A manteiga está em alta

Fatos verificados
Consumo de manteiga

Resumo da matéria -

  • As alterações dos hábitos alimentares por causa da pandemia fizeram com que a demanda por manteiga batesse elevados recordes em 2020
  • A cooperativa de laticínios Land O'Lakes previu uma elevação de 20% nas vendas no ano anterior, chegando a vender de 124 milhões a 136 milhões de quilos; a empresa informou um aumento de US$ 54 milhões de receita em comparação com o mesmo período do ano anterior, entre 2019 e 2020
  • Diversos estudos defendem o consumo de manteiga para a promoção da saúde; visto que ela é rica em ativos anticâncer e nutrientes que fazem bem para o coração
  • A manteiga da mais alta qualidade é crua (ou seja, não é pasteurizada) e é proveniente de vacas terminadas a pasto, uma vez que o leite de vacas cuja criação principal se dá em pastagens se mostra mais rico em diversos nutrientes, como é o caso da vitamina E, o betacaroteno e os ácidos graxos ômega-3 e o ácido linoleico conjugado

Por Dr. Mercola

A manteiga está de volta e em alta, apesar de ter sido difamada durante décadas. Ela não só retornou, como suas vendas dispararam: o consumo de manteiga per capita nos EUA cresceu 24% na última década. As alterações dos hábitos alimentares por causa da pandemia fizeram com que a demanda por manteiga batesse elevados recordes em 2020. A cooperativa de laticínios Land O'Lakes previu uma elevação de 20% nas vendas no ano anterior, chegando a vender de 124 milhões a 136 milhões de quilos.

Com os norte-americanos cozinhando mais em casa na pandemia, o crescimento da demanda no varejo foi tão elevado que compensou a queda pela demanda de manteiga nos restaurantes. Em uma declaração, a empresa informou um aumento de US$ 54 milhões de receita em comparação com o mesmo período do ano anterior, entre 2019 e 2020, ao que acrescentou:

“No terceiro trimestre, o faturamento teve um crescimento de US$ 54 milhões graças ao forte desempenho por todo o portfólio. O faturamento da Dairy Foods foi superior graças à sua força contínua no varejo, o que compensou os volumes menores em serviços de alimentação e a volatilidade do mercado de commodities por causa dos impactos da COVID-19."

A popularidade da manteiga ultrapassa a popularidade da margarina

Nos primórdios de 1900, o consumo de manteiga per capita anual nos Estados Unidos passava dos 7 quilos, mas sofreu uma queda drástica com o crescimento do consumo de margarina. Desde quando a margarina adentrou no mercado em 1869, a indústria de laticínios ofereceu resistência.

Em 1886, foi sancionada a Lei da Oleomargarina (naquela época, era assim que a margarina era chamada) que taxava cada libra do produto em 2 centavos. Essa oleomargarina, em sua origem, era produzida a partir do excesso de gordura animal recolhida de matadouros. Também proibia o uso de corantes amarelos que deixassem a “manteiga artificial” mais similar à manteiga de verdade. No estado de New Hampshire, era exigido que a margarina fosse tingida de rosa.

Apesar da retaliação inicial, em meados do século a margarina ganhou popularidade, chegando a superar o consumo de manteiga em 1957 por ser mais barata e alegar maiores benefícios para a saúde.

Com o desuso das gorduras saturadas e o equívoco das autoridades de saúde em recomendar que os norte-americanos evitassem gorduras saudáveis como a manteiga com o objetivo de emagrecimento e diminuição do risco de doenças do coração, a margarina, agora produzida com óleos vegetais refinados e gorduras trans, se tornou a opção favorita para cozinhar e passar no pão.

Hoje em dia, nós sabemos que óleos vegetais refinados se encontram entre os piores alimentos que uma pessoa pode consumir. Um notável estudo de 1997 sobre a ação da margarina nas doenças cardiovasculares revela que a margarina eleva o risco de ataque cardíaco. Não obstante, a margarina continuou ganhando da manteiga em popularidade por décadas; foi só em 2005 que a manteiga reviu seu título, e desde então seu consumo só vem aumentando.

Manteiga faz bem

A manteiga continua sendo considerada um motivo de culpa, como um desses alimentos que você sabe que não deveria estar comendo, mas acaba cedendo porque é bom demais. Mas neste caso você pode se render sem culpa, pois a manteiga é, de fato, um alimento saudável — ainda mais quando produzida a partir de leite de vacas terminadas a pasto.

