Por Dr. Mercola
A genômica funcional é uma modalidade de teste genético de enorme valor, a qual muitos desconhecem completamente. Bob Miller é um naturopata tradicional certificado, especializado em nutrição genética específica. Ele é o fundador do Instituto de Pesquisa NutriGenetic, dedicado a testar e ajudar as pessoas a entender os resultados dos seus testes genéticos funcionais e como aplicá-los para melhorar sua saúde.
"Como naturopatas tradicionais, não somos médicos licenciados, portanto não diagnosticamos, tratamos ou prescrevemos", explica Miller. "Observamos a abordagem funcional de 'Qual é o estado do corpo?'… [Quando] o corpo está inflamado ou intoxicado é quando os patógenos têm uma maior chance de se proliferar.
Muitos anos atrás, eu aprendi sobre como a homocisteína possui vias que a limpam e que podem ser prejudicadas por certas variantes genéticas. Fiquei muito fascinado por aquilo. Comecei a olhar para as enzimas que a limpam e, em seguida, para a genética por trás delas.
Toda a minha prática naturopática e holística [agora] é dedicada a ajudar os clientes a medir sua genômica funcional, que é um pouco diferente da genética tradicional, que procura padrões de doenças e tenta descobrir como podemos fazer intervenções para recuperar o equilíbrio do corpo…
Nosso objetivo é poder dar uma contribuição aos praticantes de medicina funcional, para que eles possam fazer seu trabalho de forma muito melhor e melhorar a vida daqueles que sofrem com algumas dessas condições que ninguém parece conseguir descobrir…
Resumindo, o que descobrimos é que aqueles com certas deficiências genéticas nas vias de desintoxicação estão expostos a fatores ambientais com os quais não estávamos lidando há 50, 75 anos, sua capacidade de desintoxicação está sobrecarregada. Eu acho que esse é um paradigma totalmente novo que devemos observar."
O que é genética funcional?
Sabe-se que certos genes predispõem ou aumentam o risco de certas doenças. Não é disso que estamos falando aqui. A genética funcional analisa os polimorfismos de nucleotídeo único (SNPs, pronunciados "snips", da sigla em inglês) de genes relacionados à função.
Você provavelmente já viu representações da escada de DNA. No final de cada degrau, há uma molécula proveniente de cada um de seus pais. Essas moléculas podem fazer com que o seu DNA seja ideal ou, se você tiver algum SNP, significando um defeito, fazer com que esse gene não funcione com a eficiência total.
A relação entre a via mTOR e a autofagia
Autofagia significa "auto-alimentação" (se alimentar de si mesmo) e refere-se ao processo do seu corpo de eliminar partes e componentes celulares danificados e defeituosos, que são direcionados para o lisossomo, que os digere. O alvo de rapamicina em mamíferos (mTOR) é uma via de sinalização molecular responsável pelo crescimento ou reparo, dependendo se é estimulada ou inibida.
Eu sempre afirmei que, para regular positivamente a manutenção e o reparo (o que aumentará a longevidade e reduzirá o risco de câncer), você precisa suprimir a via do mTOR. Uma das maneiras mais eficientes de fazer isso é limitando a ingestão de proteínas, mas esta não é a única forma. A autofagia e o mTOR são dois processos que trabalham juntos, mas são inversos entre si. Miller compara o mTOR a uma equipe de construção, enquanto a autofagia se refere à equipe de limpeza.
Fatores que ativam o mTOR e fatores que aumentam a autofagia
Exemplos de fatores ambientais que ativam o mTOR incluem:
Xenoestrogênios (substâncias químicas em plástico) |
Campos eletromagnéticos |
Insulina |
Excesso de proteína |
Excesso de ferro |
Excesso de ácido fólico, folato ou metilfolato |
Excesso de glutamato |
Aminoácidos como leucina, isoleucina e valina |
Quando o mTOR é ativado, ele inibe a autofagia e, segundo Miller, muitos dos problemas de saúde que as pessoas enfrentam atualmente parecem estar relacionados ao excesso de ativação do mTOR.
Essa também é uma maneira pela qual uma dieta cetogênica cíclica pode ajudar a melhorar sua saúde, pois ela inibe o mTOR e ativa a autofagia. Quando o mTOR é ativado cronicamente, ele não apenas inibe a autofagia, mas também prejudica a apoptose (morte celular), e quando isso é prejudicado, seu risco de câncer aumenta significativamente.
