A intoxicação infantil por medicamentos vem aumentando

Fatos verificados
intoxicação

Resumo da matéria -

  • Entre 2001 e 2008, 453.559 crianças de 5 anos ou menos deram entrada em um estabelecimento de saúde após a exposição a dosagens potencialmente tóxicas de um medicamento
  • Entre 2001 e 2008, intoxicações não intencionais por medicamentos em crianças de 5 anos ou menos aumentaram 22%
  • Os medicamentos prescritos foram responsáveis por 71% das lesões graves, com os opioides, sedativos-hipnóticos e medicamentos cardiovasculares no topo da lista dos remédios que causam danos graves
  • 51,5% dos casos não-intencionais de intoxicação por medicamentos em crianças envolveram remédios com uma embalagem originalmente à prova de crianças
  • Em 49,3% dos casos que envolveram medicamentos para transtorno do déficit de atenção e hiperatividade e 42,6% daqueles que envolveram um opioide, a embalagem do medicamento foi deixada aberta

Por Dr. Mercola

Além de causar uma ampla variedade de efeitos colaterais naqueles que tomam medicamentos, o amplo uso rotineiro de remédios também representa um sério risco para as crianças que colocam as mãos neles.

Em 2016, quase metade da população dos EUA usava pelo menos um medicamento. 24% usavam três ou mais medicamentos, e 12,6% usavam mais de cinco. De acordo com a Pesquisa Nacional de Cuidados Médicos Ambulatoriais de 2016, 73,9% de todas as consultas médicas também envolveram terapia com remédios.

Como é de se esperar, o uso de medicamentos aumenta drasticamente com a idade. Em 2016, 18% das crianças menores de 12 anos usavam medicamentos prescritos, em comparação com 85% dos adultos acima de 60 anos. Embora essa tendência já seja preocupante por si só, os medicamentos prescritos agora são um item básico na maioria dos lares, gerando mais e mais casos de intoxicação infantil.

Os medicamentos apresentam sérios riscos para crianças pequenas

De acordo com um artigo de 2012 no Journal of Pediatrics, que revisou os registros de pacientes do Sistema Nacional de Dados sobre Venenos da Associação Americana de Centros de Controle de Intoxicações, 453.559 crianças com 5 anos ou menos foram admitidas em um estabelecimento de saúde após a exposição a dosagens potencialmente tóxicas de um medicamento farmacêutico entre 2001 e 2008.

Nesse período, as intoxicações aumentaram em 22%. Noventa e cinco por cento dos casos se deveram à auto-exposição, o que significa que as próprias crianças ingeriram o remédio por conta própria.

43% de todas as crianças internadas no hospital após a ingestão acidental de medicamentos foram parar na unidade de terapia intensiva, e os medicamentos prescritos (em oposição aos de venda livre) foram responsáveis por 71% dos ferimentos graves, com opioides, sedativos e medicamentos cardiovasculares figurando no topo da lista. Como observado pelos autores:

"Os esforços de prevenção se provaram inadequados diante da crescente disponibilidade de medicamentos prescritos, particularmente dos tipos mais perigosos".

Mantenha os medicamentos em embalagens à prova de crianças

Pessoas mais velhas se lembram de que, antigamente, os pais tinham gavetas trancadas com cadeado na qual guardavam seus remédios. Atualmente, poucas pessoas mantêm seus medicamentos em armários ou caixas trancadas, sem perceber o sério risco que eles representam para as crianças.

O risco é ainda maior se você classificar seus medicamentos em organizadores diários de comprimidos, que são fáceis de abrir, em vez de manter cada um em seu recipiente original.

Um artigo de 2020 do Journal of Pediatrics, que buscava "identificar tipos de recipientes a partir dos quais crianças pequenas tinham acesso a medicamentos em grandes dosagens durante exposições não supervisionadas a medicamentos", descobriu que 51,5% dos medicamentos eram acessados porque haviam sido removidos de sua embalagem original à prova de crianças.

