — não porque cozinham com eles, mas porque eles estão em muitos alimentos processados.
Os óleos vegetais processados e refinados estão em molhos para salada e em refeições de restaurante; eles podem até ser rotulados como orgânicos. O motivo pelo qual os óleos vegetais fazem mal tem a ver com sua estrutura molecular.
"Os óleos vegetais são poli-insaturados. Isso significa que eles têm duas ligações duplas [em grande proximidade] … Essa estrutura química tem consequências muito importantes para a forma como esses óleos mudam quando os manipulamos no processamento e refino … e, novamente, quando cozinhamos com eles", diz Shanahan.
A gordura poli-insaturada encontrada nestes óleos não é prejudicial por si só, mas torna-se perigosa quando consumida em excesso e/ou quando os óleos se degradam, o que ocorre durante o refino, processamento e aquecimento (ao cozinhar ou fritar os alimentos). Eles não só podem formar gorduras trans se aquecidos o suficiente, mas também podem formar aldeídos cíclicos, que são ainda mais nocivos.
Se você ter o costume de comer alimentos processados, é praticamente certeza de que está ingerindo muitos desses óleos — mais de 10 vezes além do que seu corpo pode lidar com segurança — e devido ao intenso refino e processamento que ocorre com os alimentos processados, os óleos são altamente degradados e, portanto, tóxicos.
Seu cérebro precisa de gorduras saudáveis
Seu cérebro tem cerca de 50% de gordura em peso seco e cerca de 30% disso são de ácidos graxos essenciais ômega-3 e ômega-6. Ambos são igualmente importantes, observa Shanahan. O problema é que a maioria das pessoas ingere muito pouco ômega-3 e muito ômega-6, a maioria dos quais são gravemente danificados pela oxidação devido ao processamento.
Uma das razões pelas quais o cérebro é tão suscetível ao envelhecimento e às doenças relacionadas com a idade é porque você tem grandes quantidades desses ácidos graxos altamente reativos e facilmente oxidáveis em seu cérebro. Para manter o funcionamento ideal do cérebro, você precisa de ômega-3 e ômega-6 não danificados de alta qualidade juntamente com antioxidantes para protegê-los da oxidação. Resumindo, os óleos vegetais processados fazem mal para a saúde cerebral por vários motivos, incluindo os seguintes:
- São repletos de ácidos graxos ômega-6 danificados e sem antioxidantes que os protejam
- Privam o fígado da glutationa, que produz enzimas antioxidantes, reduzindo ainda mais suas defesas antioxidantes
- A maioria dos óleos vegetais é feita de plantas geneticamente modificadas para resistir a herbicidas como o glifosato. Por isso, essas plantas podem sofrer maior contaminação por glifosato do que aquelas que não foram geneticamente modificadas, e já foi comprovado que glifosato perturba as junções de oclusão do intestino e aumenta a penetração de invasores, especialmente proteínas aquecidas, que podem causar alergias
Os tóxicos produtos de degradação encontrados nos óleos vegetais inibem uma enzima chamada delta-6 desaturase (delta-6). Talvez a gordura mais importante para a saúde física e cerebral seja o ácido docosaexaenoico (DHA). O DHA é absolutamente essencial, porque seu corpo não o queima como combustível; em vez disso, o DHA é integrado às membranas celulares. O DHA também é essencial para a conversão de fótons do sol em corrente elétrica para energizar suas mitocôndrias.
Pesquisas mostram que restringir o ômega-6 na alimentação permite que o fígado funcione melhor, possibilitando a elevação do ômega-3 de cadeia curta com mais eficiência. Esse processo envolve a delta-6, e essa enzima é inibida pelos tóxicos produtos de degradação dos óleos vegetais. Níveis elevados de insulina também inibem essa enzima.
O segredo é cozinhar do zero
Uma estratégia fundamental para evitar essas toxinas perniciosas é comer comida de verdade, e isso significa cozinhar a maior parte das refeições em casa.
“O primeiro passo que recomendo aos meus pacientes … é começar com um café da manhã saudável … Tomar leite de boa qualidade [orgânico e de vacas terminadas a pasto] no café, se puder, ou pelo menos orgânico. Isso vai ajudar a queimar gordura. Sem carboidratos, mas bastante gordura natural saudável.
Você também pode comer ovos com queijo, manteiga e talvez vegetais dos quais goste para dar sabor — mas não os vegetais ricos em amido, obviamente. Esses são dois exemplos de um café da manhã realmente saudável … Se você toma um café da manhã com alto teor de gordura … então você não tem aquela sensação de fome tão forte na hora do almoço. Você não precisa fazer um lanche … e pode se concentrar melhor …"
Na fase de transição, quando está ensinando seu corpo a queimar gordura como seu combustível principal, pode ser melhor colocar manteiga de vacas terminadas a pasto em seu café, pois o leite contém açúcar na forma de galactose. Outra estratégia importante é evitar a adição de óleos, e comer o alimento in natura do qual os óleos são derivados. Se você quiser óleo de abacate, use abacate. Se quiser óleo de linhaça, use linhaça. Se quiser óleo de semente de gergelim, use gergelim.
O azeite é uma exceção, pois não é um óleo processado. Na verdade, é prensado, embora haja o problema da adulteração. A grande maioria do azeite no mercado é adulterada com outros óleos vegetais de baixa qualidade. O óleo de coco é outra exceção à regra acima. Conforme observado por Shanahan, "é por isso que quando as pessoas seguem a dieta de Esselstyn ou Ornish e evitam adicionar todos os tipos de óleo, elas experimentam benefícios. [Elas] estão tirando esses óleos tóxicos da alimentação."