Ao contrário da margarina, que sofre elevado processamento, a manteiga é um alimento in natura que apresenta muitos nutrientes dos quais seu organismo precisa. Estes incluem:

Nutrientes da manteiga

Vitamina A em sua forma mais absorvível

Ácido láurico

Lecitina — essencial para o metabolismo do colesterol e a saúde do nervos

Antioxidantes

Vitamina E

Vitamina K2

Fator de Wulzen — uma substância destruída na pasteurização que se parece com um hormônio e consegue prevenir a artrite e a rigidez articular

Ácidos graxos, em especial de cadeia curta e média, para o ideal equilíbrio entre ômega-3 e ômega-6

Ácido linoleico conjugado (CLA) — um ativo anticâncer que atua na construção dos músculos e fortalece a imunidade

Vitamina D

Minerais como selênio, manganês, cromo, zinco e cobre

Iodo em sua forma mais absorvível

Colesterol

Ácido araquidônico (AA) — para a saúde da função cerebral e das membranas celulares

Glicosfingolipídios — ácidos graxos que protegem contra infecções do trato gastrointestinal

Diversos estudos defendem o consumo da manteiga para a saúde. Em uma revisão sistemática e metanálise de 9 publicações com 15 coortes nacionalmente específicas, o consumo de manteiga não demonstrou associação considerável com doenças cardiovasculares, doenças coronarianas ou AVC. Contudo, seu aumento estava relacionado à incidência menor de diabetes.

Uma análise mais atenta aos ativos benéficos da manteiga

Diversos ativos presentes na gordura da manteiga se relacionam com benefícios à saúde. Um dos mais conhecidos é o ácido linoleico conjugado que, além de sua ação anticâncer, faz bem ao coração, é anti-inflamatório e combate a obesidade.

Esfingolipídeos, como é o caso das ceramidas, esfingomielina, cerebrosídeos, sulfatídeos e gangliosídeos, também estão presentes na manteiga. Tais ativos interferem na regulação celular e apresentam ação antimicrobiana e imunomoduladora ao mesmo tempo em que restringem a adsorção do colesterol. Também apresentam possível ação anticâncer. Segundo o periódico Advances in Food and Nutrition Research:

“A esfingomielina se transforma em ceramida pela esfingomielinase uma vez ingerida, a qual mais tarde é decomposta em esfingosina e um ácido graxo livre antes de sua absorção. Sabe-se que a ceramida induz a apoptose das células de câncer. A ingestão de esfingomielina está associada à prevenção do câncer de cólon em ratos e seres humanos."

Há também o ácido butírico, que é um ativo de ação anticâncer que está presente na gordura do leite. O ácido butírico e seus sais, incluindo o butirato, fazem bem ao intestino e apresentam ação benéfica sobre a homeostase energética, a obesidade, a regulação do sistema imunológico, o câncer e a função do cérebro. O ácido mirístico consiste em um ácido graxo saturado de cadeia longa presente em grandes quantidades na gordura do leite.

Encontra-se associado a importantes processos metabólicos. Seu consumo, quando em moderação, pode melhorar o teor de ácido graxo ômega-3 no organismo, promovendo melhoras para a saúde cardíaca. A ingestão do ácido mirístico presente na gordura do leite, além de suas propriedades imunomoduladoras, se associa também ao aumento do colesterol bom, o HDL, e à redução do teor de triglicerídeos.

Portanto, não é de se surpreender que mais e mais pesquisas apoiem o consumo de laticínios integrais como é o cado da manteiga. Entre estas, encontra-se o estudo intitulado Prospective Urban Rural Epidemiology (PURE), que foi publicado no Lancet.

Como observado no estudo em questão por Mahshid Dehghan, seu principal autor, pesquisador sênior e investigador em epidemiologia nutricional da Universidade McMaster em Hamilton, Ontário: “Nossos resultados revelaram uma relação inversa entre os laticínios totais, a mortalidade e as principais doenças cardiovasculares. O risco de AVC era muito menor conforme o consumo de laticínios era maior".

A manteiga feita com leite de vacas terminadas a pasto é melhor

Não se esqueça de que o valor nutricional da manteiga diz respeito à criação das vacas que produzem o leite, uma vez que a composição dos ácidos graxos oscila segundo alimentação do animal. A manteiga da mais alta qualidade é crua (ou seja, não é pasteurizada) e é proveniente de vacas terminadas a pasto, melhor ainda se tiver certificação orgânica.

A segunda melhor é a manteiga pasteurizada de vacas terminadas a pasto, que também pode ser orgânica. Terceira é a manteiga pasteurizada comum, que você encontra em qualquer supermercado. Em comparação com a margarina ou outras pastas feitas com óleo vegetal, essas duas últimas opções são muito mais saudáveis em ordem de magnitude. Por que a manteiga de leite de vacas terminadas a pasto é melhor? O leite de vacas cuja criação principal se dá em pastagens se mostra mais rico em diversos nutrientes, como é o caso da vitamina E, o betacaroteno e os ácidos graxos ômega-3 e o ácido linoleico conjugado.