Notavelmente, em 49,3% dos casos que envolvem medicamentos para transtorno do déficit de atenção e hiperatividade e 42,6% dos casos que envolvem um opioide, o medicamento não estava em nenhum recipiente ao ser acessado. Em outras palavras, a criança achou o comprimido literalmente solto em uma mesa ou balcão. Em 30,7% de todos os casos em que uma criança ingeriu um medicamento, a exposição envolveu a medicação dos avós. Como observado pelos autores:

"Os esforços para reduzir a exposição pediátrica ao medicamento em doses representativas também devem abordar exposições nas quais adultos, e não crianças, removem medicamentos da embalagem.

As inovações em embalagens/armazenamento projetadas para incentivar os adultos a manter os produtos em embalagens resistentes a crianças e mensagens educacionais específicas podem ser direcionadas com base em circunstâncias comuns de exposição, classes de medicamentos e destinatários dos medicamentos."

As overdoses entre adolescentes também vem aumentando

Embora os bebês sejam notórios por colocar toda e qualquer coisa na boca, o que os torna particularmente vulneráveis a exposições acidentais a medicamentos, as overdoses de medicamentos, especialmente aquelas que envolvem opioides e benzodiazepínicos, também estão se tornando mais prevalentes entre os adolescentes.

De acordo com um estudo de 2019 publicado na revista Clinical Toxicology, 296.838 crianças menores de 18 anos foram expostas a benzodiazepínicos entre janeiro de 2000 e dezembro de 2015. Durante esse período, a exposição à benzodiazepina nessa faixa etária aumentou em 54%. Segundo os autores:

"A gravidade dos resultados médicos também aumentou, assim como a prevalência da co-ingestão de vários remédios, especialmente em adolescentes de 12 a 18 anos. Quase metade de todas as exposições relatadas em 2015 foram documentadas como abuso intencional, uso indevido ou tentativa de suicídio, refletindo uma mudança com relação aos anos anteriores…

Os profissionais da área de saúde devem estar cientes dessa epidemia crescente para evitar danos a adolescentes, crianças pequenas e bebês."

Uma tendência semelhante foi descoberta envolvendo opioides. Um estudo de 2017 sobre a exposição a opioides prescritos entre crianças e adolescentes nos EUA de 2000 a 2015 constatou:

"Os centros de controle de intoxicação receberam relatos de 188.468 exposições a opioides prescritos em pessoas de até 20 anos de idade entre 2000 a 2015… A hidrocodona foi responsável pela maior proporção de exposições (28,7%), e 47,1% das crianças expostas à buprenorfina foram admitidas em um serviço de saúde (HPS).

As chances de ser admitido num HPS foram maiores para adolescentes do que para crianças de 0 a 5 anos ou crianças de 6 a 12 anos. Os adolescentes também tiveram as maiores complicações médicas... A taxa de suspeitos de suicídios relacionados a opioides prescritos entre adolescentes aumentou 52,7% durante o período do estudo."

Precauções e bom senso

Os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA promovem e apoiam a campanha Up and Away and Out of Sight (em tradução livre: Para o Alto e Avante, e Fora de Vista), que visa "várias medidas simples, orientadas por dados, que pais e cuidadores podem tomar para prevenir as overdoses de medicamentos em crianças". Essas precauções incluem:

  • Guarde seus medicamentos (e suplementos) na embalagem original, em um local que seus filhos não possam alcançar. Não armazene medicamentos em sua mesa de cabeceira ou na bolsa, locais onde seus filhos podem facilmente acessá-los. Qualquer medicamento armazenado na geladeira deve estar em uma embalagem à prova de crianças. Certifique-se também de que os medicamentos sejam armazenados com segurança nas áreas que seus filhos visitam com frequência, como a casa dos avós ou da babá.
  • Guarde todos os medicamentos após cada uso.
  • Certifique-se de fechar a tampa de segurança após cada uso.
  • Ensine seus filhos sobre os medicamentos e nunca diga a eles que os remédios são "como doces" quando eles precisarem fazer uso de um deles.
  • Lembre seus hóspedes de colocar bolsas e casacos que contenham remédios em um local seguro durante a visita.

O que fazer em caso de exposição acidental a medicamentos?

Deixe um número de emergência na discagem rápida do seu celular e no da sua babá. Caso suspeite que seu filho tomou um medicamento não prescrito, ainda que ele não esteja apresentando qualquer sintoma, leve-o ao médico imediatamente.

