Por Dr. Mercola
O uso do gengibre como tratamento para sintomas físicos, não só como tempero, é tão antigo quanto a medicina tradicional chinesa, que conta com milhares de anos de existência. A medicina ayurvédica do leste da Índia também se rendeu ao uso medicinal do gengibre há séculos.
Muitas plantas e alimentos à base de plantas são respeitados pelos cientistas nos dias de hoje, depois que ensaios clínicos comprovaram que essas ervas e vegetais faziam exatamente o que os curandeiros tradicionais afirmavam eras atrás. O gengibre é um rizoma, ou raiz, cujas aplicações chegam às centenas na prevenção, tratamento e alívio dos sintomas de muitos transtornos e desequilíbrios. Um dos mais importantes é a náusea.
Um dos mais significativos, porém, é o uso do gengibre no alívio da enxaqueca. É daí, inclusive, que vem sua eficácia contra as náuseas. Se essa informação fosse mais divulgada, traria alívio para milhares de pessoas.
Estudos revelam que cerca de 28 milhões de pessoas sofrem com enxaqueca, uma dor decorrente da dilatação excessiva dos vasos sanguíneos da cabeça. As dores causadas pelas enxaquecas podem ser persistentes e debilitantes. De acordo com o site Migraine.com:
"Alguns estudos sobre enxaqueca estimam que 13% dos adultos têm enxaqueca e cerca de 2 a 3 milhões deles sofrem de crises crônicas. Além disso, quase 5 milhões de pessoas têm pelo menos uma crise de enxaqueca por mês".
É difícil saber quem foi o primeiro a apresentar a ideia de que uma planta poderia ser usada no alívio de dores, mas provavelmente o assunto foi levantado durante uma conversa sobre tratamentos mais eficientes. Um dos médicos envolvidos provavelmente se lembrou de ter ouvido rumores sobre o poder que o gengibre tem de aliviar enxaquecas. De acordo com o Dr. Michael Greger:
"Como se trata apenas de uma especiaria comum e segura, (o médico) aconselha um de seus pacientes de enxaqueca a tentar. Ao primeiro sinal de uma crise, o paciente mistura um quarto de colher de chá de gengibre na água, bebe e percebe que, em meia hora, a enxaqueca se foi. E funciona todas as vezes, sem efeitos colaterais".
Evidências informais, estudos clínicos e um produto comercializável
Um estudo demonstra que há muito mais do que rumores por trás do poder do gengibre. Um ensaio clínico duplo-cego, randomizado e controlado testou a eficácia do gengibre contra um fármaco bilionário, conhecido como sumatriptana (comercializado internacionalmente como Imitrex ou Sumax no Brasil).
Esse é remédio para enxaqueca mais vendido no mundo. Por incrível que pareça, os pesquisadores descobriram que um quarto de colher de chá de gengibre funciona tão rápido (cerca de duas horas) e eficientemente quanto o medicamento.
Impressionados, os cientistas tentaram novamente, comparando metade da quantidade anterior de gengibre com uma dose pesada da droga. Os mesmos resultados foram apurados: ambos funcionaram rapidamente. Os pacientes que relatavam dores intensas ou moderadas sentiram um alívio total ou parcial do sintoma.
Estudos com esse formato não são considerados científicos, sendo descartados pela comunidade médica na maioria dos casos. Embora alguns médicos compartilhem da mesma opinião, a realidade é que um ensaio clínico adequado raramente acontece caso não haja oportunidade de lucro. Até 2023, espera-se que o mercado da enxaqueca gere 2.7 bilhões de dólares.
O site Nutrition Facts observa:
"O problema é: quem vai pagar por isso? O mercado de medicamentos para enxaqueca movimenta bilhões de dólares. Um quarto de colher de chá de gengibre em pó custa centavos. Quem vai financiar um estudo que privilegia o gengibre ao medicamento para enxaqueca mais vendido no mundo?"
