Por Dr. Mercola
Por várias décadas, dizia-se que gorduras saturadas como manteiga, banha e sebo causavam doenças cardíacas. Reagindo a preocupações relacionadas a isso, a indústria alimentícia substituiu a gordura saturada pela hidrogenada, que é cheia de gordura trans, criando todo um novo mercado para alimentos com pouca gordura, mas ricos em açúcar.
Com essa mudança, a saúde dos países ocidentais despencou e a taxa de mortes prematuras foi às alturas. A gordura trans, encontrada em óleos vegetais parcialmente hidrogenados, atua como um pró-oxidante, contribuindo para o estresse oxidativo que causa danos celulares.
Ela também é uma das principais culpadas pela resistência a insulina, que hoje atinge cerca de 8 em cada 10 norte-americanos. Muitos pesquisadores já concordam que não há um limite seguro para o consumo de gorduras trans.
Curiosamente, uma análise de mais de 1.000 alimentos crus publicados no PLOS ONE em 2015 classificou a gordura de porco, também conhecida como banha de porco, como o oitavo alimento mais saudável em uma lista de 100. É interessante, mas não surpreendente, que essa descoberta não tenha recebido atenção ou repercussão da mídia na época.
Hoje, a gordura trans tem sido eliminada da alimentação
O falecido Dr. Fred Kummerow, autor do livro "Cholesterol Is Not the Culprit" (em tradução livre: "O colesterol não é o culpado"), foi o primeiro pesquisador a observar que a gordura trans, não a gordura animal saturada, obstrui as artérias e promove doenças cardíacas. Além disso, ela também impede a síntese da prostaciclina, necessária para manter fluxo sanguíneo.
Quando as artérias já não conseguem produzir prostaciclina, formam-se coágulos sanguíneos que podem causar morte súbita. A gordura trans foi associada à demência. Em 2013, Kummerow processou o órgão Food and Drug Administration dos EUA por não tomar medidas sobre a gordura trans à luz das impressionantes evidências científicas contra ela.
Dois anos depois, em 2015, a agência finalmente removeu os óleos parcialmente hidrogenados (uma fonte primária de gordura trans) da lista de ingredientes “geralmente reconhecidos como seguros” (GRAS). Em 18 de junho de 2019, os fabricantes de alimentos foram proibidos de usar óleos parcialmente hidrogenados devido a seus riscos à saúde.
Os alimentos processados fabricados antes dessa data, porém, podem permanecer no mercado até 1º de janeiro de 2021 (as datas de conformidade variam dependendo de o fabricante ter ou não uma permissão de "uso limitado" dos óleos parcialmente hidrogenados, mas essa é era a data final a ser respeitada por todos).
A análise publicada na PLOS ONE em 2015 corrobora com a noção de que as gorduras animais são uma parte saudável e importante da alimentação humana, e que é improvável que as substituições feitas pelo homem sejam melhores do que os alimentos que foram utilizados de forma tão segura no passado. Como o The Healthy Home Economist declarou, a banha:
“…formou a estrutura lipídica da culinária europeia, do castelo à loja da esquina, durante grande parte de sua história pós-romana… Grande parte do mundo antigo consumia essa gordura rica em nutrientes, visto que os criadores podem criar porcos em quase qualquer clima e circunstância. A produção de banha de porco é um processo fácil, e a gordura resultante dura anos caso produzida adequadamente. Isso a diferencia da frágil manteiga."
Infelizmente, em vez de retornar às gorduras saturadas saudáveis como a banha de porco, manteiga ou óleo de coco, os óleos parcialmente hidrogenados estão sendo substituídos em grande parte por outros óleos vegetais não saturados que produzem aldeídos cíclicos e tóxicos quando aquecidos.
Esses subprodutos parecem ser tão nocivos que podem até fazer com que as gorduras trans pareçam comparativamente benignas, e podemos não perceber todas as implicações disso até que se passe uma ou duas décadas. Para saber mais, consulte minha entrevista com a jornalista investigativa Nina Teicholz.
