A vitamina D e as bactérias intestinais normais para o sono ideal

Fatos verificados
vitamina D

Resumo da matéria -

  • A deficiência de vitamina D tornou-se uma epidemia em muitas partes do mundo, já que fomos ensinados a evitar o sol. Os níveis mais baixos de vitamina D criaram duas consequências inesperadas: baixa qualidade do sono e uma mudança perigosa na microbiota intestinal
  • Pessoas saudáveis possuem quatro tipos de bactérias intestinais vivendo no seu trato digestivo. Essas bactérias precisam de vitamina D para crescerem devidamente e, em troca, produzem oito vitaminas do complexo B de que seu corpo precisa. Sem vitamina D suficiente, as bactérias saudáveis são substituídas por outras que não precisam de vitamina D, mas são incapazes de produzir as vitaminas do complexo B que são necessárias para que você possa dormir normalmente
  • Para normalizar sua microbiota intestinal, procure manter um nível de vitamina D acima de 40 ng/mL e tome B50 ou B100 (suplemento contendo 100 mg das oito vitaminas do complexo B) por três meses

Por Dr. Mercola

Eu conheci a Dra. Stasha Gominak, uma neurologista e coach do sono, em 2019, na reunião anual do American College for the Advancement in Medicine, em Nashville. A palestra dela foi sobre maneiras de melhorar seu sono. Eu achei que conhecia a maioria delas, mas a conexão entre a vitamina D e o sono me surpreendeu.

A pesquisa da Dra. Gominak sugere que a falta de vitamina D prejudica a capacidade do tronco cerebral de gerar um sono normal. Até o momento, ela já tratou de mais de 7.000 pacientes com sua abordagem inovadora ao "reparo do sono". Ela também publicou artigos científicos sobre suas teorias.

A deficiência de vitamina D está associada a distúrbios do sono

A princípio, Gominak não estava interessada na vitamina D. Ela era fascinada pelo sono e estava tentando descobrir por que tantos pacientes jovens e saudáveis apresentavam tantos problemas para dormir. Muitos também tinham apneia do sono. Com o tempo, ficou claro que a maioria deles não apresentava sono REM (Rapid Eye Movement ou Movimento Rápido dos Olhos) suficiente, embora não houvesse até então uma hipótese médica que explicasse o porquê.

"Eu conduzi muitos estudos sobre o sono em adolescentes e crianças, a grande maioria dos quais era relativamente saudável", Diz Gominak. "Eles não tinham necessariamente uma apneia do sono terrível, mas todos apresentavam muito menos sono profundo do que o normal, e é justamente o sono profundo que permite nossa regeneração e a sensação de descansados.

Eles reclamavam de cansaço. Eles tinham epilepsia. Eles tinham dores de cabeça diárias. Eles tinham várias coisas ligadas à nossa capacidade de reparar nosso cérebro a cada noite.

Depois de descobrir que eles não tinham sono profundo, eu queria consertar o sono e o problema neurológico desses pacientes. Infelizmente, eu estava bastante presa aos métodos que tínhamos à nossa disposição na época: dispositivos de pressão positiva contínua nas vias aéreas (CPAP, do inglês Continuous Positive Airway Pressure) para aqueles que tinham apneia e medicamentos para dormir para indivíduos com insônia.

Isso era muito pouco satisfatório para mim e para os pacientes. Então, quase por acaso, descobri que uma das minhas jovens pacientes com dor de cabeça, que estava extremamente cansada e não tinha absolutamente nenhum sono profundo em seu estudo do sono... tinha uma deficiência de vitamina B12.

Comecei a verificar os níveis de vitamina B12 em todos os pacientes que tinham sono anormal. Eventualmente, eu também comecei a medir os níveis de vitamina D. Com o tempo, ficou claro que a vitamina D de todos estava baixa. Isso, por si só, não foi suficiente para me deixar empolgada, mas o que me animou foi o fato de haver inúmeros artigos mostrando receptores de vitamina D nas áreas do tronco cerebral que controlam nossa capacidade de entrar e sair das fases do sono.

A parte do cérebro chamada tronco cerebral contém o relógio do sono e as células que nos paralisam para que possamos nos regenerar. Essas áreas são cobertas por receptores de vitamina D. Isso já tinha sido publicado na década de 1980, mas ninguém deu a devida atenção."

Também foi demonstrado que a vitamina D possui a capacidade de modular a hibernação em animais, observa Gominak, mas seu impacto no sono humano nunca foi reconhecido.