Se a dieta cetogênica ou o jejum intermitente falharem, este pode ser o motivo
Embora o jejum intermitente seja uma excelente estratégia para a maioria das pessoas, ele não funciona como esperado para todos. Como explicado por Miller, membros de sua equipe de pesquisa descobriram que ter uma via heme funcional é extremamente importante quando você está em uma dieta cetogênica e/ou em jejum intermitente.
A proteína heme é criada através de um processo de oito etapas, começando com a succinil coenzima A (succinil-CoA), glicina e aminoácidos. A proteína heme, por sua vez, é um componente da hemoglobina, mas também está envolvida na produção de óxido nítrico, catalase, superóxido dismutase (SOD) e sulfito oxidase (SUOX), que é a sua conversão de sulfeto em sulfato.
Mesmo se você estiver anêmico, pode estar absorvendo ferro demais
Como mencionado anteriormente, o ferro estimula o mTOR. Certamente, o ferro é crucial para uma boa saúde. Sem quantidades suficientes de ferro, você não é capaz de produzir quantidades suficientes de hemoglobina, que transporta oxigênio pelo corpo. No entanto, em excesso, o ferro é incrivelmente destrutivo.
"Aqui está uma das descobertas interessantes da nossa pesquisa. Há muitas pessoas que têm predisposição genética para absorver o ferro de forma exagerada, mas, ao longo da vida, ouvem que são anêmicas. Parece uma dicotomia: como você pode ser anêmico se está absorvendo ferro em excesso?
Uma das coisas que… encontramos em muitas pessoas que estão procurando e não conseguem obter respostas em nenhum outro lugar, é que elas absorvem ferro demais. Existe uma enzima chamada ferroportina, que retira o ferro das células. SNPs, ou defeitos genéticos, inibem a remoção do ferro. Através do que chamamos de reação de Fenton... o ferro pode combinar-se com peróxido de hidrogênio, formando radicais hidroxila.
Isso pode produzir outro radical livre nocivo chamado peroxinitrito. Consequentemente, a pessoa se torna anêmica porque está medindo o ferro no sangue, mas ele pode estar em excesso dentro das células, causando inflamação considerável.
À medida que o ferro fica retido no interior das células, isso gera fadiga, pois as mitocôndrias têm dificuldade em produzir energia. Estas são as pessoas que, se receberem ferro, muitas vezes se sentem consideravelmente pior, pois na verdade estão alimentando o problema.
Em nossa consultoria, uma das coisas que mais fazemos é identificar a reação de Fenton e tomar medidas corretivas para, por exemplo, ajudar a transformar o peróxido de hidrogênio em água através de uma enzima chamada catalase; enzimas de suporte e antioxidantes chamados glutationa e tioredoxina, que transformam o peróxido de hidrogênio em água, e usar homeopatia para fazer com que o ferro se comporte melhor."
A água hidrogenada pode ser útil aqui, observa Miller, pois ajuda a diminuir o excesso de radicais hidroxila. "Basicamente, o H2O2 junto ao ferro cria radicais livres de hidroxila (OH-), que é um dos radicais livres mais reativos e nocivos", explica Miller.
Já entrevistei, em outra oportunidade, Tyler LeBaron, um dos principais especialistas em hidrogênio molecular, e ele acredita que os benefícios podem estar mais relacionados à regulação positiva das vias antioxidantes, como o fator nuclear 2 relacionado ao eritroide-2 (Nrf2). De qualquer maneira, seja qual for o mecanismo, parece claro que a água hidrogenada tem a capacidade de neutralizar os radicais livres.
Situações em que o NAC ou o metilfolato podem sair pela culatra
Eu já escrevi sobre os benefícios da N-acetilcisteína (NAC), o fator limitante da taxa de glutationa, que é um antioxidante mestre produzido pelo corpo. No entanto, para que funcione, você deve possuir as enzimas necessárias. Além disso, se você tiver um problema de absorção de ferro, a cisteína que você toma pode combinar-se com o ferro para criar radicais hidroxila — basicamente piorando a situação.
"Isso remonta ao fato de que precisamos fugir de soluções generalistas: 'Você está com inflamação. Tome NAC'. O NAC pode ser perfeito para você ou pode piorar a sua situação, dependendo da sua composição genômica", diz Miller.