A banha possui um grande valor nutricional
O estudo da PLOS ONE analisou a composição nutricional de mais de 1.000 alimentos crus e comparou sua eficiência para suprir as necessidades nutricionais diárias. Conforme explicado pelos autores:
“O saldo de nutrientes dos alimentos foi quantificado e chamados de condicionamento nutricional; essa medida foi baseada na frequência de ocorrência dos alimentos em combinações nutricionais adequadas.
O condicionamento nutricional oferece um meio de priorizar alimentos recomendáveis em uma rede global de alimentos, na qual os alimentos são relacionados com base nas semelhanças de suas composições nutricionais.
Identificamos vários nutrientes essenciais, como a colina e o ácido α-linolênico, cujos níveis nos alimentos podem afetar consideravelmente seu condicionamento nutricional. Analogamente, pares de nutrientes podem ter o mesmo efeito. Na verdade, dois nutrientes podem afetar sinergicamente o condicionamento nutricional, causando um impacto que não teriam individualmente."
Com relação à gordura de porco, sua pontuação no condicionamento nutricional foi de 0,73, uma das pontuações mais altas na categoria “alimentos ricos em gordura”. Apenas a semente de chia desidratada (0,85), a semente de abóbora (0,84) e as amêndoas (0,97) tiveram uma pontuação mais alta.
Você pode encontrar uma planilha que detalha a pontuação nutricional de todos os alimentos incluídos na análise aqui. (Você também pode encontrar um link para baixar os dados da pesquisa lançada na PLOS ONE, chamada "S1 Dataset: Foods Analyzed in This Study", no final do artigo). Os valiosos nutrientes encontrados na banha incluem:
- Vitamina D
- Ácidos graxos ômega-3
- Gorduras monoinsaturadas (as mesmas encontradas no abacate e no azeite)
- Gorduras Saturadas
- Colina
Verifique se a banha é orgânica e de animais terminados a pasto
Como mencionei anteriormente, a banha de porco é rica nas mesmas gorduras encontradas no abacate e no azeite. Porém, um detalhe importante, se não crucial, que não foi abordado no estudo da PLOS ONE é a diferença entre a banha de porco de animais criados convencionalmente e terminados a pasto. Conforme observado pelo The Healthy Home Economist, os porcos convencionais são:
“Criados com uma dieta composta por milho e soja geneticamente modificados (e às vezes amendoins), juntamente com outras fontes calóricas de baixa qualidade, contaminadas com grandes quantidades de resíduos de glifosato (Roundup), ração com antibióticos, remédios para desparasitação e sabe-se lá o que mais...
Os porcos também vivem em ambientes altamente estressantes. Geralmente, os criadouros são locais perfeitos para o crescimento de bactérias resistentes a antibióticos. Os resíduos da ração, medicamentos e estresse que esses animais recebem afetam a carne e a gordura.
Não é de se surpreender que o perfil nutricional da carne e da banha de porcos convencionais seja inferior.
Testes da Weston A. Price Foundation descobriu que a banha de porco terminado a pasto contém 10.000 UI de vitamina D por colher de sopa... Esse nível de nutriente é centenas de vezes mais alto do que a quantidade encontrada no banco de dados de alimentos do USDA, que se baseia em suínos criados convencionalmente."
Para entender como um porco terminado a pasto é criado, confira o vídeo acima, no qual Will Harris, proprietário da White Oak Pastures em Bluffton, Geórgia, mostra sua operação de suínos orgânicos. É de lá que eu compro grande parte da banha de porco orgânica que consumo, além das carnes terminadas a pasto.
Tudo que você precisa saber sobre a banha de porco
Ao comprar banha industrializada, evite as versões hidrogenadas. Segundo o Healthy Home Economist, a banha hidrogenada normalmente contém cerca de 0,5 gramas de gordura trans por porção de 13 gramas.
