Novo estudo descobre que NAC previne derrames

Fatos verificados
Suplemento de n-acetilcisteína

Resumo da matéria -

  • A N-acetilcisteína (NAC) pode prevenir derrames em pessoas que têm angiopatia amiloide de cistatina C (HCCAA), um raro problema genético
  • Pessoas que sofrem de HCCAA têm uma expectativa de vida de 30 anos, e a maioria morre cinco anos após o primeiro derrame
  • A NAC parece prevenir a formação de proteínas produtoras de amiloides, que criam depósitos de amiloides associados aos derrames
  • A descoberta é ainda mais significativa por vir de pesquisadores do Children’s Hospital of Philadelphia (CHOP), uma instituição conhecida por sua postura anti-suplementação

Por Dr. Mercola

A N-acetilcisteína (NAC), uma forma do aminoácido cisteína e um suplemento alimentar de uso comum, pode prevenir derrames em pessoas com angiopatia amiloide de cistatina C hereditária (HCCAA), um distúrbio genético raro. A expectativa de vida de pessoas que têm HCCAA é de 30 anos, e a maioria delas morre cinco anos depois do primeiro derrame. Assim, diminuir a ocorrência de derrames pode ser essencial para garantir a sobrevivência do paciente.

A descoberta é ainda mais significativa por vir de pesquisadores do Children’s Hospital of Philadelphia (CHOP), uma instituição conhecida por sua postura anti-suplementação. A NAC parece atuar na prevenção da formação de proteínas produtoras de amiloides, impedindo a formação de depósitos de amiloides, que costumam estar associados a derrames.

Prevenir derrames pode salvar a vida de pessoas com HCCAA

A HCCAA pertence ao grupo das angiopatias cerebrais amiloides, nas quais depósitos de amiloides se formam nos vasos sanguíneos do sistema nervoso central.

Os depósitos de amiloides envolvem várias outras doenças degenerativas, incluindo o mal de Alzheimer, Parkinson, Creutzfeldt-Jacob e a doença de Huntington. HCCAA é uma doença hereditária, causada por uma variante da leucina 68, a glutamina da cistatina C humana conhecida como L68Q-hCC.

Jovens com essa mutação sofrem de microinfartos, lesões microscópicas, morte celular tópica e necrose de tecidos, sintomas associados à disfunção cognitiva em pessoas de idade. Os microinfartos cerebrais são marcadores clínicos de derrames e demência.

Em pessoas com HCCAA, os microinfartos começam aos 20 anos junto com hemorragias cerebrais, causando paralisia, demência e morte, conforme os derrames ficam mais frequentes. Os depósitos de hCC são encontrados no cérebro de pessoas com HCCAA, embora também possam ser encontrados em órgãos internos.

O estudo do CHOP sugere que a NAC pode bloquear a formação de depósitos de placas amiloides, bem como preveni-la, o que faria uma diferença significativa em pessoas que têm HCCAA. O autor, líder do estudo e diretor do Centro de Genomas Aplicados da instituição, Dr. Hakon Hakonarson, disse em uma comitiva de imprensa:

"Os amiloides não podem se precipitar sem agregação, então, se pudermos prevenir a agregação com esse medicamento (NAC) já disponível, isso poderia fazer uma diferença incrível na vida dos pacientes.

Além disso, visto que já temos testes genéticos para identificar esses pacientes, podemos conceber a possibilidade de começar esse tratamento no início da vida, prevenindo que o primeiro derrame ocorra".

A NAC pode prevenir derrames

A NAC é mais conhecida por aumentar a glutationa e reduzir toxicidade causada pelo acetaldeído, que causa muitos dos sintomas da ressaca. Qualquer pessoa que tome uma dose muito alta de paracetamol (Tylenol) também recebe grandes doses de NAC na sala de emergência, pois isso ajuda a prevenir danos ao fígado, aumentando a glutationa.