Gengibre vs. Sumatriptana e outros medicamentos prescritos
Contra todas as probabilidades, o gengibre pode ser considerado o vencedor dessa disputa. O gengibre custa alguns bilhões de dólares mais barato e tem menos efeitos colaterais do que a sumatriptana, que pode causar uma série de efeitos colaterais, como azia, vertigem, tontura e sonolência. Ah, e morte também.
Na verdade, a lista de efeitos colaterais da sumatriptana ou Imitrex/Sumax é longa e complexa demais para tratarmos aqui, mas você pode buscar a bula do medicamento e ler por si mesmo. O Nutition Facts ainda adverte:
"Um oitavo de colher de chá de gengibre é 3000 vezes mais barato do que a sumatripana. E você tem menos chances de acabar se tornando um estudo de caso de uma pessoa que teve um ataque cardíaco ou morreu após tomar o fármaco — tragédias estas que já ocorreram com a sumatriptana".
Apesar dos riscos, o órgão americano Food and Drug Administration (FDA) aprovou a sumatriptana em 2003 e nunca voltou atrás em sua decisão. Por outro lado, cerca de 1 a cada 25 dos participantes do estudo que tomaram gengibre relataram dores de estômago após tomar uma colher de sopa inteira de estômago vazio, o que pode causar dores de estômago em basicamente qualquer pessoa.
Quantidades mais razoáveis e eficazes, como um quarto de colher de chá ou mesmo metade disso, não causam nenhum efeito colateral.
Complicações da sumatriptana
A menos que os pacientes comprem remédios sem receita, (que são tipicamente inúteis contras as enxaquecas intensas), a reação padrão da maioria dos médicos é prescrever algum medicamento. Normalmente, a prescrição envolverá triptanos, como explica o Dr. Michael Murray em seu site, Doctor Murray:
"Essas drogas atuam constringindo os vasos sanguíneos e bloqueando os centros de dor do cérebro. A sumatriptana (Sumax) é considerada padrão ouro entre elas, sendo a mais estudada e com maior registro de acompanhamentos. Ela oferece alívio quase imediato à maioria dos pacientes, mas as dores de cabeça retornam em cerca de 40% deles dentro de 24 horas após a medicação.
Os efeitos colaterais menores dos triptanos incluem náusea, tontura, vômito e fraqueza muscular. Porém, esses medicamentos podem causar efeitos muito mais graves, como espasmos na artéria coronária, ataques cardíacos, derrames e arritmia."
O site Drugs.com deixa claro que a sumatriptana não previne dores de cabeça e deve ser utilizado apenas caso você esteja sentindo uma enxaqueca de verdade. Sua eficiência, bem como sua segurança, não é determinada em casos de dores de cabeça comuns. As dosagens variam entre 50 e 100 miligramas, e doses mais altas oferecem "grande risco de reações adversas".
As contraindicações incluem "insuficiência hepática leve a moderada", pessoas que fumam, mulheres na menopausa, homens com mais de 40 anos, bem como pessoas com os seguintes distúrbios ou complicações de saúde:
Uso recente de certos medicamentos para dores de cabeça |
Uso concomitante do inibidor monoamina oxidase (MAO) -A (para depressão) |
Arritmias associadas à síndrome de Wolff-Parkinson-White, distúrbio da via de condução acessória cardíaca |
Histórico de acidente vascular cerebral ou ataque isquêmico transitório (AIT) |
Doença vascular periférica (ou arterial) ou estreitamento arterial |
Doença isquêmica do intestino, também conhecida como colite isquêmica |
Hipertensão não controlada |
Hipersensibilidade à sumatriptana |
A última precaução é interessante, já que apenas o uso prévio poderia alertá-lo sobre uma hipersensibilidade.
Há também menção a arritmias ou "perturbações na frequência cardíaca com risco de vida, incluindo taquicardia ventricular e fibrilação ventricular seguida de morte"; hemorragia cerebral; convulsões; e aperto, dor, pressão e peso no precórdio (região do tórax perto do coração), garganta, pescoço e mandíbula.
