Por Dr. Mercola
Os números de esteatose hepática alcoólica aumentaram 30% no último ano segundo a Universidade de Michigan. Os médicos culpam a alta ingestão de álcool durante a pandemia. Relatórios anedóticos sugerem que alguns pacientes aumentaram o consumo de álcool para uma garrafa de vinho ou de cinco a seis doses diárias de março de 2020 para março de 2021, uma quantidade que eleva o risco de doença hepática grave.
Falando para a NPR, a especialista em fígado da Universidade de Michigan, Dra. Jessica Mellinger, disse: "Em minhas conversas com meus colegas em outras instituições, todos dizem a mesma coisa: Sim, o aumento é astronômico. A doença apenas disparou”. Mellinger disse que a pandemia “sobrecarregou” as taxas já crescentes de doenças do fígado, que agora também estão aparecendo em populações mais jovens.
"Vemos crianças entre 20 e 30 anos com uma doença que antes só ocorria durante a meia-idade", disse ela. A esteatose hepática alcoólica também aumentou 30% de 2019 a 2020 no Keck Hospital da University of Southern California, com outros hospitais, incluindo os das universidades de Northwestern e Harvard, relatando aumentos de 50% nas admissões por esteatose hepática alcoólica desde março de 2020.
Em média, 4,5 milhões de adultos norte-americanos são diagnosticados com esteatose hepática todos os anos, e 44.358 morrem da doença. É muito possível que o aumento do consumo de álcool esteja piorando a epidemia já crescente de danos ao fígado, desencadeada por uma alimentação ruim, incluindo o alto consumo de frutose e óleos de sementes ricos em ômega-6.
O lockdown aumentou o uso irresponsável de álcool pelo mundo
Evidências anedóticas de pacientes que relatam ter aumentado seu consumo de álcool durante a pandemia foram confirmadas por vários estudos. Pesquisadores da Faculdade de Medicida da Universiade de Arizona descobriram que, durante um período de seis meses, entre abril e setembro de 2020, "o uso irresponsável de álcool e a possível dependência agregada aumentou mês a mês durante o período de lockdown".
“O aumento no uso prejudicial de álcool e comportamentos relacionados há de ter impactos adversos prolongados de caráter psicossocial, interpessoal, ocupacional e de saúde, enquanto o mundo tenta se recuperar da crise pandêmica.”
Um editorial publicado no Lancet Gastroenterology & Hepatology também observou que as vendas de álcool no Reino Unido tiveram um aumento de 31,4% se comparadas ao mês anterior em março de 2020, o que bate com o período de lockdown. Ele citou uma pesquisa conduzida pela Alcohol Change UK, que descobriu que 1 em cada 5 daqueles que bebiam álcool todos os dias disse ter aumentado a quantidade ingerida durante o isolamento.
O fígado fica em risco por conta do consumo excessivo de álcool devido a como o etanol é metabolizado. A esteatose, que é diagnosticada quando 5% do fígado é composto de gordura, costuma ser o primeiro sinal do abuso de álcool.
Esse problema pode se tornar uma esteatite, que é caracterizada pela inflamação, progressão para cirrose avançada e insuficiência hepática. Cerca de 35% das pessoas que bebem em excesso terão problemas avançados de fígado. Como a Alcohol Research explica:
"Esse estágio de doença do fígado causa o desenvolvimento de fibrose, durante o qual ocorre um depósito excessivo de proteínas da matriz extracelular. A reação fibrótica começa com fibrose pericelular ativa, que pode progredir para cirrose, caracterizada por cicatrizes hepáticas excessivas, alterações vasculares e eventual insuficiência hepática.”
Pelo histórico, a cirrose relacionada ao álcool costuma se desenvolver após duas ou três décadas de abuso do álcool, mas hoje já ocorre em pessoas de 20 a 30 anos. Na faixa etária de 35 a 34 anos, a morte por cirrose quase triplicou entre 1999 e 2016. O aumento das mortes relacionadas ao álcool nos Estados Unidos bate com o período de crise financeira de 2008.