Às vezes, a NAC também é prescrita para romper o muco nos pulmões, e os pesquisadores do CHOP usaram a NAC para tratar linhas celulares que expressam hCC de tipo selvagem e mutante L68Q, visando determinar seus efeitos em oligômeros tóxicos que ocorrem em vários tipos de amiloidose.

A NAC quebrou os oligômeros em monômeros (os oligômeros são compostos de algumas unidades monoméricas), o que ajuda a prevenir a formação de depósitos de amiloides, que são associados a derrames. "Dada a atuação celular descrita, ficou evidente que a NAC tem uma utilidade potencial no tratamento dessa doença devastadora", escrevem os pesquisadores para a Nature Communications.

A NAC também foi avaliada em seis pacientes com a variante a L68Q-hCC. Acredita-se que a variante seja decorrente de uma mutação na população islandesa que ocorreu durante o século XVI. O paciente zero do estudo genético relacionado era de uma família islandesa que tinha HCCAA. Ele sofreu três derrames graves em nove meses aos 22 anos.

O paciente foi colocado em um respirador após o terceiro derrame e estava sofrendo de obstrução por muco, mas foi tratada com a NAC e isso resolveu a obstrução de forma gradual. Devido aos resultados positivos dos modelos celulares, o paciente continuou a tomar NAC, bem como cinco outros familiares que também tinham a mutação.

Os efeitos da NAC nos depósitos de hCC do cérebro não podem ser monitorados de forma direta, de modo que os pesquisadores fizeram biópsias de pele nas seis pessoas. Os pesquisadores sugerem que os depósitos de amiloides na pele estão correlacionados com os sintomas de pacientes que têm HCCAA, já que as pessoas que têm os sintomas também têm depósitos grandes na pele.

Houve uma redução de até 90% da L68Q-hCC após a administração da NAC

As biópsias de pele demonstraram que cinco dos seis pacientes tiveram uma redução de 50% a 90% nos depósitos de complexo de proteína de hCC após suplementação com NAC, um resultado que não tem como ser ignorado. Segundo os pesquisadores:

“O paciente tinha depósitos muitos altos de proteína hCC na primeira biópsia de pele. Biópsias subsequentes revelaram que os depósitos não apenas não progrediram, como também caíram em 40%.

...A redução dos depósitos de hCC da primeira para a terceira biópsia (cerca de 15 meses com duas doses diferentes) foi estimada em cerca de 70%... O pai teve uma redução de 50% na terceira biópsia... e o irmão teve uma redução de 30% após seis meses tomando NAC.

Na segunda coorte, os portadores 1 e 2 tiveram uma redução visível dos depósitos de hCC com o portador 1 tendo uma depuração quase completa após 600 mg de NAC 3 vezes ao dia durante 24 meses.

…O tratamento com NAC em pacientes humanos não só evita a deposição contínua do complexo de proteína cistatina C na pele, mas também reduz os depósitos anteriores de forma significativa”.

Um ensaio clínico com a NAC foi feito em 2019 para investigar se os resultados podem ser confirmados em um número maior de indivíduos. Os resultados são esperados no segundo trimestre de 2021.

Os vários benefícios da NAC

Em casos de HCCAA, a média de vida dos pacientes caiu de cerca de 65 anos em 1825 para cerca de 30 anos em 2021. Mudanças econômicas, industriais e no estilo de vida foram sugeridas como fatores que contribuem para essa queda, incluindo o aumento do consumo de carboidratos. Essa teoria também se enquadra nos benefícios demonstrados pela NAC. Os pesquisadores disseram:

“A hiperglicemia tem sido associada ao estresse oxidativo no diabetes, e é possível que o aumento dos carboidratos nas dietas islandesas no século XIX tenha criado estresse oxidativo suficiente em portadores de L68Q-hCC para tornar a apresentação da doença mais grave.