Miller desenvolveu uma pirâmide hierárquica de diferentes variáveis e sua abordagem para tratá-las. Curiosamente, muitos que analisam superficialmente a genômica funcional acham que o defeito de metilação é um dos mais importantes. Ele é importante, mas, segundo Miller, existem muitos outros que o precedem em termos de importância.
"A metilação está relacionada a como extraímos o ácido fólico ou folato da nossa dieta e o transformamos em metil folato, que é uma molécula muito importante. Para uma gestante, ele é necessário para uma boa gravidez. Não estamos dizendo que não é algo bom... No entanto, uma das coisas interessantes sobre o metilfolato é que você precisa dele para a gravidez, pois ele apoia o mTOR.
Se alguém já está com o mTOR dominante e toma metilfolato, só fica mais ansioso e com mais inflamação. Eu já conversei com tantas pessoas que me disseram: "Ah, sim. Eu tenho MTHFR (metilenotetrahidrofolato redutase). Alguém me indicou metil B12, metilfolato. Eu me senti ótimo por duas semanas e depois desabei."
A razão para isso é porque começaram a estimular demais o mTOR, enfraquecendo ainda mais a autofagia, gerando ainda mais inflamação... À medida que nos aprofundamos, percebemos que o metilfolato é importante, mas precisa ser administrado nos momentos certos. Por isso desenvolvi minha pirâmide.
Na base, temos coisas que precisamos resolver primeiro, como: o ferro está se tornando um radical livre? O peróxido de hidrogênio não está sendo limpo? Existe desacoplamento da óxido nítrico sintase (NOS)? Situação na qual, em vez de gerar óxido nítrico, produzimos mais peroxinitrito.
Em seguida, verificamos a produção de antioxidantes. Como estão as vias da glutationa? Como está a superóxido dismutase? Como está o NADPH? …Na maioria das vezes, acredito que, quando as pessoas apresentam intensa inflamação, precisamos tratar isso primeiro.
Se a pessoa apresenta muita inflamação, se o ferro está criando radicais hidroxila, se existe uma fraqueza em seus antioxidantes... e você joga metilfolato por cima... há uma chance muito grande de que a situação piore.
De um modo geral, se alguém estivesse com muita inflamação, eu começaria a pensar no metilfolato de dois a três dias por semana, apenas de seis a oito meses mais tarde. Temos uma tendência a pensar: "Se um pouco faz bem, muito também deve fazer", mas hoje eu acredito que precisamos das coisas em ciclos."
Concordo plenamente que esses ciclos são um componente essencial que não deve ser ignorado, quer você esteja tomando suplementos, jejuando ou em uma dieta cetogênica. É importante passar por ciclos de destruição e reconstrução.
Por exemplo, durante um jejum parcial, você estimula a autofagia através da restrição calórica. Naquele momento, você não gostaria de tomar nada que estimulasse o mTOR (como o metilfolato ou qualquer um dos outros itens listados acima), pois, ao estimular o mTOR, você interrompe o processo de autofagia.
Os mastócitos podem causar estragos na sua saúde
A glutationa rapidamente perde elétrons, o que a inutiliza, a menos que seja recarregada pela nicotinamida adenina dinueleotídeo fosfato de hidrogênio (NADPH). Conforme explicado por Miller, o "roubo do NADPH", termo que ele cunhou, também pode estar em jogo em muitos dos problemas de saúde que as pessoas enfrentam atualmente.
Está se tornando amplamente conhecido que você pode ter excesso de mastócitos. Miller estima que cerca de 80% de seus clientes têm excesso de ativação de mastócitos, desencadeando reações histamínicas. Um dos sinais disso é a vermelhidão do rosto devido à intolerância ao calor. A sensibilidade ao toque é outra, bem como frequentes erupções cutâneas avermelhadas.
Os mastócitos são glóbulos brancos que vêm socorrer quando há um patógeno ou um corpo estranho que precisa ser eliminado. Embora o excesso de ativação dos mastócitos possa causar problemas, eles não são inerentemente ruins, e as estratégias para inibi-los podem facilmente sair pela culatra. Em vez disso, Miller recomenda descobrir por que seus mastócitos estão hiperativos.