No momento, os pesquisadores sugerem que o fardo psicológico da pandemia pode ter levado as pessoas a consumir álcool em excesso, um dos vários impactos da COVID-19.
Mais riscos da ingestão excessiva de álcool
Caso tenha começado a beber mais por conta de medo, estresse e ansiedade relacionados aos eventos atuais, é possível que sua saúde tenha sofrido um impacto negativo. Cerca de 90% das pessoas que bebem demais não têm um distúrbio relacionado ao álcool. Isso não significa que sua saúde não tem sofrido danos pela bebida em excesso.
O álcool pode representar diversos riscos para saúde a curto e longo prazo. Ele deprime o sistema nervoso central, desacelerando a comunicação entre as células cerebrais. O sistema límbico, que controla as emoções, também é afetado. É por isso que o álcool diminui as inibições.
O córtex pré-frontal, uma região do cérebro associada ao raciocínio e ao julgamento, também fica mais lento em resposta ao álcool, causando um comportamento mais impulsivo e o comprometimento do julgamento. A longo prazo, o álcool não promove apenas problemas no fígado, mas também o ganho de peso e o comprometimento da microbiota intestinal.
Sabe-se que alterar o equilíbrio das bactérias do trato digestivo pode enfraquecer o sistema imunológico, tornando o indivíduo mais propenso a doenças e inflamação. O uso crônico de álcool, em particular, é conhecido por causar disfunção neuronal e danos cerebrais. Cada ml adicional de álcool diário está associado a um envelhecimento cerebral adicional de 0.02 anos.
Além disso, o consumo excessivo de álcool aumenta o risco de doenças crônicas e outros problemas de saúde, tais como os seguintes apontados pelo CDC:
Pressão sanguínea elevada |
Desempenho ruim no trabalho e nos estudos |
Acidente vascular cerebral |
Doença hepática |
Problemas digestivos |
Câncer (mama, boca, garganta, esôfago, fígado e cólon) |
Problemas de aprendizado e memória, incluindo demência |
Problemas cardíacos |
Problemas de saúde mental, incluindo depressão e ansiedade |
Problemas sociais, incluindo perda de produtividade, problemas familiares e desemprego |
Dependência de álcool ou alcoolismo |
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A esteatose hepática não-alcoólica também está em alta
A esteatose hepática não-alcoólica é a mais comum doença do fígado em países desenvolvidos, caracterizada pelo excesso de gordura no fígado não relacionado ao consumo de álcool. Fatores como a alimentação, exercício e tabagismo podem exacerbar seus riscos de ter problemas no fígado.
Embora o consumo de álcool não auxilie a saúde do fígado, o aumento da esteatose hepática não-alcoólica também tem se elevado graças aos óleos industrializados, também conhecido como "óleos vegetais".
O óleo de soja, semente de algodão, girassol, canola, milho e cártamo são exemplos de óleos ricos em ômega-6. Devido ao alto teor de ácido linoleico, a variedade mais comum de pró-inflamatórios, o ômega-6, aumenta os radicais livres oxidativos e causa disfunção mitocondrial.
Como os pesquisadores observaram na revista Nutrients, “alguns estudos sugeriram que o ômega-6 está relacionado a doenças inflamatórias crônicas como obesidade, esteatose hepática não-alcoólica e doença cardiovascular". Na raiz das reações bioquímicas prejudiciais desencadeadas pelos óleos de sementes está o ácido linoleico, que é uma gordura ômega-6 de 18 carbonos.
O ácido linoleico é o ácido graxo primário encontrado nos óleos vegetais, contabilizando 80% da composição dos óleos vegetais. O ômega-6 no corpo deve ser equilibrado pelo ômega-3 para não se tornar prejudicial. Mais da metade do ômega-6 que as pessoas ingerem foi danificado e oxidou durante o processo, o que piora a situação.