O melhor perfil dos ácidos graxos contido pelo leite orgânico e laticínios de vacas terminadas a pasto oferece uma proporção de ômega-6 para ômega-3 próxima de 1 para 1, enquanto no leite convencional é de 5,7 para 1. Como a maioria dos norte-americanos consome ômega-6 numa proporção de 10 a 15 vezes a quantidade de ômega-3, isso é de extrema importância.

Conforme observam os pesquisadores: “Devido ao elevado consumo per capita de laticínios em comparação com grande parte das demais fontes de ácidos graxos ômega-3 e CLA, tais diferenças no leite de vacas terminadas a pasto podem restaurar o equilíbrio histórico dos ácidos graxos e quem sabe até reduzir o risco de doenças cardiovasculares e outras doenças metabólicas".

Um estudo publicado na Critical Reviews in Food Science and Nutrition salienta as modificações na saúde humana após o consumo de alimentos iguais, porém de criações diferentes:

“Vários estudos revelam que os alimentos produzidos a partir de animais terminados a pasto, não submetidos a uma dieta de grãos, apresentam um teor muito maior de nutrientes que atuam na proteção contra o câncer, como é o caso dos ácidos graxos ômega-3 e do ácido linoleico conjugado.

Por causa da recomendação generalizada contra o consumo de gordura nas últimas décadas, hoje existe uma falta de diálogo científico acerca das diferenças que os subprodutos de animais terminados a pasto possam ter na prevenção do câncer e para a saúde."

A verdade é que foram descobertas diferenças consideráveis nos marcadores inflamatórios e fosfolipídios de acordo com a criação dos animais, terminados a pasto ou submetidos a uma dieta com grãos, muito embora o teor de lipídios permanecesse no geral neutro:

“Apesar de a carne vermelha, a manteiga, o queijo e os ovos serem tratados como um bicho de sete cabeças em termos nutricionais, com recomendações que consistem em abstinência, o valor nutricional e a respectiva ação de tais alimentos ao nível individual podem sofrer consideráveis variações.

Ao que parece, a manteiga de vacas terminadas a pasto, os ovos enriquecidos com n-3 e a carne de caça selvagem são neutros para os lipídios séricos, porém geram a diminuição de diversos fatores inflamatórios, com potencial de melhorar a saúde.

Dados consideráveis exemplificam um efeito fisiológico de notória diferença com o consumo do mesmíssimo alimento produzido a partir de animais submetidos a criações diferentes. Tal descoberta pode promover um amplo impacto nas recomendações nutricionais para toda a população, caso haja estudos futuros controlados."

Produtores descartam o leite enquanto as vendas de manteiga aumentam

Irônico imaginar que as vendas de manteiga dispararam quando a indústria de laticínios inteira se viu em desafio nesta pandemia. Na primavera do hemisfério norte em 2020, produtores de leite se viram forçados a descartar o leite quando despencou a demanda de restaurantes e escolas. Segundo as previsões, a indústria dos laticínios poderia ter uma perda de US$ 5 a US$ 10 bilhões em vendas no semestre seguinte.

Dois grandes produtores de leite, Dean Foods e Borden Dairy, já haviam declarado falência em novembro de 2019 e janeiro de 2020, uma vez que as vendas de leite haviam sofrido um declínio nos EUA antes da pandemia. Contudo, a partir de então, a pandemia foi favorável para as vendas de leite no varejo nos EUA, as quais tiveram um aumento de 8,3% de janeiro de 2020 a 18 de julho do mesmo ano. No mesmo período do ano anterior, as vendas haviam caído 2,3%.

Para o produtor de manteiga Land O'Lakes, as vendas no verão de 2020 foram tão intensas que eles não chegaram a colocar tanta manteiga quanto de costume em armazenamento refrigerado.

Beth Ford, CEO da Land O'Lakes, falou em uma entrevista para a Bloomberg: “Com frequência, mesmo para o varejo, você produz muita manteiga porque está no pico da produção de leite e então a armazena para a estação principal [durante as festividades]. Mas as vendas foram tão intensas que não fizemos isso, porque vendíamos de imediato."

Parece que os norte-americanos cada vez mais procuram alimentos tradicionais e in natura, que proporcionem uma sólida nutrição e uma sensação reconfortante, e esses requisitos a manteiga atendem com certeza.

Como dito antes, na busca pela melhor manteiga, recuse aquelas produzidas com leite de operações de engorda de animais por confinamento e apoie os pequenos produtores que fazem manteiga com leite de vacas terminadas a pasto. Se não puder localizar um produtor local na feira mais próxima, procure algum selo de procedência que garanta que o produto foi produzido a partir do leite da mais alta qualidade de animais terminados a pasto.