Se você não tiver certeza de qual medicamento seu filho tomou, leve-o a um posto médico o mais rápido possível. Embora ele possa parecer bem nos minutos iniciais, esse quadro pode mudar rápida e drasticamente. É importante iniciar o tratamento o mais rápido possível para reduzir o risco de morte ou danos permanentes.

Lembre-se de levar os nomes de quaisquer medicamentos que seu filho possa ter ingerido acidentalmente, bem como quaisquer medicamentos que ele tenha tomado nas últimas 24 horas, conforme prescrito pelo médico, alergias que ele tenha e quaisquer alterações ou sintomas que você possa ter observado.

Infelizmente, os sintomas de uma overdose de medicamentos podem variar bastante, dependendo do remédio, da dosagem e da idade da criança. Dito isto, os sintomas de uma overdose podem incluir:

Náusea

Diarreia ou vômito

Baba ou ressecamento da boca

Convulsões

Pupilas dilatadas ou encolhidas

Sudorese

Perda de coordenação e/ou fala arrastada

Fadiga extrema

Pele ou olhos amarelados

Sintomas similares aos da gripe

Sangramento ou hematomas incomuns

Dor abdominal

Dormência

Frequência cardíaca acelerada

Caso seu filho apresente algum dos seguintes sintomas, ligue para o 192 (SAMU) imediatamente:

Não conseguir acordar

Não conseguir respirar

Contrações ou tremores incontroláveis

Comportamento extremamente estranho

Dificuldade para engolir

Erupção cutânea que se espalha rapidamente

Inchaço no rosto, língua e lábios

A epidemia opioide cobra seu preço da população pediátrica

É crucial perceber que muitos medicamentos podem ser fatais para uma criança pequena, mesmo em doses baixas. Isso é particularmente verdade para os opioides e a buprenorfina, um medicamento usado para tratar a dependência de opioides. Conforme observado em um artigo de 2005 sobre exposição de crianças a opioides:

"A ingestão de analgésicos opioides por crianças pode levar a uma toxicidade significativa como resultado da depressão do sistema nervoso central e respiratório. Uma revisão da literatura médica foi realizada para determinar se baixas doses de opioides são perigosas na população pediátrica com menos de 6 anos de idade.

A metadona foi considerada a mais tóxica dos opioides; doses baixas como um único comprimido podem levar à morte. Todas as crianças que ingeriram qualquer quantidade de metadona precisam ser observadas em um pronto-socorro por pelo menos 6 horas e consideradas para admissão hospitalar.

A maioria dos outros opioides é melhor tolerada em ingestões tão pequenas como um ou dois comprimidos. Com base nos dados limitados disponíveis para esses opioides, concluímos que doses equianalgésicas de 5 mg/kg de codeína ou mais requerem 4 a 6 h de observação.

Os dados sobre o propoxifeno e outros compostos de liberação prolongada são limitados; suas meias-vidas prolongadas sugerem a necessidade de períodos mais longos de observação. Todas as ingestões de opioides que levam à depressão respiratória ou depressão significativa do sistema nervoso central requerem admissão em uma unidade de terapia intensiva."

Um artigo de 2006 sobre os efeitos adversos da exposição não intencional à buprenorfina em crianças observou que:

"A buprenorfina sublingual foi recentemente introduzida no mercado americano para o tratamento da dependência de opioides. Tivemos uma série de 5 crianças com depressão respiratória e declínio do estado mental após exposição não intencional à buprenorfina.

Apesar da atividade agonista parcial da buprenorfina e do efeito teto na depressão respiratória, todas as crianças precisaram de internação hospitalar ou ventilação mecânica…

O crescente uso da buprenorfina como terapia caseira para dependência de opioides nos Estados Unidos levanta preocupações de saúde pública para a população pediátrica."

A mensagem principal aqui é: à medida que o tratamento com medicamentos aumenta e se torna cada vez mais prevalente entre todas as faixas etárias, o risco de exposição não intencional também cresce. As crianças colocam quase tudo na boca e geralmente não reconhecem que há uma diferença entre comprimidos e balas.

Como pais e cuidadores, devemos tomar as precauções necessárias para manter todos os medicamentos em um local seguro, fora do alcance de mãos curiosas. A falta de precauções com seus medicamentos pode ter consequências profundamente trágicas. Portanto, leve esse assunto a sério.