A frutose também causa danos ao fígado
Como a gordura no fígado ocorre na ausência do consumo de álcool, também pode ser causada pelo excesso de açúcar, uma condição frequente em crianças.
Esse é um dos motivos pelos quais é tão importante eliminar a frutose processada e outras adições de açúcar na sua alimentação. A frutose afeta o fígado de maneira muito semelhante ao álcool. Ao contrário da glicose, que pode ser usada por quase todas as células do seu corpo, a frutose só pode ser metabolizada pelo fígado, por ser o único órgão capaz de transportá-la.
Como toda a frutose é transportada para o fígado, se você consome quantidades elevadas, ela acaba o sobrecarregando e danificando da mesma forma que o álcool e outras toxinas. A forma como o fígado metaboliza a frutose também é muito semelhante ao álcool, pois ambos servem como substratos para a conversão de carboidratos em gordura, o que promove a resistência à insulina, dislipidemia (níveis anormais de gordura na corrente sanguínea) e esteatose hepática.
A frutose também sofre a reação de Maillard com as proteínas, levando à formação de radicais livres de superóxido que podem resultar em inflamação do fígado, assim como o acetaldeído (um metabólito intermediário do etanol). Reduzir a ingestão de frutose e óleos vegetais, bem como aumentar o consumo de gorduras saudáveis, pode melhorar muito a saúde do seu fígado.
É muito importante evitar todos os tipos de alimentos processados e fast food, visto que todos contêm óleos tóxicos e/ou frutose. Saber o que você está ingerindo e preparar a maior parte dos seus alimentos em casa é o jeito mais fácil de conseguir isso.
Como fortalecer a saúde do seu fígado
A melhor maneira de evitar os danos causados pelo álcool é não o ingerindo, ainda mais em excesso. A cirrose e a esteatose hepática podem ser revertidas para seus estágios iniciais quando se para de beber, cortando também a frutose processada e os óleos vegetais. O dinucleotídeo adenina nicotinamida (NAD), cujo precursor é a niacina, ou vitamina B3, também é importante para pessoas que sofrem de alcoolismo.
Alcoólatras crônicos têm um risco elevado de deficiência de niacina, tanto pela ingestão reduzida quanto pela interferência na conversão de triptofano. Pequenas doses de NAD podem ser úteis de forma indireta quando ingeridas sem que o paciente esteja consumindo álcool.
O tratamento ajuda a diminuir a ânsia por bebida, desintoxica o corpo, ajuda a expelir o álcool e outras drogas do corpo, além de aliviar os sintomas. Um poderoso antioxidante, o NAD também ajuda a produzir energia nas mitocôndrias das células.
A colina, um nutriente essencial, também auxilia a função hepática, ajudando a manter a integridade da membrana e controlar o metabolismo do colesterol, incluindo lipoproteínas de baixa densidade (LDL) e lipoproteínas de densidade muito baixa (VLDL), auxiliando na remoção da gordura do fígado.
Ao aumentar a secreção de VLDL no fígado, que é necessária para remover a gordura com segurança, a colina pode proteger a saúde do seu fígado. Estima-se que 90% da população dos EUA tenha deficiência de colina. Você pode aumentar sua ingestão consumindo mais alimentos ricos em colina, como gemas de ovo orgânico, fígado de boi terminado a pasto, salmão selvagem do Alasca e óleo de krill. A rúcula também é uma excelente fonte.
Além disso, evite a exposição ao glifosato, o ingrediente ativo do herbicida Roundup, tanto quanto possível, já que ele também foi relacionado à esteatose hepática. O magnésio, a vitamina C e cardo de leite também são importantes para a saúde contínua do fígado.
O cardo de leite contém silimarina e silibina, antioxidantes que ajudam a proteger o fígado das toxinas e até a regenerar as células do fígado. Caso acredite ter um transtorno relacionado ao álcool ou esteja bebendo em excesso devido ao estresse e ansiedade relacionados à pandemia, procure ajuda profissional.