Essa hipótese é compatível com nossos resultados; o aumento do estresse oxidativo aumentaria a multimerização de L68Q-hCC, e os agentes redutores da alimentação, como o NAC, reverteriam esse efeito e evitariam a deposição de novos agregados. Os benefícios terapêuticos decorrem do bloqueio de novas oclusões que causariam os derrames".

Embora o uso mais comum da NAC seja como auxílio ao fígado, ela também tem se mostrado cada vez mais promissora como neuroprotetora. Além dos casos de HCCAA, os cientistas também estão pensando na NAC como tratamento para Parkinson, que tem sido associado à deficiência de glutationa na matéria negra, uma região que abriga neurônios de dopamina.

O nosso corpo não absorve muito bem a glutationa, então, em muitos casos, é mais fácil elevar seus níveis tomando NAC em vez dela.

O potencial pode se estender para o Alzheimer, pois, de acordo com os pesquisadores do CHOP, o processo de deposição de proteínas que ocorre no HCCAA é semelhante ao que ocorre no Alzheimer, embora em um ritmo acelerado no HCCAA em comparação com o Alzheimer, razão pela qual a demência ocorre mais tarde.

“Se os mecanismos subjacentes de deposição de proteína e patogênese forem semelhantes o suficiente, tratamentos parecidos ou idênticos podem ser eficientes”, disseram eles. Outra área onde a NAC se mostra particularmente promissora é no tratamento de distúrbios da saúde mental, incluindo transtorno de estresse pós-traumático, depressão e transtornos por abuso de substâncias.

A NAC até se mostra promissora contra a COVID-19. De acordo com uma análise da literatura médica, a deficiência de glutationa pode estar associada à gravidade da COVID-19, levando o autor a concluir que a NAC pode ser útil tanto para sua prevenção quanto para seu tratamento.

A NAC também pode combater a coagulação sanguínea anormal observada em muitos casos e ajuda a liberar o muco espesso nos pulmões. De um modo curioso, com o tratamento de COVID-19 como uma nova indicação, a Food and Drug Administration dos EUA proibiu de repente a NAC, alegando sua exclusão da categoria de suplemento alimentar, pois foi aprovada como um novo medicamento em 1985.

Como tal, a NAC não pode ser comercializada como suplemento em termos técnicos, embora haja nada menos que 1.170 produtos contendo NAC no Banco de Dados de Suplementos Alimentares do National Institutes of Health.

Por que o estudo do CHOP tem implicações nacionais?

O fato de os pesquisadores do CHOP estarem recomendando NAC no tratamento de HCCAA tem uma importância particular por conta de sua oposição histórica ao uso de suplementos nutricionais. Em outubro de 2013, a instituição anunciou que sua lista de medicamentos aprovados para uso não incluiria mais a maioria dos suplementos, tornando-o o primeiro hospital dos EUA a desencorajar seus pacientes de usar suplementos nutricionais como uma política institucional.

O raciocínio deles era que os suplementos nutricionais são "por essência, não regulamentados", com "nenhuma informação sólida" sobre efeitos colaterais, interações entre medicamentos ou dosagem padrão, o que eles disseram tornar a administração em crianças doentes "antiético, visto que os riscos são desconhecidos". Mas, considerando os resultados do estudo recente, seria antiético suspender um tratamento com potencial de salvaria vidas.

A política é tão rigorosa que os pais são questionados, na admissão do filho, sobre o uso de suplementação. O uso dos suplementos é totalmente desencorajado, e os pais são informados sobre a política anti-suplemento do hospital e os riscos do descumprimento. "Após receber essa informação, se um pai ou responsável insistir em continuar dando a seu filho um suplemento nutricional, eles devem assinar um documento que isenta o hospital de possíveis efeitos".

Apenas uma lista limitada de “produtos aceitáveis” é permitida no formulário de suplemento do CHOP, e não está claro se a NAC está entre eles. Se não estiver, com certeza merece ser adicionada, e talvez o estudo abra os olhos do CHOP para o potencial dos produtos naturais e suplementos nutricionais para salvar vidas.