Acrescentando ao trabalho de Walter Stumpf, o cientista que publicou os artigos originais sobre o impacto da vitamina D na hibernação, sono e metabolismo, Gominak realizou um estudo de dois anos, concluindo que distúrbios do sono de vários tipos, não apenas a apneia do sono, estão relacionados à deficiência de vitamina D, podendo ser melhorados através de suplementação cuidadosa. Ela explica que monitoramos o sono em casa ao medir a paralisia durante o sono:

"O parâmetro que usamos hoje para monitorar o sono com sensores é 'Quando estamos paralisados?', pois o único momento em que ficamos paralisados é quando dormimos profundamente, com sono de ondas lentas ou sono REM.

A parte mais importante do uso da vitamina D é que ela e outros componentes se unem para produzir a acetilcolina. A acetilcolina é o neurotransmissor que nos permite ficar devidamente paralisados."

Usando um sensor fitness para monitorar o ciclo do seu sono

Hoje, muitos de seus pacientes utilizam sensores fitness que acompanham o sono, como o Fitbit ou o anel Oura, que podem medir o sono profundo em ondas lentas, que é uma das fases do sono durante a qual o nosso corpo fica paralisado.

"Até onde eu sei, as medidas de movimento usadas na maioria desses dispositivos de rastreamento são bastante precisas", diz ela. Dito isto, eu não recomendo o uso do Fitbit por duas razões.

Primeiramente, ele emite uma luz verde, que pode interferir na qualidade do sono. Além disso, o Fitbit foi adquirido recentemente pelo Google, que pode estar utilizando dados pessoais sobre a saúde e o condicionamento físico obtidos desses dispositivos para ganho próprio. O anel Oura me parece um dispositivo superior de maneira geral, e não tentará roubar seus dados pessoais.

As vitaminas do complexo B e o sono

As vitaminas D e B12 não são os únicos nutrientes capazes de influenciar seu sono. No final do período de dois anos do estudo conduzido por Gominak, no qual foram usadas vitamina D e B12, a maioria dos pacientes começou a piorar novamente. O sono deles começou a se deteriorar e eles estavam sentindo mais dor.

Um paciente deu a ela um livro detalhando o uso da vitamina B5 (ácido pantotênico) para a dor da artrite reumatoide. "Eu não estava muito interessada em vitaminas", admite Gominak, mas ela acabou lendo o livro. O que finalmente despertou seu interesse foi o fato de a suplementação de B5 ajudar a melhorar o sono dos pacientes reumáticos.

Uma pesquisa mostrou que, quando a B5 é bloqueada, os pacientes desenvolvem quatro sintomas distintos dentro de duas semanas: queimação nas mãos e pés, problemas gastrointestinais, insônia e um jeito de andar estranho, parecido com uma marionete. No entanto, como Gominak e dezenas de seus pacientes descobriram, o excesso também pode causar problemas.

Ao tomar 400 miligramas (mg) de ácido pantotênico e uma cápsula diária de B100 (um suplemento que contém as oito vitaminas do complexo B), as pontuações de dor e os distúrbios do sono dispararam. Muitos reclamaram de estarem se sentindo "acelerados" e incapazes de dormir.

"Eu percebi que tinha piorado tudo no meu sono ao tomar a dose recomendada de ácido pantotênico", diz Gominak. "Então parei com os 400 mg adicionais de B5 e fiquei apenas com o B100, que possui 100 mg de ácido pantotênico."

Da noite para o dia, ela notou uma mudança significativa. A dor desapareceu e seu sono melhorou. Pacientes que fizeram a mesma alteração relataram resultados semelhantes. Tudo isso sugere que não sabemos muito sobre a dosagem adequada de muitas vitaminas. Além disso, mais pesquisas a levaram à hipótese de que as vitaminas do complexo B realmente devem ser produzidas no seu intestino, pelas bactérias intestinais.

O importante papel das bactérias intestinais

Parte do problema, Gominak pensou, era que, por algum motivo, as bactérias intestinais de seus pacientes não produziam as vitaminas do complexo B devidamente, resultando em uma deficiência. A simples adição de vitamina D não resolveria isso. "Eu supus que a vitamina D era um fator de crescimento para as bactérias e que, quando eu lhes desse a vitamina, elas voltariam a se propagar", disse ela, "mas isso não aconteceu."

Conforme explicado por Gominak, existem quatro espécies de bactérias intestinais que produzem as oito vitaminas do complexo B, e elas parecem funcionar simbioticamente, fornecendo umas às outras essas vitaminas do complexo B. Quando elas funcionam adequadamente, você recebe todas as vitaminas B de que seu corpo precisa e, quando você possui a dose exata, seu sono também é melhorado.