Pode ocorrer também a síndrome da serotonina, evidenciada por alterações do estado mental, agitação, alucinações, coma, instabilidade autonômica (como inconsciência e hipertermia), aberrações neuromusculares (como falta de coordenação) e/ou sintomas gastrointestinais, incluindo náuseas e outras reações que ameaçam a vida. Recomenda-se que os usuários descontinuem o uso caso estes ou outros sintomas se manifestem.
Mais Benefícios do Gengibre
O gengibre tem um ótimo efeito sobre dores de cabeça, mas não para por aí. Ele tem sido usado para tratar (e, melhor ainda, prevenir) náusea e vômito há séculos, seja durante gestações, quimioterapia, enjoos por movimento (aqueles que você tem no carro) ou consumo de algum alimento estragado, pois estimula o fluxo de saliva. O gengibre foi identificado como carminativo, que auxilia na eliminação de gases intestinais, e espasmolítico, pois ajuda a relaxar e acalmar o trato intestinal.
Pertencendo ao mesmo grupo de plantas da cúrcuma e do cardamomo, o gengibre libera uma fragrância picante que denota cetonas, sendo mais significativo um número de gingeróis, seu ingrediente mais ativo.
Uma narrativa antiga, recontada em um exaustivo tratado científico chamado "Medicina Herbal: Aspectos clínicos e biomoleculares" (segunda edição) tem um capítulo muito referenciado, intitulado "O incrível e poderoso gengibre", que fala sobre o Zingiber officinale e sua história:
"O gengibre tem sido usado como um agente flavorizante muito antes de a história ter sido formalmente registrada. Foi um artigo comercial extremamente importante e era exportado da Índia para o Império Romano há mais de 2000 anos, onde era especialmente valorizado por suas propriedades medicinais.
Mercadores árabes controlavam o comércio de gengibre e outras especiarias durante séculos. Nos séculos XIII e XIV, 450 gramas de gengibre valiam o equivalente a uma ovelha. No período medieval, era importado em conserva para ser usado em doces".
O gengibre, continua o relato, tem uma enorme variedade de usos, seja fresco, seco, cristalizado, em conserva, em pó ou moído. Ele possui um sabor interessante, pois embora possa ser chamado de doce, tem uma picância curiosa e agradável, que funciona bem com qualquer tipo de pão, bolo e biscoito, frituras e, naturalmente, chá.
Como um anti-inflamatório que auxilia naturalmente o sistema imunológico, o gengibre oferece uma miríade de benefícios para a saúde. Por reduzir a inflamação sistemática, ele influencia positivamente o peso corporal e o nível de açúcar no sangue, ajudando a proteger contra uma doença grave chamada de esteatose hepática, que afeta até 40% dos adultos.
A obesidade também pode ser reduzida com o uso de gengibre. Foi descoberto que o gingerol ajuda a queimar gordura corporal, motivo pelo qual seus benefícios estão ligados à síndrome metabólica.
Fitonutrientes menores, como o shogaol e paradol, em conjunto com o gingerol, também foram recomendados por sua capacidade de combater o câncer colo-retal, gástrico, de ovário, fígado, pele, mama e próstata, devido à presença de glutationa peroxidase, glutationa-S- transferase e glutationa redutase, observa um estudo.
Segundo o site Migraine.com, recomenda-se que as gestantes não consumam o gengibre em grandes quantidades nem por muito tempo. O mesmo vale para pessoas com cálculos biliares, doenças inflamatórias intestinais ou úlceras, ou aquelas que fazem uso de anticoagulantes ou outros medicamentos. Quanto às doses, o Raw Food World sugere:
"As opiniões ainda divergem quanto às melhores fontes e a exata dosagem. Alguns chegaram a sugerir [que] um terço de [colher de chá] gengibre em pó é capaz de satisfazer à exigência. Outros sugeriram que o gengibre fresco é preferível ao gengibre em pó, e que passá-lo em um espremedor de alho preserva seus poderosos sucos naturais".