Sabendo os perigos da gordura trans e o fato de não haver um nível seguro de consumo, a banha hidrogenada é claramente uma escolha imprudente. A maioria das banhas hidrogenadas indicará "zero de gordura trans", mas isso ocorre devido a uma brecha na rotulagem que permite que os fabricantes rotulem o produto como "livre de gordura", desde que ele contenha menos de 0,5 gramas por porção. Então, evite enganações.
Outra informação importante é que a banha não hidrogenada pode ter sido processada para melhorar sua textura e prolongar a vida útil. Produtos químicos como agentes de branqueamento, desodorizantes e conservantes como o BHT podem ser usados para essa finalidade.
A banha tradicionalmente processada é tremendamente estável em sua forma original. No máximo, é possível refrigerá-la para aumentar a vida útil. Em muitos casos, isso nem é necessário.
Existem também dois tipos principais de banha: a comum e a visceral. A segunda vem diretamente da gordura ao redor dos rins do animal. Ela é altamente valorizada por muitos especialistas em culinária e chefs, o que torna o produto bem mais caro.
Um fator que torna a banha de porco tão boa para cozinhar e assar é o fato de que ela praticamente não tem gosto, para não interferir no sabor de outros ingredientes. O sabor da banha do rins do porco é a que tem menos sabor.
A banha bovina, que é outra gordura saudável de origem animal, tende a ter um sabor mais distinto, tornando-a útil para pratos selecionados, mas não é universalmente adequada para cozinhar.
Como e por que fazer sua própria banha?
Esse processo é relativamente simples, mas consome muito tempo.
Um artigo de 2014 da The Week explica por que a fazer a banha é melhor do que consumir a gordura de porco diretamente:
“Na cocção, em vez de derreter completamente como a manteiga ou a banha, a gordura crua de porco derrete pouco e forma pelotas, que darão sabor ao prato finalizado.
Fazer a banha em vez de usar a gordura de porco diretamente cumpre dois objetivos: para começar, o processo preserva a gordura, removendo o excesso de água e outras impurezas que, de outra forma, poderiam estragá-la; e a banha de porco tem longa validade, assim como o azeite ou a manteiga clarificada.
Por fim, o resultado é uma gordura cremosa que não apenas derrete instantaneamente numa panela quente, mas também faz receitas muito mais sequinhas."
Outras gorduras saudáveis para cozinhar
Além da banha de porco terminado a pasto, outras gorduras saudáveis para cozinhar incluem:
• Óleo de coco — Oferece vários benefícios valiosos para a saúde, incluindo um efeito positivo para o coração e propriedades antimicrobianas. Ele também é uma ótima fonte de energia, graças aos seus ácidos graxos de cadeia média (AGCMs).
Quando consumidos, os AGCMs são digeridos e convertidos pelo fígado em energia, que pode ser utilizada imediatamente. O óleo de coco também ajuda a estimular o metabolismo e promover um peso corporal saudável.
• Manteiga de animais terminados a pasto — A manteiga crua e orgânica, fabricada a partir de animais saudáveis e terminados a pasto, contém muitos nutrientes valiosos, incluindo as vitaminas A, D, E e K2. Ela também contém minerais e antioxidantes que promovem a boa saúde.
• Ghee orgânico — Usado para cozinhar há milhares de anos, o ghee é outra boa opção.
• Azeite — Este óleo contém o mesmo tipo de ácidos graxos saudáveis que a banha de porco e pode ajudar a diminuir o risco de doenças cardíacas. Embora a recomendação seja evitar o uso de azeite para cozinhar e usá-lo apenas frio, um estudo de 2018, no qual 10 óleos alimentares populares foram comparados, contradiz esse conselho, mostrando que o azeite extra-virgem realmente é melhor para uso por sua estabilidade oxidativa e ausência de compostos nocivos produzidos quando aquecido.