Infelizmente, embora hoje saibamos que o nível ideal de vitamina D fica entre 60 e 80 nanogramas por mililitro (ng/mL), ainda não sabemos qual é o nível ideal de B5. As medições pelo sangue também parecem ser imprecisas, pois não refletem necessariamente as reservas do seu corpo.

Um argumento a favor dos alimentos orgânicos

No que diz respeito à alimentação, é importante comer alimentos orgânicos por duas razões principais. Uma é que a maioria dos antibióticos não é administrada aos seres humanos. Eles são dados aos animais, e o uso de antibióticos na produção de alimentos é um dos principais fatores para o surgimento de bactérias resistentes a antibióticos.

A maior parte dos alimentos não orgânicos também está contaminada com glifosato, que pode dizimar suas bactérias intestinais e afetar sua função mitocondrial. Há evidências emergentes de que a função mitocondrial é realmente o centro da saúde e a causa de diversas doenças degenerativas crônicas.

As mitocôndrias são bactérias extremamente primitivas que vivem dentro das células e são afetadas pelos antibióticos, e o glifosato também possui atividade antibiótica. Embora existam muitas estratégias que você pode usar para regular positivamente a biogênese mitocondrial, é importante começar com a diminuição dos danos.

Um interessante artigo, publicado on-line em 16 de janeiro de 2020 no Journal of Steroid Biochemistry and Molecular Biology, também esclarece como a vitamina D e a melatonina funcionam sinergicamente para proteger a saúde mitocondrial e garantir o seu devido funcionamento. Conforme observado nesse artigo:

“As vias biossintéticas da vitamina D e da melatonina estão inversamente relacionadas com a exposição ao sol. Uma deficiência dessas moléculas tem sido associada à patogênese de diversas doenças cardiovasculares, incluindo hipertensão arterial, doenças neurodegenerativas, distúrbios do sono, doenças renais, câncer, distúrbios psiquiátricos, doenças ósseas, síndrome metabólica e diabetes, entre outros.

Durante o envelhecimento, a ingestão e síntese cutânea de vitamina D, bem como a síntese endógena de melatonina, são notavelmente esgotadas, produzindo um estado caracterizado por um aumento do estresse oxidativo, inflamação e disfunção mitocondrial.

Ambas as moléculas estão envolvidas no funcionamento homeostático das mitocôndrias. Dada a presença de receptores específicos nas organelas, o antagonismo do sistema renina-angiotensina-aldosterona (RAAS), a diminuição de espécies reativas de oxigênio (ERO), em conjunto com modificações na autofagia e apoptose, propriedades anti-inflamatórias, entre outras, as mitocôndrias emergem como o alvo comum final da melatonina e vitamina D.”

Otimize sua saúde para melhorar seu sono

Sejamos claros: não estamos dizendo que os suplementos de vitamina D e B são comprimidos mágicos que resolverão qualquer problema de sono que você venha a ter. A qualidade do seu sono também depende de vários outros fatores básicos, como limitar a exposição à luz azul durante a noite e garantir que haja exposição à luz solar durante as horas mais claras do dia.

Isto posto, a insuficiência de vitamina D e ácido pantotênico pode desempenhar papéis importantes se você ainda estiver tendo problemas para dormir depois de corrigir outros fatores mais fundamentais.

"O material que tenho no meu site traz várias informações que costumam ser ignoradas... Existem centenas de sites falando sobre os ciclos circadianos, eliminação dos campos eletromagnéticos e da luz azul no local de dormir.

Não é que o que eu falo esteja acima de tudo. Apenas que é um detalhe bastante importante que você deve considerar. Também acredito que isso conecte a epidemia de distúrbios do sono com o ganho de peso e a síndrome do intestino irritável."

Na sua prática, Gominak viu pacientes se recuperarem de diversos problemas, desde problemas gastrointestinais até anemia, uma vez que sua microbiota intestinal foi normalizada com a ajuda da vitamina D e administração temporária das vitaminas do complexo B.

Novamente, lembre-se de que, uma vez restaurada a microbiota intestinal, tomar doses elevadas de vitaminas do complexo B pode sair pela culatra e provocar insônia, já que seu corpo está produzindo por si só a quantidade necessária. Nessa altura, o excesso acaba tendo um efeito semelhante à anfetamina, mantendo você acordado.

"Pessoalmente, acho que recuperar a microbiota na maioria das pessoas que estão doentes é o primeiro passo. Em seguida, elas precisam de alguma suplementação por um ano ou dois, mas não em dosagens enormes. E então, tenha em mente o fato de que, eventualmente, você chegará a um ponto em que não precisará de suplementação para a maioria das coisas, a menos que tenha predisposições genéticas específicas."